Análise: Vem aí um semestre crucial para as pretensões de Lula
Troca no BC, eleições municipais e campanha pela sucessão de Lira: próximos meses definirão margem política para a segunda metade do mandato
Publicado em 2 de agosto de 2024 às, 10h59.
Vem aí um semestre decisivo para delimitar a margem política que Lula terá para conduzir a segunda metade do seu terceiro mandato implementando a sua agenda e a do PT.
Alguns dos obstáculos patentes para que o presidente faça valer seu programa na sua essência podem ser removidos ou, ao menos, debilitados. Em contraponto, a voz das urnas tende a aprofundar a divisão ideológica do país, dando musculatura à oposição para o projeto eleitoral de 2026.
Nos próximos meses, o governo vai mudar de lado na política monetária – de opositor contumaz do presidente do Banco Central passará à condição de tutor do novo comando da instituição, que deverá ser chefiada pelo aliado Gabriel Galípolo.
A despeito da alegada autonomia, o Planalto abrirá mão de um recurso recorrente até aqui: o discurso crítico à gestão do adversário Roberto Campos Neto, utilizado com frequência até aqui para explicar os motivos pelos quais a economia não cresce como espera o gabinete lulista.
Em outubro, os eleitores darão a Lula a dimensão do tamanho da oposição no que será o primeiro teste após a apertadíssima vitória eleitoral de 2022. Se o PT e partidos aliados fracassarem nas disputas pelas prefeituras, o resultado será percebido como uma prévia da configuração do Congresso a partir de 2027, com provável predominância do centrão e da direita.
Simultaneamente, no chamado "chão de fábrica" do Legislativo serão pavimentados os caminhos dos candidatos à sucessão de Arthur Lira, hoje o principal ator político de Brasília.
Lira, expoente máximo do bloco que controla a pauta legislativa, busca manter poder no eixo da governabilidade, mas passará o bastão em fevereiro do próximo ano.
O figurino do provável sucessor é conhecido –a campanha está a pleno vapor e os três postulantes mais bem posicionados conhecem precisamente a plataforma. "Tem que manter isso aí", têm dito Elmar Nascimento, Antonio Brito e Marcos Pereira, mimetizando o bordão do ex-presidente Michel Temer e renovando a promessa de permanência do modelo de rateio da peça orçamentária entre os pares e concentração de poder entre as legendas do centro fisiológico.
No norte do continente, a eleição americana também promete produzir consequências inéditas no Brasil em variadas camadas.
Um possível triunfo de Donald Trump, além de dar fôlego à direita, tem potencial para suscitar setores das Forças Armadas refratários a Lula a retomarem conspirações de bastidores na caserna, elevando a tensão institucional.
Da mesma forma, uma eventual vitória republicana nos EUA representaria, de imediato, risco de mais inflação no mundo todo, dado o prognóstico de aumento das barreiras tarifárias comerciais. Em médio prazo, tal quadro traria duros empecilhos para que a economia doméstica prospere na reta final da gestão de Lula, visto que os fundamentos locais estão amplamente influenciados pelo cenário externo.
Estica e puxa
Esgotada essa corrida de obstáculos, a tendência natural é a de que, após o Carnaval de 2025, ocorra uma reforma ministerial a fim de redistribuir os nacos de poder entre os partidos e os blocos políticos do Congresso mirando o projeto de reeleição do presidente – hoje, os planos A, B e C do PT e legendas satélites.
Tão logo sejam fincadas as bases de sustentação da governabilidade no biênio 25-26, será possível vislumbrar com mais nitidez qual será o limite do Planalto para operar politicamente o comando da agenda.
Nesse pacote, que depende essencialmente das configurações do Congresso Nacional e do pêndulo dos órgãos de controle, encontram-se matérias tributárias, regulatórias e as contas públicas.
Atualmente, descontadas as variações de temperatura de Brasília, a margem é estreita. Mas Lula atuará com afinco para alargá-la de olho na popularidade, no aquecimento de sua base social e na competitividade para enfrentar o escrutínio eleitoral daqui a dois anos.
Sempre se equilibrando entre os pleitos moderados do ministro Fernando Haddad e o apetite da ala mais desenvolvimentista, que controla posições estratégicas no entorno presidencial.