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Um fenômeno da era digital: os imperdoáveis

Vivemos em uma época em que as pessoas são julgadas instantaneamente. Uma frase errada e pronto: este indivíduo entrará para a galeria dos imperdoáveis

Uma frase errada e pronto: este indivíduo entrará para a galeria dos imperdoáveis (Getty Images/Getty Images)

Publicado em 24 de setembro de 2024 às 05h43.

Em um filme de 1992, chamado “Os Imperdoáveis”, o personagem Bill Munny, vivido por Clint Eastwood diz o seguinte: “É uma coisa esquisita, matar um homem. Você tira tudo o que ele tem e tudo aquilo que ele terá”. Passei os últimos dias pensando no título desta película. Vivemos em uma época em que as pessoas são julgadas instantaneamente pelo que dizem. Uma frase errada e pronto: este indivíduo entrará para a galeria dos imperdoáveis. Tudo o que ele fez de bom até aquele momento será esquecido – e aquilo que ele fará será visto com desconfiança ou crítica. Este é o nosso mundo. As redes sociais não perdoam o erro. Um escorregão – do mais leve ao mais grave – é recompensado com um cancelamento maciço. Não há espaço para sair da linha ou manifestar preconceitos.

Em 2007, um executivo, durante uma entrevista ao “Valor Econômico” disse que “se o Piauí deixasse de existir, ninguém vai ficar chateado”. Era um momento em que o mundo digital ainda engatinhava. Mesmo assim, houve um prenúncio de cancelamento. Se isso tivesse ocorrido nos dias de hoje, o efeito teria sido devastador.

Na semana passada, houve um desses cancelamentos. Não foi o primeiro nem será o último. Geralmente, esse tipo de coisa ocorre quando nos manifestamos por impulso. Todos os homens – todos, incluindo este que escreve aqui – têm traços de machismo dentro de si. Uns mais, outros menos. Mas fomos criados em um ambiente no qual nos contaminamos com convicções machistas. Muitos de nós conseguiram suprimir esses impulsos. Outros, porém, deixam escapar essas opiniões aqui e ali. Em um ambiente privado, isso é até relevado. Mas quando estamos no universo espetaculoso nas mídias sociais, é algo desastroso.

Em boa parte da sociedade, no entanto, há uma crença – equivocada, evidentemente – de que homens são superiores às mulheres. Em determinados ambientes religiosos, por exemplo, a ideia de que Eva foi criada a partir de uma costela de Adão é uma verdade suprema (o fato de todas as demais espécies, vertebradas ou não, terem machos e fêmeas é algo convenientemente esquecido nesses momentos).

Vejam bem: sou uma pessoa religiosa e já li a bíblia de cabo a rabo algumas vezes. Prefiro acreditar que as passagens que desafiam a lógica e a ciência são metáforas que podem ser interpretadas livremente pelos fiéis, mas não devem ser levadas ao pé da letra.

Portanto, a noção de que os homens tenham de ser necessariamente provedores e líderes me parece totalmente errada. O meu caso ilustra bem o que eu acredito: minha esposa é minha sócia e dividimos nossas responsabilidades igualmente. Minha habilidade é produzir e criar conteúdo. Não tenho grandes habilidades gerenciais. Quem comanda a empresa, com o cargo de CEO? Cristina Falcão. Eu sou o publisher do nosso portal e apresento o programa de televisão. Mas quem comanda o show é ela.

Isso me diminui? Acredito que não.

Entendam: não é uma tarefa simples. Marido e mulher trabalhando juntos é um desafio diário, pois são duas pessoas que nem sempre pensam da mesma forma. No entanto, o respeito que temos um pelo outro é a chave para que as coisas funcionem bem.

No caso desta semana, houve um aspecto interessante, especialmente em ambientes como o do LinkedIn: muita gente se manifestou sem citar nomes de pessoas ou empresas. Isso mostra maturidade e ponderação. Mas não podemos dizer também que aqueles que se indignaram e deram nomes aos bois estejam totalmente errados, pois simplesmente mostraram seus sentimentos.

O efeito manada, entretanto, é assustador. O linchamento moral dos tempos atuais é como uma guilhotina que reduz reputações a pó. São tempos difíceis: não se pode errar. E desculpas escritas de forma rápida não são aceitas pela maioria esmagadora dos internautas. Talvez, no futuro, essa patrulha digital fique ainda mais irascível, recalcitrante e inflexível. Por isso, precisamos refletir antes de nos manifestar em público. Ou melhor: daqui para frente, mesmo no ambiente privado, precisamos agir como se estivéssemos falando para uma multidão.

