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O alinhamento com propósitos e valores auxilia a evitar armadilhas, afirma Roger Carrillo

Na coluna desta semana, conheça a história de Roger Carrillo - Senior Vice President, Global Talent, Learning at Mondelēz International

 (Divulgação)

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Publicado em 10 de janeiro de 2025 às 16h15.

Última atualização em 10 de janeiro de 2025 às 20h12.

Nasci na Venezuela, mas cresci em Pittsburgh (EUA), enquanto o meu pai realizava o mestrado e o PhD. Portanto, até aos 5 anos, morei fora até regressar para casa, onde efetuei os meus estudos iniciais e o ensino superior, tendo me graduado em Relações Industriais pela Universidad Católica Andrés Bello.

A opção pela carreira com foco em Recursos Humanos ocorreu em função da influência da minha mãe (Hildegardis), que atuou com treinamentos, desenvolvimento, performance, enfim, temas que já apreciava bastante. Gostava de compreender como os indivíduos atingiam determinados patamares por meio de princípios, planejamentos e disciplina.

Ao término da graduação, consegui o meu primeiro emprego em uma grande companhia de farinhas e massas. Anteriormente, havia estagiado nas empresas petrolíferas venezuelanas bem desenvolvidas, algo deveras interessante, tendo assimilado aprendizados robustos neste período.

Os desafios iniciais como executivo de uma multinacional notável

Contudo, a primeira experiência na fábrica de massas não contemplava os meus anseios. Dessa forma, consegui ingressar na Philip Morris, em 1994, então dona da Kraft, que posteriormente se tornou a Mondelēz, onde constituí a minha jornada.

Comecei na Philip Morris em 1994, como analista de RH, realizando um pouco de tudo, englobando folha de pagamento, benefícios para empregados, enfim, aspectos voltados à cultura da organização.

Posteriormente, assumi minha primeira posição de liderança como supervisor, liderando treinamentos. Essa fase foi particularmente gratificante, pois trabalhei diretamente com a equipe de vendas, buscando fortalecer o senso de coletividade entre os envolvidos nas operações. A satisfação era grande, já que era possível observar resultados imediatos por meio de ações pontuais realizadas nas ruas.

Em 1998, me casei e iniciei um mestrado na Purdue University, nos EUA, com foco abrangente em Recursos Humanos. Foi uma experiência enriquecedora, que me permitiu compreender melhor outras culturas. Minha esposa (Katiuska) e eu decidimos permanecer nos Estados Unidos, mas, apesar dos cinco anos de experiência que eu já possuía, seria necessário recomeçar do zero.

Sendo assim, a organização propôs que eu retornasse à Venezuela para assumir a região andina como gestor de Planejamento de Talentos, abarcando países como Peru, Equador, Colômbia e Bolívia. Aceitei a missão em Caracas, com sólido crescimento da carreira, expandindo a visibilidade, sempre bem alinhado com o headquarter.

Quando o meu primogênito (Alejandro) nasceu, me tornei diretor de RH para a Venezuela, uma posição importante para a América Latina. Pouco depois, a minha filha (Victoria) veio ao mundo, sendo que eu já era bem considerado na organização.

Em 2006, recusei uma proposta para atuar na Espanha, porque pleiteava algo com maior dinâmica e possibilidades de crescimento. Obtive êxito com esse plano em 2007, ao assumir como diretor sênior de RH para o Brasil, alocado em Curitiba (PR). A capital paranaense é maravilhosa para se morar, e nos adaptamos muito bem.

Destaco esse período como um momento histórico, ocorrido durante o primeiro governo Lula, marcado por vastos investimentos no Nordeste. Foi a partir dessa iniciativa que conseguimos implementar projetos incríveis, incluindo a abertura de fábricas em Vitória de Santo Antão e Recife (PE), gerando inúmeras oportunidades de emprego na região.

Não havia concorrentes do setor de chocolate na região, algo que nos guarneceu a liderança de mercado. O Brasil representou uma experiência fantástica, por ser o maior país da América Latina, detentor do business mais forte, algo que proporcionou enorme visibilidade.

O crescimento constante e veloz rumo à posição de liderança na Mondelēz

Todavia, para continuar em crescimento, teria de ir para Chicago, onde ficava a sede. Conversamos em família e partimos para os EUA, nos deparando com outra mudança, com as crianças precisando se acostumar. Já ocupava a posição de diretor sênior de RH para uma divisão de queijos e lacticínios, um negócio ainda maior, essencial para a organização.

Realizei coisas singulares, construindo os times. Depois, quando a Kraft se dividiu em duas companhias, com o nascimento da Mondelēz, assumi como vice-presidente de RH para a América Latina, em Miami. Aceitei a oferta de imediato, inclusive por estar em um local envolvido com uma cultura bem mais latina.

A movimentação de regressar à América Latina, de visitar os países da região, foi sensacional, ainda mais com tantas responsabilidades e situações complexas para lidar. Tivemos de fechar algumas fábricas na Colômbia e no Brasil, para realizar o supply chain mais eficiente.

