“Quando em Roma, faça como os romanos”. E seja ético, sempre.
Na coluna desta semana, conheça a história de Magui Castro
Publicado em 27 de maio de 2022 às, 13h43.
Por Fabiana Monteiro
Quem acredita sempre alcança
Sou de uma família unida, de cinco irmãos. Os meus pais foram “um ponto fora da curva” em comparação com os outros que eu conheci, pois eles se gostavam muito e, por causa desse afeto, estávamos sempre rodeados de muito amor, além de um ambiente muito agradável. Quando pequena, morava no Leme, no Rio de Janeiro, mas com 7 anos, mudamos para o subúrbio, contrariando o que algumas pessoas pensam, foi uma fase ótima, em que eu pude crescer da melhor forma: livre, brincando na rua com os meus irmãos.
Em virtude dessa liberdade e por ser mulher no meio de dois meninos, eu aprendi a jogar bola de gude e a fazer rabiola para as pipas. Eu era meio moleque. Além de aprender todas essas brincadeiras, ditas como de meninos, eu aprendi a me defender sozinha. Meus irmãos, Sérgio e Fábio, e eu brincávamos falando que não éramos crianças de playground e, sim, da rua. Minha irmã Mônica, hoje a minha melhor amiga, e meu irmão Roberto que eu também amo, nesta época eram menores que a gente e ficavam de fora das brincadeiras.
Depois de um período, delicioso e divertido, morando no subúrbio carioca, meus pais optaram por voltar para a Zona Sul, para que os filhos tivessem ótimas oportunidades de ensino. Regressamos e fomos para Copacabana, na Avenida Atlântica, bem à beira da praia.
Da mesma forma que meus pais priorizavam uma educação de qualidade, meu pai, principalmente, sempre sinalizou que não custearia a faculdade de algum dos cinco filhos. “Não vou pagar a faculdade de vocês. Senão, eu vou criar cinco vagabundos. Vocês vão ter que trabalhar”, lembro-me, claramente, dele falando. Dois dos meus irmãos, Sérgio e Fábio, optaram por servir a Força Aérea e, com isso, os estudos seriam custeados pela instituição militar. O Sérgio chegou a Brigadeiro. E o Fábio saiu depois do primeiro ano na Academia da Força Aérea (AFA). Eu, a princípio, achei que meu pai estava de brincadeira e que pagaria, sim, a minha graduação, mas eu estava errada, e foi a melhor coisa que me aconteceu. Ter que ser a “dona do meu nariz”, desde cedo, colocou os meus “pés no chão”, e eu amadureci.
Por sonho e por gostar de pessoas, resolvi prestar vestibular para Psicologia. E comecei a trabalhar em um curso de Inglês, como secretária, para aprender a língua gratuitamente e custear os meus estudos. Depois de dois anos cursando Psicologia e com uma professora que era muito “mal resolvida”, eu percebi que não queria ser como ela e resolvi trancar o curso. Como era eu quem pagava, então, tudo certo em casa. Meu pai não poderia reclamar. Como resposta para minha desistência, resolvi morar com a minha madrinha, irmã da minha mãe, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, para colocar a cabeça no lugar e decidir o caminho que eu traçaria.
Já estabelecida no país e fazendo o curso para o TOEFL, para ganhar proficiência no inglês e para cursar uma universidade norte-americana, presenciei muito preconceito – racial, religioso e xenofobia – e, para mim, essas atitudes eram inadmissíveis. Já que meus pais nos ensinaram a respeitar e acolher todo mundo, independentemente de cor de pele ou de religião. Com esse retrocesso, mudei de ideia e, após um ano, resolvi voltar para o Brasil e cursar Letras, pois poderia conciliar a minha expertise com a língua inglesa também.
Reviravolta na vida: de secretária para o marketing
De volta ao País e cursando a graduação em Letras, em 1985, fui trabalhar como secretária, para pagar as mensalidades da faculdade, primeiro, em uma assessoria de comunicação. Mas, em seguida, fui para a Pepsi e depois para Fleischmann Royal – a atual Mondelez –, para trabalhar como secretária do Diretor de Marketing; uma pessoa rigorosa e dura com seus funcionários. Gritava muito.
Com o passar do tempo, notei que a insatisfação dele era pela falta de habilidade com o inglês dos Gerentes de Produto, bem como por alguns problemas de conteúdo. E, para parar de escutar os seus gritos com o time de marketing, eu comecei a pedir para verificar – na verdade revisar – os documentos, antes que os gerentes repassassem para o Diretor. Eu estava ajudando os gerentes de produto com as apresentações, sem sinalizar para o meu chefe as melhorias que eu tinha feito. O intuito era só ajudar. E deu certo. Ele diminuiu os gritos. Entretanto, depois de um tempo, meu chefe foi demitido e, consequentemente, eu achei que também seria, mas o pessoal do Marketing interveio e me convidou para ingressar no departamento, como Assistente de Gerente de Produto. Eu sempre digo que generosidade tem payback, e tem mesmo. E assim eu entrei no Marketing.
