(Acervo pessoal)
Publicado em 13 de janeiro de 2025 às 13h37.
Última atualização em 14 de janeiro de 2025 às 10h51.
Em um momento histórico para o mercado de criptomoedas, o bitcoin alcançou sua máxima histórica em 2024, impulsionado por uma conjuntura de fatores políticos e econômicos únicos. Para entender as razões por trás desse marco e compreender as perspectivas futuras, o Instituto Millenium conversou com Fernando Ulrich, sócio da Liberta Investimentos e referência no universo das criptomoedas. Na entrevista, Ulrich compartilha sua análise sobre a influência da vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, que trouxe uma promessa de regulação pró-cripto, e o impacto do halving do bitcoin, ocorrido em abril, como catalisadores para a valorização do ativo.
Além disso, Ulrich discute como o ambiente global e a crescente busca por alternativas ao dólar consolidam o bitcoin como um ativo estratégico em portfólios de investidores e até mesmo na agenda de estados-nação. A entrevista também aborda a importância de estratégias de investimento conscientes e os principais riscos para o mercado de criptomoedas em 2025, incluindo a volatilidade e a dinâmica econômica internacional.
Confira abaixo a entrevista completa:
Instituto Millenium: Em 2024, o bitcoin surpreendeu o mercado, atingindo sua máxima histórica. Qual a influência da posse de Donald Trump, nos EUA, e a que mais você atribui essa alta?
Fernando Ulrich: Não diria que essa alta histórica do Bitcoin surpreendeu o mercado, especialmente para aqueles que já estão envolvidos nessa indústria há mais tempo, que entendem a dinâmica, que entendem os fatores de demanda e o apelo que esse ativo tem para aqueles que são mais entusiastas de tecnologia e que prezam a liberdade. Mas, talvez, o ritmo de alta no final do ano possa ter surpreendido sim, porque ele se deve a fatores mais relacionados à vitória do Donald Trump (para a presidência dos EUA). À expectativa da administração dele, que já tem um viés bem mais pró-cripto, com muitos nomes que são entusiastas, defensores, alguns até mesmo da indústria, envolvidos no governo em posições chave, de liderança. O próprio vice dele, o J. D. Vence, é um cara pró-Bitcoin, o indicado para a Secretaria do Tesouro, Scott Bessent, também é pró-Bitcoin, assim como o novo chefe da Comissão de Valores Mobiliários. Então, esse ambiente no final do ano, com a vitória do Trump, com uma regulação muito mais pró- cripto, certamente intensificou a alta do Bitcoin, que já vinha ao longo do ano.
O Trump mudou também a sua posição pessoal em relação ao Bitcoin. Tem tweets dele em 2019 contrários ao Bitcoin, e às criptos em geral, achando que não era algo bom, só era uma ferramenta de atividade ilícita, lavagem de dinheiro, etc. E agora ele mudou bastante, deu uma volta de 180 graus. Ele, inclusive foi o palestrante principal na Bitcoin 2024, a conferência anual, que dessa vez aconteceu no Tennessee, em Nashville. Ele mudou muito a sua postura, a sua posição pessoal e por isso esse otimismo todo com o setor, agora que o Trump ganhou a eleição e que deve assumir. Há uma expectativa embutida no preço, é preciso que a expectativa seja concretizada com ações de verdade. Por enquanto está muito mais num discurso. Vejamos as ações práticas quando ele assumir e quando as pessoas que ele indicou também assumirem. A gente vai poder realmente ter uma conclusão definitiva.
Outro fator que podemos mencionar em 2024 foi que tivemos os ETFs que finalmente foram aprovados nos Estados Unidos. O primeiro movimento de alta foi no começo do ano, o primeiro semestre especialmente, e o grande fator foi essa aprovação dos ETFs.
IM: O que seria o halving e por que ele é um evento importante?