Permaneci nessa função por cinco anos, sendo que os meus filhos já se encontravam no Ensino Médio e pretendiam morar em regiões diferentes, como Europa ou Ásia. Assim, parti para Singapura, pensando no futuro da região, com o crescimento da força de vendas, pois a Ásia abriga a maior população do mundo.

Indubitavelmente, adquiri vastos aprendizados acerca de culturas distintas, pois lidava com países como China, Vietnã, Japão, Malásia, Indonésia e algumas partes da África e Oriente Médio. Ou seja, um desafio enorme. Tudo era muito novo para mim e estava com bastante vontade de crescer.

Logo começamos a pensar em outras movimentações, e, em 2021, voltamos aos EUA, em meio à Pandemia de covid-19, sendo que assumi a posição de Global Talent, Learning e Desenvolvimento da organização, com foco. Efetuo processos envolvendo aquisição de talentos, desenvolvimentos, treinamentos, planos de sucessão e cultura organizacional, agregando valores e princípios junto a um time global gigantesco. Além disso, trato de estabelecer as estratégias e as políticas para o mundo inteiro.

Ressalto como já decidi pensar em aposentadoria, pois detenho os direitos assegurados pelo tempo de organização, com os benefícios ofertados pela companhia após trinta anos de dedicação. Penso em projetos futuros, como prestar consultoria ou atuar como headhunter. Estou realizado e feliz, com o sentimento de dever cumprido, embasado por uma história linda.

A relevância de compreender e saber se integrar às culturas diversas

Reitero como deixar a Venezuela rumo ao Brasil representou um desafio enorme, especialmente por conta do idioma. Quando se trabalha com RH, é muito importante – ao menos para mim – romper com a hierarquia, saber conversar com todos os indivíduos, especialmente os mais juniores. Enfim, tratei de me preparar, tive aulas de português, sempre com a mente aberta.

Outro ponto remete a compreender o jeito brasileiro. São pessoas que gostam de trabalhar, mas também de se divertir. Ademais, há enorme comprometimento e satisfação com as realizações. No início, havia certo receio, mas fui aconselhado a me abrir para que o time me conhecesse – é o perfil do brasileiro, com uma cultura de trabalho próxima. Isso gera ideias frutíferas e também o senso de saber desfrutar as conquistas.

Pondero como os temas de liderança acabam sendo similares em diferentes países. Há o líder mais carismático, o detentor de conhecimento, o diretivo. Eu me deparei com desafios, porque vivenciava um momento de virada, de crescimento acelerado. Assim, precisei implementar flexibilidade em algumas áreas, sendo que alguns gestores eram contrários às propostas.

Quando morei em Curitiba, por exemplo, precisava atrair profissionais de São Paulo e Rio de Janeiro, o que demandava um esforço significativo para influenciar muitas pessoas. Já em Chicago, o cenário era mais complexo, com um volume maior de projetos, com várias coisas compartilhadas, em unidades de business distintas.

Nos EUA, me deparei com um cenário mais evoluído em termos de diversidade, inclusão, enquanto no Brasil tais pautas estavam começando a ganhar força, sendo que hoje está bastante sólido. É um tema no qual a organização precisa investir com afinco para atrair as pessoas, os talentos, e que demanda construir a confiança e a credibilidade. O ponto primordial é saber se posicionar para lidar com tais aspectos.

Durante a passagem por Singapura, o inglês era tratado como o idioma oficial. Mesmo assim, busquei aprender chinês, haja vista como é um diferencial conseguir se comunicar com cada cultura, mesmo em contextos de comunicação mais simples.

Tratei de lidar com as diferenças culturais dos países da região, como as respectivas políticas, algo que requer compreender as estratégias das organizações. O aprendizado sobre as diferentes culturas é imprescindível, assim como a adaptação aos idiomas e outros aspectos intrínsecos de cada cultura.

A relevância da parte social, do que se realiza fora do ambiente de trabalho, é algo que priorizo também. Em Curitiba, minha esposa e eu frequentávamos eventos para nos entrosarmos com outras famílias e construirmos novos relacionamentos. Fizemos o mesmo em Chicago, aproveitando as oportunidades de conhecer pessoas em uma sociedade diferente.

O líder deve deter o perfil adaptativo e compreender os âmbitos individuais

Ao abordar o perfil do líder, destaco como a adaptabilidade para lidar com coisas novas constantemente é um elemento precioso. O mundo está mudando velozmente, e quem está à frente dos processos deve seguir aprendendo incessantemente para prosseguir firme na jornada.

Gosto, inclusive, desta analogia: “saber bater com as duas pernas no futebol”, ou seja, ser um gestor ambidestro. Esse tipo de líder consegue transformar o negócio enquanto opera o dia a dia da melhor forma. Quem consegue equilibrar a transformação e a entrega está no caminho certo, embora o cenário de tensão seja inevitável no mundo corporativo.

Outro ponto importante é ser direto com os indivíduos, compreendendo o que eles precisam e almejam para alcançar seus sonhos e objetivos. Um líder que sabe agregar valor ao time, reconhecendo o caráter individual de cada um de forma aberta, contribui para atingir as metas preestabelecidas.

