Julian Assange e a transparência
Uma longa matéria publicada na revista “New Yorker”em junho deste ano traçou um perfil de Julian Assange, diretor do WikiLeaks, preso em Londres sob acusações de crimes sexuais. Publicada muito antes dos principais escândalos que deram visibilidade ao site nos últimos meses, a reportagem – que tinha como subtítulo “A missão de Julian Assange pela total transparência” – relatou as intenções do ciberativista ao divulgar documentos comprometedores: “Assange, apesar de […] Leia mais
Publicado em 7 de dezembro de 2010 às, 23h45.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 12h53.
Uma longa matéria publicada na revista “New Yorker”em junho deste ano traçou um perfil de Julian Assange, diretor do WikiLeaks, preso em Londres sob acusações de crimes sexuais. Publicada muito antes dos principais escândalos que deram visibilidade ao site nos últimos meses, a reportagem – que tinha como subtítulo “A missão de Julian Assange pela total transparência” – relatou as intenções do ciberativista ao divulgar documentos comprometedores:
“Assange, apesar de suas pretensões para o jornalismo científico, enfatizou que sua missão é expor a injustiça, para não fornecer um registro imparcial dos acontecimentos. Em um convite a potenciais colaboradores em 2006, ele escreveu: “Nossos alvos principais são os regimes altamente opressivos da China, Rússia e Eurásia Central, mas esperamos também que possa ser útil para aqueles do Ocidente que desejam revelar comportamentos ilegais ou imorais de seus próprios governos e corporações.” Ele alegou que um “movimento social ” para expor os segredos poderia “derrubar muitas administrações que costumam esconder a realidade, incluindo a administração dos EUA”.”
(…)
“Ele [Assange] tinha chegado a compreender a luta humana definitiva não como a esquerda versus a direita, ou da fé contra a razão, mas sim entre indivíduo e instituição. Como estudante de Kafka, Koestler e Solzhenitsyn, ele acreditava que a verdade, criatividade, amor e compaixão são corrompidos pelas hierarquias institucionais e pelas “redes de clientelismo” – uma de suas expressões favoritas -, que contorcem o espírito humano. Ele esboçou uma espécie de manifesto, intitulado “Conspiração enquanto Governo”, que procurou aplicar a teoria dos gráficos para a política. Assange escreveu que o governo ilegítimo era conspiratório por definição – o produto dos funcionários em “segredo colaborativo, trabalhando em detrimento de uma população.” Ele alegou que, quando as linhas do sistema de comunicação interna de um regime são interrompidas, a informação que flui entre os conspiradores diminui, e a medida que esse fluxo se aproxima de zero, a conspiração se dissolve. Vazamentos foram um instrumento de guerra de informação.”
Ao descrever a estrutura que envolve o “WikiLeaks”, a “New Yorker”, à época, previu: “Um governo ou companhia que queira remover conteúdo do WikiLeaks terá que praticamente desmantelar a própria internet”.
Seis meses depois da matéria, e diante da prisão de Assange, ficam algumas desconfortáveis perguntas: será que a busca pela transparência é válida somente enquanto não atinge determinados interesses? Apelos à “segurança nacional” são comumente utilizados por governos ditatoriais para justificar atos de censura, pressões contra patrocinadores de veículos de comunicação e prisões politicamente motivadas contra aqueles que ousam desafiá-los usando apenas o poder da informação. A utilização de tais recursos para supressão da liberdade de expressão são condenáveis em qualquer governo. Seriam toleráveis quando partem de um país reconhecido pela defesa das liberdades individuais e da própria transparência?
————–
Leia no “The Guardian”: Julian Assange answers your questions