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Ironia do destino

Sergio Moro e Marcelo Odebrecht foram absolvidos no mesmo dia

Marcelo Odebrecht (Heuler Andrey/Getty Images)
Marcelo Odebrecht (Heuler Andrey/Getty Images)

Uma verdadeira ironia do destino. Todos os atos da Operação Lava-Jato contra Marcelo Odebrecht foram anulados pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, na tarde da última terça-feira. Algumas horas depois, foi a vez de o mentor da força-tarefa, o ex-juiz e senador Sergio Moro, ser absolvido das acusações de abuso de poder econômico durante a campanha eleitoral de 2022.

A decisão de Toffoli coloca mais uma pedra no túmulo da Lava-Jato, em um desmonte jurídico que nunca se viu antes no país. Ao anular o processo contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2021, o ministro Edson Facchin decretou o início do fim daquela que foi a maior iniciativa de combate à corrupção no país. Como se fosse um castelo de cartas, todas as demais acusações (muitas delas de réus confessos) foram caindo, assim como as pesadas multas cobradas de empresas que patrocinaram as propinas distribuídas entre políticos e burocratas.

Até a semana passada, muitos apostavam na cassação do mandato de Moro, visto que parecia existir em Brasília uma aliança para apagar a Lava-Jato da memória brasileira. O que se viu, contudo, foi o contrário. O senador obteve a unanimidade dos votos pela sua inocência, incluindo o sufrágio de Alexandre de Moraes, visto como um desafeto do ex-juiz.

Senador Sergio Moro (Lula Marques/Agência Brasil)

O que explica, neste contexto, a absolvição de Moro?

Talvez a razão seja o exagero das acusações. Um dos denunciantes disse que o senador chegou a gastar mais de R$ 20 milhões em sua pré-campanha. Mas o relator do processo, ainda na instância anterior, chegou à soma de R$ 224.000,00.

Esse processo tem uma simbologia peculiar: trata-se de uma união entre o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, e da federação PT-PcdoB-PV, que são os pilares de sustentação do governo Lula. Moro conseguiu fazer algo inédito: unir lulistas e bolsonaristas em torno de uma só causa (a sua cassação).

O senador, enquanto juiz, cometeu exageros inquestionáveis durante a condução da Lava-Jato, como o abuso de prisões preventivas para obter delações premiadas. Isso, no entanto, serviu de pretexto para que todo o esforço feito para atacar a corrupção fosse varrido para debaixo do tapete.

A mensagem que o STF passa à sociedade, com o cancelamento da força-tarefa, é muito ruim. Parece que os depoimentos que mostravam um padrão impecável de governança na gestão de propinas foram pura ficção. Ou que as planilhas elaboradas pela equipe de Marcelo Odebrecht, com apelidos jocosos aos corruptos, nunca existiram. Lembremos: era uma lista de 179 políticos, com apelidos como “Viagra”, “Campari” e “Amante”, criados para que os funcionários subalternos da empreiteira não soubessem quem eram os corrompíveis.

Talvez o fato de Moro ter sido absolvido no mesmo dia em que Marcelo Odebrecht ganhou uma ficha limpa possa ser o início de uma nova etapa. Livre da cassação, o senador voltará suas atenções àquilo que ele sabe fazer de melhor: atacar a corrupção que assola o país e que funciona como um freio de mão puxado para o nosso desenvolvimento como nação.