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É preciso passar de ano

"O Brasil é aquele típico aluno que faz o suficiente para passar de ano"

Economia brasileira: confira o texto de Rodrigo Melati, Portfólio Manager da Azzurra Capital. (Getty Images/Getty Images)
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Panorama Econômico

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Publicado em 5 de junho de 2023 às 10h37.

Por Rodrigo Melati, Portfólio Manager da Azzurra Capital

O Brasil é aquele típico aluno que faz o suficiente para passar de ano, faz algumas atividades para que ajudam a obter uma nota mínima, mas no trabalho em grupo o complemento dos colegas do grupo é o suficiente para passar de ano. Em alguns momentos passa perrengue porque os colegas não estão no seu melhor momento, mas o mínimo feito já ajuda a não ser igual aos repetentes que se sentam, um ao seu lado (de família rica, mas que não faz o que precisa) e o outro que está se senta ao norte (herdou uma grande jazida de petróleo, mas não sabe como gerir isso). O aluno Brasil também é herdeiro, mas diferente dos seus colegas, consegue ao menos passar de ano.

A analogia com um aluno que é herdeiro, mas medíocre, fica clara quando entendemos o que o Brasil herdou, o mínimo feito e a dependência dos demais.

No livro “armas, germes e aço”, é mostrada a evolução das civilizações, como alguns se tornaram um império e como outros sucumbiram e um ponto chave é que variáveis como clima, localização fizeram com que as sociedades pudessem produzir alimentos e desenvolver-se. Hoje, nós temos o que é preciso, somos um país com uma vantagem geográfica - temperatura, ventos, sol, água, solo – que nos faz o país com o que mais é necessário para o mundo pós pandemia da COVID 19. Temos tudo o que é necessário para exportar alimentos em abundância, somos autossuficientes em energia e temos capacidade de exportar energia limpa, captura de carbono, pré sal, dentre outros. Estamos próximos a nação mais rica e poderosa e em um momento de reshoring e nearshoring. Nota 10 para nossa herança.

Por outro lado, não conseguimos aproveitar ao máximo a nossa herança por diversos fatores, alguns exemplos mais perceptíveis são: falta de segurança jurídica que impede uma maior entrada de recursos para financiamento de projetos; custo de capital alto advindo do excesso de gastos de um governo inchado; custo de mão de obra elevado para padrões de países com renda baixa; elevada dívida/pib e a nossa falta de produtividade. Para essa última as explicações são: i) demografia - o início dos anos 2000 foi nosso auge de mão de obra, mas hoje já estamos em queda acelerada, então deixa de ser um trunfo ii) educação - o nível educacional atrelado a falta de saneamento que interfere na melhora cognitiva dos jovens alunos no momento estes são mais capazes de absorver conteúdos nos deixa muito para trás de países desenvolvidos iii) remuneração dos fatores – o alto custo de capital e fiscal atrelados a um elevado custo de mão de obra faz com que se torne extremamente complicado a criação de valor e isso é um triturador de funding. Nota 0 para nós.

Mas como somos o aluno que passa de ano, conseguimos fazer algumas tarefas que se tornarão necessárias para ainda assim, passar de ano. As últimas foram: Reforma Trabalhista (que pode ter reduzido a taxa de desemprego neutra de 11% para 8%), marco do saneamento, marco da cabotagem, lei de liberdade econômica, digitalização do serviço público, independência do banco central, mudança da TJLP para TLP, marco legal do gás e marco regulatório do petróleo. Mas o aluno medíocre passa algum tempo se arriscando, e não somos diferentes, um exemplo disso é o teto de gastos, era muito rigoroso para um aluno que não se preocupa em se tornar alguém de destaque, por mais que ele fosse temporário, não conseguimos suportar seu controle, que tinha algumas falhas, mas era necessário para o momento, então demos um jeito de aliviar nossa pressão, criamos um arcabouço fiscal em que não teria consequências se não cumprisse, o congresso conseguiu tornar o arcabouço melhor, mas ainda assim, este fará com que os gastos aumentem em maior velocidade do que antes e a única forma de isso não acontecer é um excesso de arrecadação que traz uma piora ainda maior em nossa produtividade. Mas como dito, somos um aluno que faz o suficiente para passar de ano, em algum momento quando se tornar insustentável no futuro, o arcabouço será modificado.

Mas agora é que entram os alunos do trabalho em grupo e esse é o momento que nos fazem passar de ano. Nas últimas duas décadas tivemos a China e o processo de expansão creditícia global, Rússia entrando no mercado mundial, enriquecimento do leste asiático, estabilização inflacionária dos países não centrais da Europa.

