Colunistas

Liderança Antroposófica: um caminho para a gestão humanizada, afirma Patrícia Viotto

Na coluna desta semana, conheça a história de Patrícia Viotto, vice-presidente de RH e Comunicação da Braskem America

 (Editora Global Partners)

(Editora Global Partners)

Publicado em 5 de janeiro de 2025 às 14h43.

A jornada para me tornar uma executiva de sucesso é repleta de episódios marcantes, especialmente aqueles que me alçaram a objetivos admiráveis em um mercado majoritariamente masculino quando iniciei minha carreira. 

Pondero como a força do autoconhecimento, da autoestima, da capacidade comunicativa, além da crença em meus sonhos – amparadas por valores intrínsecos – foram e continuam sendo elementos essenciais em minha história de vida.  

Atualmente, tenho a honra de ocupar a posição de vice-presidente da Braskem America, especificamente à frente de projetos relevantes para o negócio relacionados à área de Pessoas e Comunicação, tais como diversidade, equidade e inclusão.   

Nasci no bairro do Ipiranga, em São Paulo (SP), em meio a uma família com raízes no interior paulista, originária de imigrantes italianos e no ramo comercial e de valores humanos muito profundos. Gosto de destacar como a minha carreira esteve bastante vinculada à maternidade precoce. Me orgulho, demasiadamente, do fato de ser mãe, filha e esposa; papéis que sempre navegam junto com a minha profissão, em seus momentos distintos.  

A minha filha Mariana nasceu quando eu estava com 20 anos, cursando Biologia na Universidade Estadual Paulista (UNESP). O nascimento dela tornou-se um marco em minha vida, que acabou por definir muito do que aconteceria nos anos seguintes. Nesse momento eu ainda tinha muitas dúvidas sobre o que pretendia de fato realizar profissionalmente e, dessa forma, retornei a São Paulo, para cursar Administração na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), onde me graduei em 1998.  

À época, a minha intenção contemplava trilhar um caminho inédito na família e enveredar pelo mundo corporativo, onde eu não tinha referências familiares. Logo no primeiro ano da faculdade, apaixonei-me pela área executiva, em especial por tudo que envolvesse pessoas, e tratei de me dedicar a essa área. Iniciei essa jornada estagiando uma empresa de autopeças, Driveway, além de outras instituições, até me consolidar no segmento industrial, no qual me encontro atualmente.  

O perfil alicerçado com criatividade, empatia e resiliência conduz ao crescimento   

Ressalto que, desde jovem, contei com o auxílio de uma rede apoiadora de excelentes pessoas, detentoras de mentes brilhantes e visão humanizada. Isso me ajudou a amealhar valores intrínsecos que me levaram ao desenvolvimento profissional e pessoal. Busco manter-me sempre atualizada, aprendendo de diversas maneiras, para assimilar novos conhecimentos, conceitos, e também com o propósito de implementar na prática. 

Considero-me uma profissional criativa, empática, resiliente, flexível, tendo percorrido ao longo da minha carreira caminhos que fizessem sentido para os outros e para mim. Conto com alto senso de servir, de abarcar o âmbito social – ensinamentos adquiridos junto à família, de como colocar estes valores em prática, inclusive em termos de liderança. 

Separei-me do pai da minha filha quando ela tinha dois anos e meio, enfim, a partir de então, tudo se tornou bastante desafiador. Indubitavelmente, iniciei como uma profissional em uma época na qual o mundo era muito mais masculino, e tive de aprender a equilibrar a maternidade por conta do preconceito que permeava o universo empresarial.  

Definitivamente, não recebia as mesmas oportunidades por ser mãe, divorciada e jovem. Contudo, ao invés de tratar isso como uma espécie de trauma, segui adiante, com enorme resiliência, buscando aprendizado contínuo e novas oportunidades quando o ambiente se demonstrava desfavorável.  

Meu primeiro passo na carreira foi em uma empresa de alumínio na qual fortaleci a visão humana com base na antroposofia, para depois experimentar vivências em outras organizações também excelentes, como a Unilever, a Philips e a Votorantim. Tive uma experiência muito criativa na Cielo, entre 2012 e 2014 – a única fora da indústria de manufatura, e posteriormente trabalhei na Internacional Paper 

Já em 2017, comecei a alicerçar a minha história na Braskem, culminando no auge da minha carreira no Brasil, e posteriormente uma expatriação para os Estados Unidos. Minha trajetória na Braskem tem sido uma grande oportunidade, especialmente para o meu desenvolvimento, mas também para gerar impacto nas pessoas com as quais trabalho. E, tenho certeza, isso tem produzido um impacto positivo junto à comunidade.  

