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Quando o sonho da casa própria se torna o pesadelo do bolso vazio

Todos precisamos de um lar, logo, o debate fica entre alugar, comprar à vista ou financiar. Como decidir o melhor caminho?

Todos precisamos de um lar, logo, o debate fica entre alugar, comprar à vista ou financiar. Como decidir o melhor caminho? (Boonchai wedmakawand/Getty Images)
Todos precisamos de um lar, logo, o debate fica entre alugar, comprar à vista ou financiar. Como decidir o melhor caminho? (Boonchai wedmakawand/Getty Images)
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Panorama Econômico

Publicado em 27 de janeiro de 2021 às, 10h29.

Última atualização em 27 de janeiro de 2021 às, 10h45.

O sonho da casa própria, muitas vezes, ignora perigosamente o assunto “bem-estar financeiro”. E quando consideramos que estamos no Brasil, país com custo de financiamento imobiliário dos mais altos do mundo – disparado; que moradia é em 99% dos casos o maior investimento que uma família fará na vida, e que o custo de transação de compra e venda de um imóvel é muito alto, o sonho pode virar o pesadelo do bolso vazio.

Peço um pouquinho de paciência enquanto explico como olhar para sua moradia através do prisma dos investimentos para ajudar sua tomada de decisão, aumentando assim, as chances de seu sucesso financeiro.

O assunto não é simples, nem tão intuitivo e demanda reflexão devido ao grande impacto que tem nas finanças familiares.

Todos precisamos de um lar, logo, o debate fica entre alugar, comprar à vista ou financiar. Como decidir o melhor caminho?

Primeiramente, é preciso enxergar que a moradia é um serviço prestado pelo dono do imóvel, assim como um quarto alugado durante uma viagem é um serviço prestado por um hotel. Se a casa em que você mora for de um terceiro, você paga ao proprietário para utilizá-la. É o famoso aluguel.

Caso compre seu imóvel à vista, não precisa pagar nada a ninguém para utilizá-lo todos os dias, mas também está com seu dinheiro preso, em forma de paredes, piso, tinta, não disponível para viajar ou para investir. Sem aluguel para pagar todo mês pode sobrar mais do salário também, com maior chance de poupança ou gastos com algo legal.

E, além disso, temos também os casos em que a maioria corre o risco de se enrolar para o resto da vida, que é comprar o imóvel financiado. Comprar um imóvel financiado nada mais é do que comprar um pedaço do imóvel e alugar o restante. A parte comprada equivale ao valor dado de entrada por você e a parte alugada equivale ao valor financiado, normalmente, com o banco. E você vai dizer, “mas aí eu não pago aluguel!”. E a prestação mensal? Composta por amortização e juros, além de outras taxas? A prestação nada mais é que você comprando do banco mais um pedacinho do imóvel, a amortização, e pagando um aluguel, os juros, pelo pedacinho do imóvel que ainda é do banco. Comprar financiando é comprar o imóvel aos poucos e alugar uma fração cada vez menor dele. O problema é que no Brasil, de juros altos, é um aluguel caro!

Um exemplo:

Imagine um imóvel que está à venda por 400 mil reais ou para aluguel por 1200 reais por mês.

Alugá-lo significa gastar 12 mensalidades de 1200 reais em um ano ou 14400 reais, representando 3,6% dos 400 mil reais, preço do imóvel.

Se você tiver 100 mil reais e quiser embarcar no sonho da casa própria poderá financiar tal imóvel dando seus 100 mil reais de entrada e pegando emprestado com o banco os 300 mil reais que faltam. Você terá 25% do imóvel e o banco “alugará” para você os 75% restantes. Se você conseguir negociar um juro baixo, atualmente, vai pagar pelo menos uns 8% ao ano por esse “aluguel”. E nem entrarei no detalhe das taxas.

Agora, esses 8% de juros ao ano sobre os 300 mil reais que o banco te emprestou significam 24 mil reais por ano ou 2000 reais por mês.

Lembra desse imóvel anunciado para alugar por R$ 1200 reais por mês e sem precisar estacionar os seus 100 mil reais? A diferença fica 9600 reais por ano (24 mil reais de juros menos 14400 reais do aluguel anual). E seus 100 mil reais pagos de entrada poderiam estar livres caso você alugasse esse imóvel, rendendo mais cerca de 6500 reais por ano* sem tomar grandes** riscos.

Somados aos 9600 reais economizados por alugar em vez de pagar juros, você teria no seu bolso cerca de 16100 reais adicionais por ano (aproximadamente 1340 reais por mês).

Viu que comprar financiado não é somente benefício?

Agora, imagine o imóvel financiado que, após 3 anos e uma família maior, ficou pequeno e foi posto à venda através de uma corretora que cobra cerca de 5% de comissão para ajudá-lo a vendê-lo? São cerca de 20 mil reais ou 20% dos seus 100 mil reais de entrada. Ficou mais difícil, né?

Para reflexão:

- Dinheiro emprestado dificilmente é barato e pode atrasar muito sua na vida financeira.

- Compare os valores anuais entre aluguel e juros para morar no mesmo imóvel. Se os juros forem muito mais altos que o aluguel reflita sobre a hora para o financiamento. Talvez poupar por mais tempo enquanto mora de aluguel seja melhor.

- Os custos de transação envolvidos na compra e venda de um bem de alto valor em que você detém somente uma fração dele (a entrada e poucas amortizações) são na maioria das vezes muito danosos à sua saúde financeira. Pense bem antes de comprar ou trocar de imóvel próprio, à vista ou financiado.

- Claro que comprar um imóvel tem muitos benefícios, como deixá-lo do seu jeito, dormir melhor, mas saber quanto essa decisão custa pode ajudar muito no seu bem-estar financeiro de longo prazo.

- Se você não consegue poupar de outra forma, sem ter uma prestação de imóvel para pagar, reflita ainda mais.

* No Tesouro Direto, no dia 22 de janeiro de 2021, um título de renda fixa pré-fixado de longo prazo pagaria 7.95% ao ano, bruto de IR e de taxas, e cerca de 6.50% ao ano líquido de IR e de taxas (15% de IR de longo prazo, 0.25% ao ano de custódia). ** Uma discussão mais completa incluiria os temas inflação, potencial de valorização do imóvel e questões psicológicas e emocionais sempre presentes no tema finanças, mas estes ficarão para outra hora.

Rafael Abreu é cofundador da Köli Capital, gestora que administra mais de R$ 300 milhões de capital próprio no Brasil e no exterior. Em agosto de 2020, abriu sua estratégia também para o público através do Köli Allocation FIM.