Com dois anos, na Fleischmann Royal, a Brahma, recém-adquirida pelo Grupo Garantia, convidou-me para integrar o quadro de funcionários, como Gerente de Produto Júnior. Para aceitar o convite, fiz uma proposta que seria crucial para minha tomada de decisão. Eu coloquei como exigência que eles pagassem um MBA em Marketing, na Pontifícia Universidade Católica (PUC), em 1991, pois não tinha condições de custear, e eles aceitaram a minha condição.
Os dois anos que permaneci na companhia cervejeira foi uma época ótima, eles haviam recém-lançado a campanha da Número 1 para a Brahma, e todo o marketing por trás disso foi um enorme aprendizado para mim. Entretanto, uma funcionária da agência da Brahma achou que eu tinha a cara da Gillette, onde trabalhava o seu marido, e estavam procurando um novo gerente de produtos, e ela perguntou se eu não estava interessada na vaga. Sem pensar duas vezes, mandei o meu currículo e, com isso, fui chamada para participar do processo seletivo da empresa.
A Gillette, na minha época, era uma companhia muito financeira – diferentemente da minha formação acadêmica, em Letras e em Marketing –, e durante a minha entrevista, os superiores se comprometeram a custear o meu MBA, em Finanças, na PUC. Claro que eu aceitei, eu precisava sanar esse déficit na minha formação. Virei Gerente de Produtos Pleno da empresa e um ano depois fui promovida a Gerente de Produtos Sênior.
Eu adorava trabalhar na Gilette, não tinha empresa melhor para mim, na época. Eles eram extremamente educados, processuais e eu aprendi muito de marketing e de finanças na empresa. Até que um dia, uma headhunter me ligou me chamando para trabalhar na Coca-Cola, mas, por gostar do local onde estava, nem quis escutar a proposta.
Depois de dois meses do telefonema, a mesma headhunter me procurou e disse que já tinha encaminhado 19 candidatos para o diretor e nenhum deles soube responder a única pergunta que o Diretor de Marketing fazia na entrevista. Eu fiquei intrigada. “Como assim? Que pergunta é essa que ninguém sabe responder?” E para descobrir qual era a questão tão complicada, comuniquei que passaria na empresa, naquele mesmo dia, na hora do almoço, já que a Coca-Cola ficava a uma quadra da Gillette. Mas, eu só queria saber a pergunta. “Curiosidade é fogo!”
Quando entrei para fazer a entrevista, o diretor me fez a pergunta – que na realidade, para mim, era muito simples –, eu respondi, e na mesma hora ele me disse que eu estava contratada. Só que eu não queria trocar de emprego e, por isso, não aceitei. Para reverter a minha resposta, ele me fez outra pergunta, só que dessa vez, eu não soube responder, pois era referente a um estudo que eu não tinha conhecimento. O diretor falou que se eu integrasse o time da Coca-Cola, eu aprenderia; ele me conquistou pela minha curiosidade, já que eu tinha sede por conhecimento. Ele me fez uma proposta e na hora eu voltei chorando para a Gillette para pedir demissão. Mas eu tinha que seguir a vida. “Para frente é que se anda.”
Novos e sólidos caminhos
Em 1995, fui para Coca-Cola como Gerente de Marketing da marca e, em dois anos, fui convidada para cursar a Coca-Cola University, em Atlanta (EUA), na época, seria a primeira colaboradora brasileira a participar. Fiquei muito feliz de ter sido escolhida, aproveitei ao máximo, aprendi muito e, na minha volta, fui promovida a Diretora de Marketing Regional. Fiquei até o final de 1999, quando houve uma mudança no comando da empresa, e eu não estava feliz, saí. E tenho um carinho enorme pela empresa. A Coca-Cola foi uma grande escola de marketing e de gestão de pessoas.
Assim que eu saí, no final de 1999, fui procurada por um headhunter que me convidou para participar do processo seletivo da Kodak Brasil, aconteceria em São Paulo, e eu topei. Fui para a cidade e tive um dia longo de entrevistas e de videoconferência com o presidente da Kodak Brasil, dois diretores em Miami, até receber a proposta, no mesmo dia. Ótima, aceitei na hora. Mudei-me do Rio de Janeiro para São Paulo em janeiro de 2000, para me tornar Diretora de Marketing na nova empresa. A Kodak era apaixonante. Fotografia é apaixonante. E eu me dediquei à minha nova empresa e à minha nova cidade. Tornei-me “paulioca”. Adoro São Paulo.
