(Editora Global Partners)
Colunista
Publicado em 21 de fevereiro de 2025 às 18h13.
Nasci em São Paulo (SP) e desfrutei de uma infância afortunada no bairro do Bom Retiro. À época, a região concentrava boa parte da coletividade judaica – da qual a minha família faz parte. Saliento como, entre as décadas de 1960 e 1980, a comunidade contava com várias famílias de origem judaica de classe média. Inclusive, frequentei o Colégio Renascença até concluir o Ensino Médio, com o privilégio de nem sequer precisar atravessar a rua para me deslocar – simplesmente, percorria um curto caminho a pé. Enfim, todas as coisas aconteciam no bairro, ao lado de familiares, amigos, em uma fase em que era muito comum brincar nas ruas, jogar bola e praticar atividades simples e divertidas.
Todavia, já prestes a me aplicar ao vestibular, estava ciente de que teria de me dedicar com afinco ao cursinho, pois pleiteava ingressar na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), instituição pela qual me graduei em Engenharia Química, em 1980.
Contudo, rememoro como detinha dúvidas sobre qual carreira seguir, por ser bem jovem e, diferentemente de outros amigos meus, não ter a verdadeira convicção quanto à minha escolha. Antes de escolher Engenharia, realizei testes vocacionais para determinar qual caminho percorrer, e a facilidade com as disciplinas de Exatas me levou por tal caminho.
O curso de Engenharia demanda o estágio obrigatório e, dessa forma, passei um curto período justamente em uma das empresas mais disputadas pelos alunos à época, a Rhodia, do grupo Rhône-Poulenc, hoje Grupo Solvay. Tratava-se de uma organização referência de mercado, um sonho para quem estava na faculdade de Engenharia Química. Contudo, notei, quase de imediato, como não apreciava o ambiente fabril – e isso me levou a contemplar novos horizontes.
Assim, obtive êxito ao ingressar na Promon Engenharia, uma sólida companhia, uma grife no Brasil em termos do segmento de projetos. Costumo comparar, sem exageros, como a marca Promon tinha uma força comparável à que hoje tem a marca Natura.
Contei com a sorte de conseguir a vaga na Promon por meio da indicação do proeminente professor Giovanni Brunello. Isso marcou uma experiência maravilhosa, pois me permitiu trabalhar com projetos dentro de escritórios, representando, enfim, uma mudança singular em relação aos meus anseios.
As boas lembranças deste período são sólidas, mas sabia que apesar disso a minha conexão com a engenharia não era muito forte – algo longe de estar em meu sangue, que não mexia de fato com o meu coração. Muitos engenheiros – e me incluo nesta turma – descobrem outros caminhos, trajetórias de carreira, por meio de outras circunstâncias, oportunidades ou mesmo se capacitando. No meu caso, optei por realizar a pós-graduação em Administração de Empresas na Fundação Getulio Vargas (FGV).
Após incrementar o meu escopo, passei a analisar o mercado para efetuar a migração da Engenharia para outra área, pleiteando o universo corporativo. Nesse ínterim, troquei de emprego algumas vezes, normalmente no nicho de projetos, até entrar na Union Carbide, hoje Dow Brasil.
Nesse caso, consegui uma vaga como gerente de Análise de Negócios, aos 34 anos, marcando como o grande divisor de águas da minha vida profissional. Encerrei minha jornada como engenheiro técnico para me tornar executivo, uma mudança que fez todo sentido para a construção do meu legado.
Ressalto que não foi a primeira vez que liderei equipes, haja vista que havia trabalhado com projetos ao lado de pares, junto às equipes, ainda como engenheiro projetista ou coordenador. Em alguns projetos que desenvolvi na Union Carbide, lidei com os primeiros desafios em uma posição mais elevada. Era complicado conduzir processos e implementar os meus conceitos com os times de implantação de projetos, porque esses profissionais, não raro, ficavam descontentes com gestores externos. Precisava dar ordens, tomar decisões complexas, e muitos tinham problemas em aceitar esse contexto.
No entanto, são vivências que ensinam a aprender com outras pessoas e a encontrar a maneira mais adequada de agir com quem está envolvido nas empreitadas. Reitero que, mesmo antes de a palavra “empatia” entrar na moda, já contava com esse viés para desbravar os momentos desafiadores.
Sempre acreditei bastante na questão de atuar com transparência e diálogo – jamais economizei saliva, pois aprecio conversar, em busca de soluções. São aspectos fundamentais do meu perfil e que me ajudaram, desde o início, a prosperar.
Obviamente, falar de forma demasiada é desagradável, mas o ato de ser assertivo, a partir da comunicação ativa, com foco em relacionamentos, constitui uma habilidade essencial para liderar.
Ao se empenhar dessa maneira, torna-se mais fácil dirimir eventuais dúvidas, acarretando a entrega de bons resultados, em função da troca de informações. Com o tempo, as coisas se ajeitam, a confiança mútua cresce e os resultados surgem.