Apesar de não viver no mundo do início dos anos 2000 pois temos uma tendência de inflação de volta a padrões mais “normais” do que o visto antes, ainda podemos aproveitar o momento. A queda na taxa de juros é iminente (hoje nosso juro real ex ante está em 9,75% e os problemas de crédito começam a aparecer) e em um momento que economias continuam a sofrer com inflação, faz com que o custo de capital caia e a relação dívida PIB desacelere. Esse processo tende a mudar o fluxo de capital que financia a dívida brasileira e passa a migrar para outros ativos como bolsa, já que a taxa de desconto é menor e diminui o custo financeiro dessas mesmas empresas, melhorando os lucros e também o risco de crédito. Os outros catalisadores da melhora são: Safra recorde que traz capital e mostrou um sério problema de armazenagem, fazendo com que os preços caíssem, com isso teremos a entrada de recursos para financiar novos silos. Temos a tecnologia do etanol via cana de açúcar que pode ser exportada para o novo país mais populoso do mundo - Índia, a China mudou sua matriz de crescimento e ele será dado por tecnologia e consumo (diferentemente dos anos 2000 em que havia repressão do consumo) e o povo chinês passou a comer mais carne bovina e para isso precisa de mais ração em um momento em que Ucrânia está fora do mercado e há uma tensão com os EUA. Falando em EUA, sua moeda ainda está em patamar elevado, e os juros ainda subindo, dragando capital do mundo e em um momento de reversão, o preço de commodities como petróleo e minério tende a elevar, melhorando a arrecadação brasileira e consequentemente a dívida PIB. Essa reversão traz ainda outro benefício, vivemos em um mundo relativo, ou seja, precisamos estar melhor que os nossos pares apenas e não precisamos ser perfeitos, e estamos bem relativamente já que: o Chile se deteriorou, a Argentina é vive sua pior crise, Ucrânia e Rússia fora do mercado, Austrália ainda elevando os juros e o México que está relativamente melhor do que nós, deu um passo atrás estatizando o lítio.

Concluindo, a melhor situação relativa atual aponta que um momento de virada para alocação em risco está para se iniciar, o momento em que os “colegas do trabalho em grupo” vai nos fazer passar de ano está chegando. Devemos manter nossos pés no chão e para isso, são feitas algumas proteções, mas o retorno ajustado ao risco em um portfólio nacional se mostra mais alto do que nos últimos dois anos.

Porém, lembrando que o aluno nota 10 é o que realmente se sobressai, por isso a diversificação geográfica é importante.

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Por Rodrigo Melati, Portfólio Manager da Azzurra Capital

O Brasil é aquele típico aluno que faz o suficiente para passar de ano, faz algumas atividades para que ajudam a obter uma nota mínima, mas no trabalho em grupo o complemento dos colegas do grupo é o suficiente para passar de ano. Em alguns momentos passa perrengue porque os colegas não estão no seu melhor momento, mas o mínimo feito já ajuda a não ser igual aos repetentes que se sentam, um ao seu lado (de família rica, mas que não faz o que precisa) e o outro que está se senta ao norte (herdou uma grande jazida de petróleo, mas não sabe como gerir isso). O aluno Brasil também é herdeiro, mas diferente dos seus colegas, consegue ao menos passar de ano.

A analogia com um aluno que é herdeiro, mas medíocre, fica clara quando entendemos o que o Brasil herdou, o mínimo feito e a dependência dos demais.

No livro “armas, germes e aço”, é mostrada a evolução das civilizações, como alguns se tornaram um império e como outros sucumbiram e um ponto chave é que variáveis como clima, localização fizeram com que as sociedades pudessem produzir alimentos e desenvolver-se. Hoje, nós temos o que é preciso, somos um país com uma vantagem geográfica - temperatura, ventos, sol, água, solo – que nos faz o país com o que mais é necessário para o mundo pós pandemia da COVID 19. Temos tudo o que é necessário para exportar alimentos em abundância, somos autossuficientes em energia e temos capacidade de exportar energia limpa, captura de carbono, pré sal, dentre outros. Estamos próximos a nação mais rica e poderosa e em um momento de reshoring e nearshoring. Nota 10 para nossa herança.