Os desafios complexos como mulher para crescer no mundo corporativo 

Evidentemente, a principal rede de apoio para conseguir conciliar as atividades profissionais com a vida pessoal envolve a minha família, amigos e líderes. Os meus pais Leny e Antonio, e meus irmãos Alexandre e Leticia, estiveram presentes, me ajudaram, assim como diversas outras pessoas de confiança. Tive líderes que foram mentores incríveis, tanto do ponto de vista dos negócios quanto do lado humano.  

Durante grande parte da minha carreira, trabalhei bastante, era o que chamo de work lover, em um período no qual as mulheres precisavam se provar para alcançar oportunidades trabalhando muito mais para se diferenciarem. Concomitante, estudava idiomas, concluí uma pós-graduação e participei de outros cursos, sempre com o objetivo de aprimorar meu perfil profissional e contribuir de forma prática. Sem esta rede de apoio, seria impossível para uma mulher jovem como eu me desenvolver da forma como fiz, portanto, meu sentimento é de enorme gratidão a todos(as) que me apoiaram nesta jornada. 

No decorrer dos anos, encontrei pessoas excelentes pelo meu caminho. Uma delas, em especial, me deu um conselho valioso sobre a importância de equilibrar a vida pessoal e o trabalho, pois eu estava muito focada nas demandas profissionais. O conselho foi um choque, pois eu já era reconhecida no meio; mas recebi esse feedback esclarecedor e sadio, que me fez refletir sobre o ritmo de trabalho tão intenso que eu me impunha e que, muito provavelmente, resultaria em um burnout. Enfim, levei essa questão para a terapia, onde a esclareci. Esse foi outro marco emblemático em minha vida, pois eu estava em um momento único de performance. Foi quando aprendi a ressignificar o conceito de performance como equilíbrio 

Mais recentemente, tenho entendido o papel da perimenopausa e seu impacto no ambiente executivo. Conto com a confiança do meu líder, um homem muito acolhedor. Pouco se fala sobre a menopausa na vida pessoal e profissional, e o apoio é algo imprescindível. Ao atingir a maturidade pessoal, é muito importante abrir caminho para outras mulheres em diversas etapas de suas vidas. A experiência inicial de minha carreira trouxe empatia e facilidade em quebrar tabus para abrir espaço para um caminho mais integrador para as mais jovens. 

Seguindo essa linha de raciocínio, aconselho: é fundamental iniciar o autoconhecimento o quanto antes, pois ele é uma base sólida para apoiar boas escolhas, tanto pessoais quanto profissionais. Outro ponto importante é aprender a poupar – isso permite independência de qualquer escolha ou projeto que você queira experimentar durante a fase de desenvolvimento de carreira. Exige investir em coisas que provêm prazer e aprendizado. Além disso, aprender sobre o mercado financeiro é essencial para tomar decisões com segurança sobre o momento de pausar, seja temporariamente ou para explorar novas oportunidades.  

Sempre tive uma planilha, pois fui mãe bastante jovem, para saber como conciliar bem meus gastos, sem abrir mão de investir em educação e em coisas que apoiam minha jornada de crescimento, como viagens e o contato com culturas diferentes. 

 

Autoconhecimento e autoestima são essenciais para superar obstáculos 

A questão dos vieses inconscientes sempre foi bastante complicada, especialmente porque não havia a conscientização que temos hoje. Relembro de uma oportunidade para uma vaga na Argentina, da qual fui preterida por ser mãe solo. Tomaram essa decisão por mim, sem sequer me consultarem, o que gerou muita frustração.  

Atualmente, esse tema é muito mais discutido, com maior transparência no ambiente de trabalho. Endosso que o ato de alguém tomar uma decisão por você é um absurdo; foi nesse momento que percebi as muitas discrepâncias existentes. No entanto, esse obstáculo me preparou para os passos seguintes, que me levaram a realizar meus sonhos.  

Considero essencial investir na autoestima e no autoconhecimento para acreditar em si mesmo. Sem a autoestima, tudo fica bastante complicado. A minha mãe jamais deixou de me incentivar, provendo forças para que eu crescesse na minha jornada.  