Pondero que a verdade tem de ser sempre verdade, sem espaço para mentiras, mesmo que pequenas, ou omissões de qualquer espécie – em hipótese alguma cometo tal erro em minhas missões. Claro, o ambiente corporativo é desgastante, gera cansaço, com algumas noites mal dormidas. Todavia, exige atenção para oferecer o melhor, não apenas cuidando da base da organização, mas também em relação aos líderes da empresa, com os quais estou em contato o tempo todo.
Trato de me portar corretamente, sem esconder nada ou hesitar ao reportar alguma notícia desagradável. Caso contrário, as situações que demandam ajustes acabam mascaradas por informações negligentes. Definitivamente, tal atitude jamais funcionará, prejudicando tanto indivíduos quanto empresas. É uma regra inegociável agir com honestidade e transparência, algo que sigo com enorme rigor.
O preparo é primordial para ascender na carreira, sempre se amparando pela verdade, tendo essa virtude como referência. Além disso, destaco a parte intelectual e emocional como diferenciais relevantes para qualquer profissional.
Definitivamente, a vida não se resolverá em uma única reunião, projeto ou decisão, pois exigirá a capacidade de ponderar diferentes cenários. Endosso a relevância de se dedicar com amor àquilo que se propõe a realizar, demonstrando lealdade às organizações e alinhando valores e propósitos. Sem jamais abdicar do fato de que existe vida além do âmbito profissional. Determinado empreendimento nunca será o único da jornada, ou seja, pensar de forma ampla é imprescindível. Observo como as novas gerações tendem a raciocinar de forma urgente, considerando que será o fim do mundo caso algo dê errado. Enfim, lutar por aquilo em que se acredita, com resiliência, é importante, mas a intensidade tem seus limites, haja vista que agir com equilíbrio, respeitando o corpo e a mente, são aspectos valiosos na construção da jornada.
Assevero que os jovens estão se defrontando com doenças graves, principalmente no que diz respeito à saúde mental, como, por exemplo, burnouts, que são situações-limite de difícil retorno. A pressa e a ansiedade para alcançar posições de liderança prejudicam a carreira. Portanto, reitero que é salutar planejar com paciência, apreciando o caminho, para galgar os degraus da escala corporativa paulatinamente, sempre aprendendo com cada experiência que se apresenta.
A presença de indivíduos que contribuem com o desenvolvimento, desde o início, é algo muito impactante. Contei com o auxílio de pessoas inspiradoras, diferenciadas, inteligentíssimas, com ampla bagagem de conhecimentos e excelentes em tomadas de decisão. Em cada vivência pela qual passei, tive a oportunidade de amealhar aprendizados preciosos e sou imensamente grato às pessoas que me apoiaram.
Encontro-me na Natura há 25 anos e conto com uma rede extensa e valorosa de profissionais que me ajudaram a chegar aonde estou. Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Passos, os três principais acionistas da organização, são pessoas que me ensinam constantemente e grandes companheiros de trabalho.
Recebi conselhos do Pedro Passos em momentos diferentes, o que me permitiu aprimorar meu perfil como líder. Inicialmente, Pedro me orientou a ser mais contundente, pois, do contrário, eu sequer teria vida longa na organização. Anos depois, quando assumi o cargo de Diretor de Governança Corporativa – após passar por planejamento estratégico –, Pedro me expôs claramente suas percepções sobre os principais conceitos de Governança Corporativa. Disse-me como muita clareza: “Na Natura, quem governa a empresa é o conselho de administração, não o presidente ou a diretoria. É assim que tem de ser – as empresas vitoriosas prosperam com esta premissa”.
Considero esse debate essencial no mundo da governança corporativa, inclusive por envolver conversas complexas, que causam impactos de toda espécie. Há muitas discussões acerca dos papéis que devem ser exercidos pelos agentes que compõem a Governança Corporativa.
Cito também como autênticos mestres Fabio Barbosa, presidente da Natura, com quem tenho uma excelente relação, além de personalidades como Roberto Marques e Alessandro Carlucci, dois ex-presidentes da empresa. João Paulo Ferreira, presidente da principal unidade de negócios da companhia, é também um grande amigo e uma referência. Além disso, mantenho vínculos intrínsecos com diversos conselheiros de administração. Muitos deles merecem ser destacados, mas prefiro não nomear apenas alguns para evitar esquecimentos ou injustiças.
Mantenho-me motivado ao saber que tenho tarefas importantes para implementar cotidianamente, com amplas responsabilidades junto à empresa e aos colaboradores.
A minha maior motivação é realizar tudo com excelência, especialmente por ter ciência do tamanho das minhas responsabilidades. Desta forma, destaco como a minha liderança é disposta em função do papel que exerço dentro da companhia.
Penso como ocupo uma das posições executivas de apoio mais importantes no Brasil, ao cuidar de um dos conselhos de administração mais respeitáveis do país. Preciso zelar pelo negócio, influenciando adequadamente junto aos conselheiros e donos da organização.