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Em um filme de 1992, chamado “Os Imperdoáveis”, o personagem Bill Munny, vivido por Clint Eastwood diz o seguinte: “É uma coisa esquisita, matar um homem. Você tira tudo o que ele tem e tudo aquilo que ele terá”. Passei os últimos dias pensando no título desta película. Vivemos em uma época em que as pessoas são julgadas instantaneamente pelo que dizem. Uma frase errada e pronto: este indivíduo entrará para a galeria dos imperdoáveis. Tudo o que ele fez de bom até aquele momento será esquecido – e aquilo que ele fará será visto com desconfiança ou crítica. Este é o nosso mundo. As redes sociais não perdoam o erro. Um escorregão – do mais leve ao mais grave – é recompensado com um cancelamento maciço. Não há espaço para sair da linha ou manifestar preconceitos.

Em 2007, um executivo, durante uma entrevista ao “Valor Econômico” disse que “se o Piauí deixasse de existir, ninguém vai ficar chateado”. Era um momento em que o mundo digital ainda engatinhava. Mesmo assim, houve um prenúncio de cancelamento. Se isso tivesse ocorrido nos dias de hoje, o efeito teria sido devastador.

Na semana passada, houve um desses cancelamentos. Não foi o primeiro nem será o último. Geralmente, esse tipo de coisa ocorre quando nos manifestamos por impulso. Todos os homens – todos, incluindo este que escreve aqui – têm traços de machismo dentro de si. Uns mais, outros menos. Mas fomos criados em um ambiente no qual nos contaminamos com convicções machistas. Muitos de nós conseguiram suprimir esses impulsos. Outros, porém, deixam escapar essas opiniões aqui e ali. Em um ambiente privado, isso é até relevado. Mas quando estamos no universo espetaculoso nas mídias sociais, é algo desastroso.

Em boa parte da sociedade, no entanto, há uma crença – equivocada, evidentemente – de que homens são superiores às mulheres. Em determinados ambientes religiosos, por exemplo, a ideia de que Eva foi criada a partir de uma costela de Adão é uma verdade suprema (o fato de todas as demais espécies, vertebradas ou não, terem machos e fêmeas é algo convenientemente esquecido nesses momentos).

Vejam bem: sou uma pessoa religiosa e já li a bíblia de cabo a rabo algumas vezes. Prefiro acreditar que as passagens que desafiam a lógica e a ciência são metáforas que podem ser interpretadas livremente pelos fiéis, mas não devem ser levadas ao pé da letra.

Portanto, a noção de que os homens tenham de ser necessariamente provedores e líderes me parece totalmente errada. O meu caso ilustra bem o que eu acredito: minha esposa é minha sócia e dividimos nossas responsabilidades igualmente. Minha habilidade é produzir e criar conteúdo. Não tenho grandes habilidades gerenciais. Quem comanda a empresa, com o cargo de CEO? Cristina Falcão. Eu sou o publisher do nosso portal e apresento o programa de televisão. Mas quem comanda o show é ela.

Isso me diminui? Acredito que não.

Entendam: não é uma tarefa simples. Marido e mulher trabalhando juntos é um desafio diário, pois são duas pessoas que nem sempre pensam da mesma forma. No entanto, o respeito que temos um pelo outro é a chave para que as coisas funcionem bem.

No caso desta semana, houve um aspecto interessante, especialmente em ambientes como o do LinkedIn: muita gente se manifestou sem citar nomes de pessoas ou empresas. Isso mostra maturidade e ponderação. Mas não podemos dizer também que aqueles que se indignaram e deram nomes aos bois estejam totalmente errados, pois simplesmente mostraram seus sentimentos.

O efeito manada, entretanto, é assustador. O linchamento moral dos tempos atuais é como uma guilhotina que reduz reputações a pó. São tempos difíceis: não se pode errar. E desculpas escritas de forma rápida não são aceitas pela maioria esmagadora dos internautas. Talvez, no futuro, essa patrulha digital fique ainda mais irascível, recalcitrante e inflexível. Por isso, precisamos refletir antes de nos manifestar em público. Ou melhor: daqui para frente, mesmo no ambiente privado, precisamos agir como se estivéssemos falando para uma multidão.

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