Não raro, vejo as novas gerações desistindo rapidamente das empreitadas. No entanto, é essencial entender que as barreiras sempre existirão; cabe a nós o poder da escolha e da transformação. Mas, caso o ambiente não seja propício, busque novos horizontes, pois sempre há uma alternativa melhor. 

A liderança antroposófica e a relevância do trabalho coletivo  

Assevero que, quando a pessoa se torna líder, ela não está 100% preparada. Há uma aposta em determinado indivíduo, e ele precisa aprender a lidar com novas responsabilidades. N 

o meu caso, não foi diferente; não estava preparada para ser líder de pessoas na minha primeira oportunidade, devido à falta de experiência.  

Fui formada no conceito da filosofia antroposófica: primeiro focar no meu desenvolvimento, para depois proporcionar aos outros o próprio desenvolvimento. Assim, os fatores de autoconhecimento e autodesenvolvimento são primordiais nessa linha filosófica que me empoderou, a qual também engloba o perfil do líder servidor, que busca o potencial no outro para que ele entregue o seu melhor. 

Gosto do conceito de líder servidor, imbuído de resiliência e empatia, que enxerga o positivo nos outros. Priorizo compartilhar feedbacks destacando as fortalezas dos indivíduos, pois acredito que potencializar tais aspectos são os diferenciais genuínos em termos de desenvolvimento.  

A equipe que acredita e trabalha coletivamente contribui para tornar a trajetória dos resultados mais eficaz, com o apoio do líder na busca pelo melhor de cada um. Além disso, à medida que se amadurece, torna-se mais fácil perceber o potencial das pessoas que integram os times, viabilizando a entrega dos resultados a partir do esforço conjunto, impulsionado pela criatividade e inovação. 

Priorizo entender os sonhos das pessoas, o que cada um deseja para a sua vida. Como líder, tenho a oportunidade de promover as mudanças e ajustes necessários no contexto de trabalho, com o objetivo de ajudar.  

Pessoas realizadas entregam o algo a mais, é natural. Isso pode ocorrer por meio de movimentações, novos desafios, ou mais equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, dependendo dos objetivos individuais de cada um. Embora, para isso, a confiança seja uma aliada essencial no processo.  

Minha filha é psicóloga e nossas conversas me ajudam a desenvolver competências que carrego para o ambiente corporativo. Liderar com sensibilidade, humanidade, amor e compaixão é, para mim, um aspecto inquestionável.  

Transparência, honestidade e colaboração são valores inegociáveis 

Valores como transparência, honestidade nas relações, no diálogo, boa comunicação e saber ouvir antes de falar são imprescindíveis. Especialmente quando se trata de equipes multiculturais, provenientes de contextos distintos, a escuta se torna ainda mais relevante.  

Busco olhar o que o outro tem de melhor para potencializar as suas competências. Aprecio alterar as estruturas das equipes, integrar novos desafios, em prol de desenvolver pessoas. Isso demanda agregar as diferentes potências, pleiteando o ganho em conjunto.  

Algo essencial que sempre coloco em prática é observar as dificuldades individuais de cada membro da equipe. Dessa forma, consigo me antever e estar pronta para oferecer o respaldo adequado. Os times reconhecem isso, especialmente na área de pessoas, que é bastante desafiadora, pois os problemas que surgem afetam as pessoas e toda a empresa. Buscamos desenvolver nossas competências e tratar as falhas dentro do time, mas é o time quem toma as decisões lá na ponta, com autonomia. Meu papel é facilitar o caminho e apoiar o aprendizado.  

Ressalto que o valor de reconhecer a competência do outro profissional é algo precioso para que as entregas sejam efetivas, em conjunto. Com isso, há o reconhecimento tanto do indivíduo quanto do coletivo pelo próprio time. Enfim, o líder, antes de tudo, deve ser um facilitador, e não a pessoa que aparece na frente. Esses são valores que prezo profundamente e que busco aperfeiçoar no meu dia a dia.  

Busque o equilíbrio em todos os âmbitos para evitar armadilhas  

O mundo corporativo é repleto de armadilhas, sendo que o orgulho, o ego e a ansiedade excessiva são as mais perigosas. O ego limita o indivíduo a não reconhecer o valor do próximo, enquanto o orgulho interrompe alguns lugares de fala. Já a ansiedade pode adoecer, levando, até mesmo, a doenças mentais. 

Portanto, atuar com equilíbrio é salutar, e pode ser desenvolvido por meio da meditação, da espiritualidade ou da terapia. Neste contexto de mundo, no qual há a pressão de demonstrar que se é bom, sem espaço para falhar, é crucial cuidar de si próprio, compreendendo que as falhas nos ajudam a crescer. 