Na Ásia, especialmente em países como China e Japão, a cultura ainda é fortemente orientada pelo que o líder diz, com um foco marcante na hierarquia. Em outras partes do mundo, percebo que os times tendem a contribuir mais com ideias, engajando-se ativamente e propondo soluções. Trazer o time junto nesse processo é fundamental para o sucesso individual e das organizações.

Gerar engajamento e motivação demanda estar próximo aos times

Costumo destacar três aspectos essenciais que funcionam muito bem para promover engajamento e motivação. O primeiro é o reconhecimento pelo trabalho, celebrando as conquistas, o que contribui para manter o nível de progresso.

Além disso, destaco a importância de envolver todo o time nos maiores problemas e desafios, buscando soluções em conjunto. Essa atitude gera uma energia valiosa e fortalece o senso de pertencimento.

Por fim, o contato individual com cada pessoa é essencial para conhecer melhor o time e equilibrar os âmbitos pessoais dos envolvidos. O ato de ajudar, com um olhar atento às demandas individuais, promove conexões de confiança e trocas saudáveis.

Sou bastante curioso e estou sempre em busca de novos desafios, especialmente aqueles que me permitam entrar em contato com elementos diversos, como a elaboração de projetos. Processos relacionados ao futuro me motivam, particularmente ao analisar tendências e como elas impactam a empresa. Isso me dá a oportunidade de estar um passo à frente da concorrência.

Ter atuado em diversos países foi fundamental para o meu crescimento, pois sempre busquei me desenvolver por meio da disciplina e da adaptabilidade. Naturalmente, a entrega de resultados positivos também é uma fonte significativa de energia e motivação.

O alinhamento com propósitos e valores auxilia a evitar armadilhas

Durante a carreira, o profissional pode contar com um chefe inspirador, que transmite confiança. No entanto, nem sempre isso acontece, pois, na maioria das vezes, as pessoas enfrentam dificuldades de desenvolvimento devido à dificuldade em lidar com seus respectivos chefes.

Também, nesse contexto de riscos para a jornada, penso que a carreira internacional exige um alinhamento com a família. Sem o diálogo, os relacionamentos tornam-se frágeis e, consequentemente, o plano da organização pode se romper. No meu caso, tive o privilégio de entender isso precocemente. Minha esposa compartilhava o desejo de conhecer outras culturas, o que facilitou todo o processo para a nossa família, com os objetivos ajustados.

Aproveito para transmitir um conselho poderoso. Caso decida morar em outro país, não imponha a sua cultura – é preciso se integrar às características locais, jamais o inverso. Indubitavelmente, precisa manter as próprias tradições, mas se adequar é ato inegociável para se desenvolver e edificar relacionamentos sadios.

Outra questão imprescindível é evitar acelerar a carreira excessivamente sem estar preparado. A ambição desenfreada, sem passar pelos processos necessários, é uma grande armadilha. A jornada é uma maratona, não uma corrida de 100 metros rasos. Ou seja, acumular conhecimento e vivências ajuda a alicerçar os próximos passos.

Evidentemente, estar completamente alinhado com os propósitos e valores da organização na qual está inserido é pré-requisito para alcançar o sucesso. Gosto muito do meu trabalho – atuo com coisas que estão em casa, como chocolates, queijos de qualidade, produzidos pensando no consumidor. Nesse caso, tentar edificar uma carreira sem a devida identificação com o propósito deixa tudo mais complicado.

Acredite em si próprio em prol de constituir um legado indelével

Acreditar em si próprio é imprescindível – todos somos inteligentes, com potencial para assimilar conhecimentos e aprendizados. Isso requer se aplicar com a ambição sadia, com o desejo de crescer, imbuído de confiança, sem se abalar pelas situações adversas. Se você não acreditar em si, será muito difícil prosperar.

Assevero como edifiquei a jornada passo a passo, planejando, estabelecendo uma rede de suporte que ia além das lideranças, das equipes, para contemplar âmbitos diversos. Dessa forma, pude ramificar o networking com o auxílio de coaches e mentores – algo poderoso, indispensável no mundo corporativo.

É importante no início de carreira trabalhar forte para entrar no grupo de pessoas que conseguirão avançar velozmente, com dedicação, provendo impacto, fazendo a diferença, sem jamais se queixar ou se vitimizar de forma infundada. A competitividade integra parte da trajetória – agir com energia, demonstrando vontade, chama a atenção das companhias; as organizações valorizam e investem em profissionais com esse perfil.

Além disso, atuar amparado pela curiosidade é um diferencial magnífico. Deixar o trabalho 100% melhor do que lhe foi proposto, incluindo a incorporação de novas ideias, viabiliza a abertura de inúmeras portas e oportunidades. Sem jamais deixar de encarar os desafios, almejando estimular o crescimento contínuo.

Por fim, considero que encontrar a própria marca, sem tentar imitar outro líder, é essencial para se destacar em um mercado tão concorrido. Não se trata da posição que ocupa, mas de encontrar o diferenciador. No meu caso, é o de ajudar no desenvolvimento dos outros, compreendendo suas paixões genuínas. Trata-se de encontrar essa característica única, que constituirá o legado, aquilo a ser lembrado e celebrado futuramente.

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