FU: O halving do bitcoin significa a queda pela metade da criação de novos bitcoins, que ocorre normalmente a cada 4 anos, ou, especificamente, a cada 210 mil blocos de BTC minerados. E em 2024 tivemos mais um desses eventos, em abril, quando a recompensa, os novos bitcoins criados por bloco de mineração, caiu mais uma vez pela metade, e agora situa-se em 3,125 BTC por bloco minerado, além das tarifas de transação que os mineradores recebem como recompensa. Esse evento histórico está como uma das principais regras no protocolo do bitcoin e ocorre de 4 em 4 anos, aproximadamente. Ele vai continuar acontecendo até chegarmos ao limite máximo de 21 milhões de BTC, que - se estima - acontecerá ao redor do ano 2140. Por que é um evento importante? Porque historicamente há uma forte apreciação na cotação do bitcoin quando se aproxima dessa data do halving, então isso que verificamos em todos os ciclos de halving foi uma forte apreciação no preço chegando nessa data. E parte pode ser explicada pela própria queda na criação de novos bitcoins, então digamos que a taxa de inflação, de criação de novos bitcoins, é decrescente e quando temos um halving, ela cai mais ainda, então o bitcoin vai se tornando cada vez mais escasso.
IM: A conjuntura está boa para as criptomoedas em geral, particularmente para o bitcoin? Por que?
FU: Sim, a conjuntura para o bitcoin continua favorável, em grande parte devido a uma regulação mais amigável, somada à expectativa gerada pela administração Trump. Além disso, cresce a percepção de que o bitcoin é um ativo estratégico para investidores incluírem em seus portfólios. Também há a possibilidade de estados-nação começarem a adquirir bitcoin como reserva estratégica, um tema que está sendo debatido nos Estados Unidos e que pode resultar em decisões concretas já no primeiro semestre de 2025. E, além disso, a geopolítica, como sempre, atua como um catalisador. No mundo atual, onde o dólar é a moeda de reserva e muitos sistemas de transferência estão vinculados ou fortemente influenciados pelo governo americano, o dólar é frequentemente usado como arma geopolítica, com sanções a empresas, países e líderes mundiais. Sem entrar no mérito da questão, o bitcoin se destaca como a única rede verdadeiramente internacional e globalizada de liquidação de pagamentos, sem fronteiras e imune a pressões políticas, acessível a qualquer pessoa. É um sistema neutro, apolítico.
IM: É hora de comprar, ou você aconselharia investidores iniciantes a esperarem a próxima baixa?
FU: A decisão de investimento, comprar ou não, é sempre muito pessoal. O que se recomenda antes é entender como funciona o ativo, entender as principais características, como as regras do sistema, a volatilidade, que é uma questão de mercado e tem sido uma constante. Embora decrescente, a volatilidade ainda é relevante. E aí, entendendo, o ideal é montar uma posição ao longo do tempo. Como não conseguimos prever se ele vai seguir subindo ou pode ter uma queda forte, o ideal é montar uma posição ao longo do tempo, então defina o capital a ser alocado e vai comprando paulatinamente, aproveitando o preço do dia e, eventualmente, uma janela que se abra, se houver uma correção no mercado e o bitcoin cair, aí pode-se comprar mais com os mesmos reais ou mesmos dólares. Então, o ideal é montar uma posição ao longo do tempo e executar essa estratégia, porque fazer timing de preço, especialmente no curto prazo, é impossível.
IM: Com o BTC atingindo a marca de US$ 100 mil, quais são os principais riscos e desafios que o mercado de criptomoedas pode enfrentar em 2025, considerando aspectos como regulação, volatilidade e adoção em massa?
FU: Talvez o principal desafio para o bitcoin, em termos de preço para 2025, seja a conjuntura macro internacional. Os mercados de ações estão bem esticados, nas máximas históricas, as grandes tecnologias com os valuations lá em cima, os juros longos estão subindo nesse começo de ano nos Estados Unidos e na Europa, ainda há um temor com uma inflação mais persistente mundo afora e, se houver alguma recessão mais forte, uma crise financeira, ou mesmo uma correção forte nos mercados, isso pode repercutir, sem dúvida, no bitcoin também. Talvez esse seja o desafio principal para esse ano, mas é natural, faz parte do mercado.