Trata-se de uma responsabilidade enorme ser um “Advisor” – não posso simplesmente sair falando qualquer coisa para os principais líderes. Enfim, isso requer expor reflexões do que é o melhor para a empresa, almejando o seu sucesso, por meio do conselho, da governança corporativa, além de outras recomendações.
Independentemente do momento, se está favorável ou não, busco as soluções pertinentes, com o intuito de prover os resultados alinhados com o tamanho da organização. Tudo engloba contemplar desafios enormes, sempre alinhados com os objetivos estratégicos estabelecidos. Estamos em uma posição favorecida em termos de mercado, justamente pela importância que é a marca Natura. Assevero como a empresa jamais permaneceu estagnada desde a sua fundação, mas procura estar à frente, pensando em novos compromissos – é algo extremamente desafiador e motivador.
Indubitavelmente, o maior sucesso é o reconhecimento – esse é o meu parâmetro. E, consequentemente, o maior fracasso é a total falta de reconhecimento do trabalho desenvolvido. Não quero passar, com isso, uma imagem de egoísmo ou egocentrismo, pois está intimamente ligado ao próprio resultado da empresa. É inviável obter reconhecimento caso a organização não prospere; portanto, são conceitos vinculados.
A boa governança corporativa também é sinônimo de sucesso para mim. Na Natura, com toda a sua imagem positiva, seus resultados consistentes e a aplicação do triple bottom line (TBL) – que engloba os aspectos financeiros, sociais e ambientais –, celebramos o sucesso. Caso fosse uma companhia sem tais conquistas, o conselho de administração e a governança passariam despercebidos, sem impacto, inclusive, para mim. Enfatizo que esses êxitos são frutos de uma boa governança, da união das pessoas certas para discutir planos e da participação ativa em comitês e reuniões. Esse processo auxilia no alcance das metas preestabelecidas, por meio de estratégias ousadas.
Reitero que essa nunca é uma busca egoísta, mas sim baseada em princípios alinhados com aquilo que gera resultados robustos para a empresa. Essa é a forma como enxergo o conceito de sucesso.
Destaco como o aprendizado contínuo é fundamental, especialmente para se manter em
constante atualização. Aliás, já se tratava de uma pauta relevante décadas atrás. Observo, contudo, como precisa haver critério no momento de escolher em como investir o esforço, sendo seletivo, pois, caso contrário, o retorno dificilmente renderá frutos.
Estamos em um momento de grandes transformações, com a Inteligência Artificial avançando velozmente, por exemplo. Quem permanece parado, sem procurar ampliar o leque de conhecimentos, ficará defasado. Nesse aspecto, considero oportuno mesclar conhecimentos específicos com temas mais genéricos.
Vejo ainda mudanças radicais, com profissionais realizando migrações de carreira dentro de seu próprio segmento, por meio de cursos de especializações. Menciono casos de engenheiros que se aplicam a desenvolver suas soft skills, algo que pode ser alcançado com pós-graduações em Psicologia, apenas para se citar um exemplo.
De qualquer forma, é fundamental organizar a agenda para se dedicar ao aprendizado contínuo. Além disso, essa é uma questão que requer o apoio das organizações, uma vez que o desenvolvimento dos indivíduos beneficia a todos os envolvidos.
É salutar manter a mente aberta para aprender, até para evitar o risco de ficar prostrado.
A nova geração precisa compreender isso, pois, sem ação, a pessoa fica improdutiva.
Aos jovens, deixo esta mensagem: não caiam na tentação de permanecer na zona de conforto, estagnados e satisfeitos apenas com o que já conquistaram – é fundamental ir além.
Saliento como a liderança bem-sucedida pressupõe superar bons e maus momentos, porque tudo agrega aprendizados. O líder não pode se iludir ao considerar que somente amealhará sucessos durante a trajetória, ou seja, saber se adaptar é mandatório.
Os períodos difíceis sempre existirão ao longo do percurso, incluindo ter de saber lidar
com as conversas difíceis, eventuais demissões e feedbacks complexos. Em contrapartida, o mesmo vale para o âmbito positivo, de elogiar, de reconhecer o que é bem executado, as conquistas do dia a dia.
Enfim, cabe ao bom líder fazer com que os maus momentos não se tornem “velórios”, ou seja, haverá sempre a possibilidade de dar a volta por cima, algo que exige transmitir as más notícias sem transformá-las em tragédias. Em relação aos bons momentos, é pertinente não criar ilusões, pois os desafios são constantes.
Com esta linha de raciocínio, reitero como a comunicação assertiva é imprescindível na
edificação de uma carreira de sucesso. O diálogo deve ser franco, sempre comprometido com a verdade e amparado pela transparência, pelo companheirismo e pela disponibilidade. O papel do líder é fundamental, pois sua imagem está diretamente vinculada à empresa, o que exige alinhamento com seus objetivos, valores e propósitos preestabelecidos.