Por outro lado, não conseguimos aproveitar ao máximo a nossa herança por diversos fatores, alguns exemplos mais perceptíveis são: falta de segurança jurídica que impede uma maior entrada de recursos para financiamento de projetos; custo de capital alto advindo do excesso de gastos de um governo inchado; custo de mão de obra elevado para padrões de países com renda baixa; elevada dívida/pib e a nossa falta de produtividade. Para essa última as explicações são: i) demografia - o início dos anos 2000 foi nosso auge de mão de obra, mas hoje já estamos em queda acelerada, então deixa de ser um trunfo ii) educação - o nível educacional atrelado a falta de saneamento que interfere na melhora cognitiva dos jovens alunos no momento estes são mais capazes de absorver conteúdos nos deixa muito para trás de países desenvolvidos iii) remuneração dos fatores – o alto custo de capital e fiscal atrelados a um elevado custo de mão de obra faz com que se torne extremamente complicado a criação de valor e isso é um triturador de funding. Nota 0 para nós.

Mas como somos o aluno que passa de ano, conseguimos fazer algumas tarefas que se tornarão necessárias para ainda assim, passar de ano. As últimas foram: Reforma Trabalhista (que pode ter reduzido a taxa de desemprego neutra de 11% para 8%), marco do saneamento, marco da cabotagem, lei de liberdade econômica, digitalização do serviço público, independência do banco central, mudança da TJLP para TLP, marco legal do gás e marco regulatório do petróleo. Mas o aluno medíocre passa algum tempo se arriscando, e não somos diferentes, um exemplo disso é o teto de gastos, era muito rigoroso para um aluno que não se preocupa em se tornar alguém de destaque, por mais que ele fosse temporário, não conseguimos suportar seu controle, que tinha algumas falhas, mas era necessário para o momento, então demos um jeito de aliviar nossa pressão, criamos um arcabouço fiscal em que não teria consequências se não cumprisse, o congresso conseguiu tornar o arcabouço melhor, mas ainda assim, este fará com que os gastos aumentem em maior velocidade do que antes e a única forma de isso não acontecer é um excesso de arrecadação que traz uma piora ainda maior em nossa produtividade. Mas como dito, somos um aluno que faz o suficiente para passar de ano, em algum momento quando se tornar insustentável no futuro, o arcabouço será modificado.

Mas agora é que entram os alunos do trabalho em grupo e esse é o momento que nos fazem passar de ano. Nas últimas duas décadas tivemos a China e o processo de expansão creditícia global, Rússia entrando no mercado mundial, enriquecimento do leste asiático, estabilização inflacionária dos países não centrais da Europa.

Apesar de não viver no mundo do início dos anos 2000 pois temos uma tendência de inflação de volta a padrões mais “normais” do que o visto antes, ainda podemos aproveitar o momento. A queda na taxa de juros é iminente (hoje nosso juro real ex ante está em 9,75% e os problemas de crédito começam a aparecer) e em um momento que economias continuam a sofrer com inflação, faz com que o custo de capital caia e a relação dívida PIB desacelere. Esse processo tende a mudar o fluxo de capital que financia a dívida brasileira e passa a migrar para outros ativos como bolsa, já que a taxa de desconto é menor e diminui o custo financeiro dessas mesmas empresas, melhorando os lucros e também o risco de crédito. Os outros catalisadores da melhora são: Safra recorde que traz capital e mostrou um sério problema de armazenagem, fazendo com que os preços caíssem, com isso teremos a entrada de recursos para financiar novos silos. Temos a tecnologia do etanol via cana de açúcar que pode ser exportada para o novo país mais populoso do mundo - Índia, a China mudou sua matriz de crescimento e ele será dado por tecnologia e consumo (diferentemente dos anos 2000 em que havia repressão do consumo) e o povo chinês passou a comer mais carne bovina e para isso precisa de mais ração em um momento em que Ucrânia está fora do mercado e há uma tensão com os EUA. Falando em EUA, sua moeda ainda está em patamar elevado, e os juros ainda subindo, dragando capital do mundo e em um momento de reversão, o preço de commodities como petróleo e minério tende a elevar, melhorando a arrecadação brasileira e consequentemente a dívida PIB. Essa reversão traz ainda outro benefício, vivemos em um mundo relativo, ou seja, precisamos estar melhor que os nossos pares apenas e não precisamos ser perfeitos, e estamos bem relativamente já que: o Chile se deteriorou, a Argentina é vive sua pior crise, Ucrânia e Rússia fora do mercado, Austrália ainda elevando os juros e o México que está relativamente melhor do que nós, deu um passo atrás estatizando o lítio.

Concluindo, a melhor situação relativa atual aponta que um momento de virada para alocação em risco está para se iniciar, o momento em que os “colegas do trabalho em grupo” vai nos fazer passar de ano está chegando. Devemos manter nossos pés no chão e para isso, são feitas algumas proteções, mas o retorno ajustado ao risco em um portfólio nacional se mostra mais alto do que nos últimos dois anos.

Porém, lembrando que o aluno nota 10 é o que realmente se sobressai, por isso a diversificação geográfica é importante.

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