Os juros, quem diria, também foram polarizados
A discussão sobre um assunto técnico – a definição da política monetária – se transformou em um debate político
Publisher
Publicado em 21 de junho de 2024 às 14h32.
Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma entrevista na rádio CBN na terça-feira, tinha um objetivo em mente: criar uma nova polarização. No dia seguinte (ontem), seria a reunião do Comitê de Política Monetária que definiria se a taxa Selic continuaria em queda ou não. Muitos analistas anteciparam o que ocorreu: os juros continuaram no mesmo patamar, na faixa de 10,5% ao ano. Lula sabia que isso iria acontecer e tratou de deixar bem claro que a atribuição de definir as taxas é do Banco Central e não do governo — como uma forma de se isentar de qualquer responsabilidade sobre a condução da economia. De quebra, criticou o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, e disse que sua atuação era política e alinhada com os oposicionistas.
Desta forma, a discussão sobre um assunto técnico – a definição da política monetária – se transformou em um debate político. Ou seja, os juros também foram polarizados e entraram para o rol dos temas que passam por filtros ideológicos dentro de uma contenda intelectual, como o uso de vacinas ou formas de combater o aquecimento global.
Estamos em um momento no qual todos fazem sua própria filtragem e analisam os fatos com base em suas próprias verdades. Isso causa uma distorção coletiva da realidade – e com o presidente não é diferente. Para ele, existe um vilão a culpar pelos resultados recentes de uma economia engessada: Campos Neto.
O senador Renan Calheiros, ontem, resumiu o pensamento que domina o Planalto: o dólar está alto, algo que pode elevar a inflação, porque o presidente do BC vive comentando sobre uma eventual incapacidade de o governo conseguir fechar as contas públicas. Bem, Campos Neto pode ter feito um comentário aqui e outro lá sobre esse tema. Mas é consenso em todo o mercado financeiro sobre o apreço de Lula sobre gastos públicos.
Enquanto pairar sobre o mercado a certeza de que o governo não fez a lição de casa para acabar com o desequilíbrio fiscal, a economia não vai se recuperar e o dólar continuará alto, não importa o nível do custo do dinheiro. Vamos comparar o desempenho econômico de agora com o do primeiro trimestre. Entre janeiro e março, havia até certo otimismo no ar, com os investimentos voltando, mesmo com os juros em um patamar ligeiramente superior ao de hoje.
Ocorre que, naquele momento, ainda se acreditava na capacidade de o ministro Fernando Haddad segurar as despesas estatais. Conforme os analistas perceberam que havia descontrole fiscal, tudo mudou. A economia, assim, travou, à espera de uma solução.
Se Lula quiser resolver essa pendenga de forma racional e não polarizada, é só anunciar um pacote de corte de gastos que faça sentido e dar garantias reais de que as regras anunciadas serão cumpridas. Com isso, o dólar vai cair, a ameaça de repique de inflação idem, e os juros poderão retomar seu caminho de baixa. Mas se o presidente insistir no caminho da polarização e de tentar jogar pobres contra ricos, ficaremos atolados em um debate ideológico que só favorece os arautos do apocalipse.
Diante da votação unânime que manteve os juros em 10,5%, há uma dúvida que grudou na cabeça dos analistas de mercado: qual será o futuro de Gabriel Galípolo, que votou como Campos Neto (uma votação unânime, por sinal)?
Galípolo adotou uma postura técnica e não optou por não continuar a queda de taxas, como queria o presidente Lula. Isso mostra que ele é, entre os quadros petistas, a melhor opção para o comando do Banco Central. Mas Lula pensará assim e vai indicá-lo para o lugar de Campos Neto quando chegar a hora? Se ouvir a voz da razão, Lula verá que, ao escolher Galípolo, terá um quadro que tem goza de credibilidade junto ao mercado financeiro e que tem coragem de tomar decisões técnicas em momentos difíceis. Esperemos que o presidente seja sábio na hora de indicar o novo presidente do BC e nem pense em nomes que vão causar um redemoinho no mercado, como Aloizio Mercadante ou Guido Mantega.
Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma entrevista na rádio CBN na terça-feira, tinha um objetivo em mente: criar uma nova polarização. No dia seguinte (ontem), seria a reunião do Comitê de Política Monetária que definiria se a taxa Selic continuaria em queda ou não. Muitos analistas anteciparam o que ocorreu: os juros continuaram no mesmo patamar, na faixa de 10,5% ao ano. Lula sabia que isso iria acontecer e tratou de deixar bem claro que a atribuição de definir as taxas é do Banco Central e não do governo — como uma forma de se isentar de qualquer responsabilidade sobre a condução da economia. De quebra, criticou o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, e disse que sua atuação era política e alinhada com os oposicionistas.
Desta forma, a discussão sobre um assunto técnico – a definição da política monetária – se transformou em um debate político. Ou seja, os juros também foram polarizados e entraram para o rol dos temas que passam por filtros ideológicos dentro de uma contenda intelectual, como o uso de vacinas ou formas de combater o aquecimento global.
Estamos em um momento no qual todos fazem sua própria filtragem e analisam os fatos com base em suas próprias verdades. Isso causa uma distorção coletiva da realidade – e com o presidente não é diferente. Para ele, existe um vilão a culpar pelos resultados recentes de uma economia engessada: Campos Neto.
O senador Renan Calheiros, ontem, resumiu o pensamento que domina o Planalto: o dólar está alto, algo que pode elevar a inflação, porque o presidente do BC vive comentando sobre uma eventual incapacidade de o governo conseguir fechar as contas públicas. Bem, Campos Neto pode ter feito um comentário aqui e outro lá sobre esse tema. Mas é consenso em todo o mercado financeiro sobre o apreço de Lula sobre gastos públicos.
Enquanto pairar sobre o mercado a certeza de que o governo não fez a lição de casa para acabar com o desequilíbrio fiscal, a economia não vai se recuperar e o dólar continuará alto, não importa o nível do custo do dinheiro. Vamos comparar o desempenho econômico de agora com o do primeiro trimestre. Entre janeiro e março, havia até certo otimismo no ar, com os investimentos voltando, mesmo com os juros em um patamar ligeiramente superior ao de hoje.
Ocorre que, naquele momento, ainda se acreditava na capacidade de o ministro Fernando Haddad segurar as despesas estatais. Conforme os analistas perceberam que havia descontrole fiscal, tudo mudou. A economia, assim, travou, à espera de uma solução.
Se Lula quiser resolver essa pendenga de forma racional e não polarizada, é só anunciar um pacote de corte de gastos que faça sentido e dar garantias reais de que as regras anunciadas serão cumpridas. Com isso, o dólar vai cair, a ameaça de repique de inflação idem, e os juros poderão retomar seu caminho de baixa. Mas se o presidente insistir no caminho da polarização e de tentar jogar pobres contra ricos, ficaremos atolados em um debate ideológico que só favorece os arautos do apocalipse.
Diante da votação unânime que manteve os juros em 10,5%, há uma dúvida que grudou na cabeça dos analistas de mercado: qual será o futuro de Gabriel Galípolo, que votou como Campos Neto (uma votação unânime, por sinal)?
Galípolo adotou uma postura técnica e não optou por não continuar a queda de taxas, como queria o presidente Lula. Isso mostra que ele é, entre os quadros petistas, a melhor opção para o comando do Banco Central. Mas Lula pensará assim e vai indicá-lo para o lugar de Campos Neto quando chegar a hora? Se ouvir a voz da razão, Lula verá que, ao escolher Galípolo, terá um quadro que tem goza de credibilidade junto ao mercado financeiro e que tem coragem de tomar decisões técnicas em momentos difíceis. Esperemos que o presidente seja sábio na hora de indicar o novo presidente do BC e nem pense em nomes que vão causar um redemoinho no mercado, como Aloizio Mercadante ou Guido Mantega.