Após dois anos e meio, fui promovida a presidente do Chile, Bolívia e Paraguai e me mudei para o Chile para cuidar do novo go-to-market da Companhia. Foi um período de muito aprendizado para mim, pois era a minha primeira experiência como Presidente. Na época, a Kodak era grande, mas com a entrada de um novo CEO, em 2004, vindo da HP, as coisas mudaram. Ele não soube conduzir a visão da empresa e perdeu o timing de se reinventar frente ao digital.
Eu tinha dado certo, pois fui convidada para ser Presidente da América Latina, mas não queria. Seria uma dinâmica exaustiva de muitas viagens e eu não estava a fim de sacrificar a minha vida por isso; mesmo eles deixando claro que eu não teria outra opção. Quem me conhece sabe, eu só fico onde quero ou me sinta bem. Comuniquei aos meus superiores que aquela posição não era o que eu procurava e não aceitaria o convite.
Na mesma época do convite da Kodak, eu fazia parte do YPO (Young Presidents’ Organization) do Chile, juntamente com o dono de uma vinícola, a Viña Estampa. Quando eu contei no meu fórum do YPO que eu pensava em voltar ao Brasil por não querer ser Presidente da América Latina, o dono da vinícola me disse que o presidente da mesma voltou para a Itália, e se eu gostaria de conversar para ser a nova presidente da Viña Estampa; eu adorei a ideia! Imagina, Presidente de vinícola no Chile! Iam deixar “o rato tomando conta do queijo”. Pedi demissão da Kodak e, ainda morando no Chile, passei um ano e cinco meses à frente da vinícola. Que experiência incrível e diferente. Ter um enólogo como Diretor Industrial é garantia de aprendizado.
Até que, em 2006, uma boutique de headhunter com escritórios no Chile e no Peru, chamada Southmark, perguntou-me se eu tinha interesse em fazer outra coisa: desenvolver um trabalho de headhunter e voltar ao Brasil. Eu achei a proposta ótima, pois eu tinha um olhar criterioso, desenvolvido pelas diversas empresas onde eu passei, e sabia como deveria ser o perfil dos profissionais de diferentes áreas. Pedi demissão da vinícola, virei estagiária novamente e, após cinco meses estagiando, regressei ao Brasil, em fevereiro de 2007, e virei headhunter!
Depois de um ano, com o escritório crescendo e com bons clientes, a CTPartners nos convidou a unirmos a eles para estarmos presentes em toda a América Latina. Ficamos com a CTPartners até meados de 2015, quando todos os sócios da América Latina decidiram fazer o management buyout da empresa, ou seja, compramos a empresa de volta. E nos unimos à Caldwell Partners, como uma franquia deles na região. E viramos os donos de toda a operação do Brasil, Argentina, Chile, Peru, Colômbia, México, Venezuela e Miami.
Entretanto, tive uma história de amor no meio disso tudo. Eu já estava divorciada quando ingressei na CTPartners. Conheci meu atual marido que era do escritório de Londres. Depois de 4 anos de ponte aérea SP-Londres nos casamos e, em 2018, eu vim para Londres. Fui convidada pela Korn Ferry para ingressar no escritório de Londres e sigo com eles até o momento.
Conselhos (de ouro) de uma headhunter
De verdade? Eu não mudaria nada. Tudo de bom e de ruim foram experiências que me fizeram chegar aonde eu cheguei. Tive muitas frustações e aprendi muito com elas. Fiz muita bobagem, e aprendi com os meus erros também. Tudo fez parte do meu aprendizado de vida. Se eu pudesse transmitir um conselho – que eu adoraria receber no começo da minha trajetória – seria baseado no provérbio italiano, “Quando em Roma, faça como os romanos”. Olhe e sinta o ambiente onde você está, e tente ser parecido culturalmente. Caso contrário, dirão que você não tem fit cultural com a empresa. E seja ético, sempre. De uma maneira intuitiva, eu fiz isso, mas teria sido mais fácil se tivessem me aconselhado antes.
Fora essa capacidade de integração no meio corporativo, os profissionais devem ser generosos. Generosidade tem payback. Se você ajuda os seus pares, os chefes ou os subordinados, eles sempre se lembrarão de você com carinho. E tem que ser de coração mesmo. Deixei amigos por todas as empresas onde passei.
Perspectivas para o futuro
Futuro... Eu gosto de ser headhunter. Colocar as pessoas certas nas posições certas. Mas talvez no futuro eu foque mais em “coaching para entrevistas”. Muitos executivos que eu entrevisto, hoje, não sabem muito bem como colocar o seu melhor e contar a sua história tanto para o headhunter quanto para o futuro empregador, de forma suscinta e pragmática. E bons talentos perdem excelentes oportunidades.
Eu sempre procuro fazer muito bem o que faço “no presente”. O futuro vai se abrindo aos poucos, e eu verifico se entro ou não, no que aparece. É assim que vejo também o meu futuro. Acredito que meu futuro será maravilhoso. Mas, eu não sei o que poderá se abrir para mim... eu nunca sei. E é sempre bom.