Assim como a relação com o próximo é determinante em toda a jornada, evitar tais armadilhas torna o caminhar mais tranquilo e saudável. Os contornos emocionais e de personalidade demandam cuidados desde o início. Pessoas de alto potencial, que começaram muito cedo a entrar em contato com o autoconhecimento, conseguem melhores resultados – está comprovado pela ciência. 

A complexidade multicultural demanda estar atento ao próximo 

A diversidade é, realmente, um grande desafio. Comecei a trabalhar com grupos diferentes na América Latina, para depois encarar novos desafios na América do Norte e na Europa. 

Adoro trabalhar com equipes diversas – é algo potente, pois permite entrar em contato com referências, lugares e realidades variadas, o que me coloca sempre em um estado de aprendizado. Todavia, são equipes que requerem um alto nível de diálogo, com o objetivo de criar.  

Destaco como são realidades bem distintas quando se compara Brasil, EUA e México, em termos de formação de nação. Embora o segredo seja encontrar o ponto em comum, não é uma tarefa fácil. O fator humano requer tempo e dedicação, o que implica um nível de comunicação bastante sofisticado, buscando entender contextos individuais e culturais.  

Dessa forma, o líder precisa se fazer reconhecer em outras culturas que não somente a sua. Mas no final do dia, os aprendizados são extremamente relevantes – nunca convivi com times que não se divertiram ou assimilaram algo valioso.  

Outro tema relevante é ter que contar com equipes situadas em lugares diferentes. O que torna tudo mais complexo é a comunicação, a compreensão acerca da realidade do outro. Liderar equipes espalhadas em diferentes países requer agir com a percepção aguçada e a formação de espaços para promover o relacionamento.  

Fontes de inspiração fomentam a jornada e geram motivação 

Os meus pais são as principais fontes de inspiração em minha vida. Minha mãe sempre cuidou para que os filhos tivessem a autoestima alta, mas com humildade. Já o meu pai conta com uma veia empreendedora contagiante, de saber encarar desafios com ética.  

A minha família é formada por pessoas com foco em carreiras de cunho social, como pedagogos, sociólogos, enfim, com um viés humanista muito forte, sendo em sua maioria mulheres. Promovo isso dentro do mundo corporativo, buscando de maneira constante a humanização dentro do negócio.  

Além disso, atuei com líderes extremamente humanos, que mudaram a minha visão de mundo. Reforço como a antroposofia toca profundamente no meu dia a dia – só é viável mudar o mundo quando há a intenção de mudar a si mesmo. É uma máxima que considero íntegra e ética. 

Sobre motivação: faz parte de um movimento interno. Obviamente, o ambiente externo pode favorecer ou não, porque um ambiente negativo é prejudicial. Mas a motivação está no cultivo do equilíbrio, em ter a vida familiar harmonizada, ao lado da minha filha, meu marido, meus pais e amigos, que são fontes enormes de energia. 

Cuidar do corpo também gera motivação – o equilíbrio emocional deriva de estar em paz comigo mesma. E rezo, contando com a espiritualidade para me energizar.  

Sonhe alto e edifique a jornada com generosidade e ambição sadia 

Sonhar gera ambição positiva e satisfação pessoal. Portanto, é fundamental se dedicar à busca do autoconhecimento, seja por meio de terapia, feedbacks de pessoas de confiança e experiências diversas, para sair da zona do comum e do conforto. 

Outro ponto diz respeito a trabalhar de acordo com a sua ambição – sem se movimentar, nada acontece. Para isso, busque descobrir a sua identidade como indivíduo e profissional.  

Hoje, não há apenas uma única carreira; são várias em uma mesma vida. Então, caso considere que as possibilidades em uma empreitada se esgotaram, busque migrar para outras paragens. Estudar, com profundidade, deve ser uma recorrência, uma vez que vivemos na Era do Conhecimento.  

Por fim, seja generoso consigo mesmo e com os outros. Ampare-se na honestidade, integridade, alinhando seus valores basilares às suas escolhas. Princípios são imprescindíveis nas relações – pratique o simples ato de pedir desculpas e esteja aberto ao que a vida irá propor. Caso contrário, as chances passam. Dedique-se, vivenciando o presente com equilíbrio, sem ansiedade e sem perder de vista os seus sonhos. 

Acompanhe tudo sobre:ExecutivosBraskem