Intencionalidade e curiosidade constituem a chave do sucesso, afirma Yonatan Politi, da Walt Disney
Na coluna desta semana, conheça a história de Yonatan Politi - Vice-presidente & General Manager CPGP LATAM da Walt Disney
Publicado em 1 de setembro de 2023 às, 11h18.
Última atualização em 1 de setembro de 2023 às, 11h19.
As minhas vivências ao longo da jornada permitiram-me entrar em contato com princípios intrínsecos para compreender melhor as interações entre as diferentes culturas e classes sociais ao redor do mundo. Considero imprescindível conhecer a fundo a essência das relações interpessoais e como o impacto de conceitos como a intencionalidade, empatia, diversidade e inclusão confluem em prol de resultados positivos, além de proverem desenvolvimento pessoal. Atualmente, ocupo as posições de vice-presidente e de General Manager LATAM da The Walt Disney Company, empresa com a qual me identifico por conciliar valores alinhados aos meus.
Nasci em um kibutz no sul de Israel, mas desembarquei no Brasil com pouco mais de um ano de idade. Meu pai, Maurice, é egípcio naturalizado brasileiro, e minha mãe, Clara, é argentina. Durante o final dos anos de 1960, ambos militaram contra as ditaduras impetradas em seus respectivos países, o que os levou a buscar asilo fora da América do Sul. Foi nesse contexto que se conheceram em Israel e, posteriormente, se casaram. Meu pai chegou a ser preso político por quatro anos, e devido a essas experiências, aprendi muito sobre justiça social e empatia, compreendendo o que as pessoas vivenciam em outras camadas da sociedade.
Com as democracias restabelecidas na América do Sul, retornamos para morar no Brasil. Meu pai começou a trabalhar em uma multinacional de origem suíça, o que o levou a viajar bastante mundo afora, em ciclos de três a cinco anos. Quando eu estava com cinco anos, fomos morar no Peru; depois, partimos para o México e, em seguida, para o Quênia – onde finalizei a escola e aprendi muito com um professor de Economia, responsável por me influenciar na escolha do meu curso universitário.
Já na Inglaterra, graduei-me em Economia na University of Warwick, em 2000. O meu interesse por Economia estava principalmente em compreender o comportamento das pessoas, então agreguei a disciplina de Política.
Contei com essa preciosa experiência de vida de ter morado em muitos lugares e ter conhecido diversas culturas. Já visitei aproximadamente 50 países, e cheguei a morar nos Estados Unidos antes de começar a trabalhar na Disney. Pela companhia, tive a oportunidade de viver na Austrália, por conta de um programa de treinamento.
Sempre tive a oportunidade de frequentar escolas internacionais e valorizo muito os conhecimentos que adquiri por meio da interação com pessoas de diferentes partes do mundo. Pude aprender inglês perfeitamente, o que considero primordial, pois desta forma se compreende a cultura de determinado país como um todo – sem dúvida, é um diferencial para a vida em diversos âmbitos. Além disso, ressalto a questão de a fluência no idioma abrir a mente para a compreensão de outras realidades, em nível global.
A guinada do academicismo rumo ao mundo executivo
Ao concluir a faculdade, ainda sentia que faltava um pouco mais. Sendo assim, permaneci na universidade para realizar um mestrado em Política Econômica Internacional, com o intuito de alcançar o entendimento sobre como a política influencia o que acontece globalmente. Minha tese, inclusive, abordou as relações entre governo e empresas dentro de uma época e contexto específicos da Argentina.
Havia o viés de pretender trabalhar em uma organização ou no governo. E, ao terminar o mestrado, fui viver na Argentina, especialmente por gostar bastante de Buenos Aires. Porém, dois meses depois, em dezembro de 2001, ocorreu o começo de todo o levante social – e, por conseguinte, a desvalorização brutal do peso argentino.
Não havia empregos e oportunidades, então optei por enveredar pela vida acadêmica para ganhar algum dinheiro – além disso, essa era uma oportunidade de levar o meu conhecimento adiante. Assumi a posição de professor assistente em algumas faculdades para lecionar Economia e, principalmente, matérias de integração econômica internacional. Tais processos estavam ocorrendo exponencialmente no decorrer da década de 1990 e no começo dos anos 2000.
Dediquei-me integralmente a essa prática até ingressar no Programa de Jovens Profissionais da Coca-Cola. Passei a atuar na área de Finanças e permaneci por um ano e meio na companhia. Em dado momento, juntei-me a duas amigas, que tinham interesse em inaugurar em Buenos Aires uma sede de um instituto terciário francês de capacitação em Hotelaria e Turismo. Dedicamos nove meses a este projeto, mas logo que inauguramos percebi que não era o que eu pretendia fazer, apesar de gostar, conceitualmente, de montar um negócio próprio.
O início de uma bela e exitosa trajetória na Disney
Apesar de meus critérios de escolha de carreira serem outros, aceitei uma oferta de trabalho temporário dentro da Disney, em 2005. Mesmo não querendo atuar em uma multinacional, ingressei no grupo e iniciei a minha bela jornada na prestigiosa empresa, pois apreciei muito o ambiente com o qual me deparei.
Na Disney, encontrei um lugar condizente com a minha filosofia, principalmente em termos de cultura aberta. Os chefes não tinham medo das pessoas abaixo na linha hierárquica, ou seja, de que os funcionários soubessem mais. Além disso, havia a possibilidade de tangenciar a carreira com autonomia e de optar por determinados projetos, desde que se impusesse a atitude adequada.
No final do meu primeiro ano na empresa, havia uma vaga nos EUA e me prontifiquei a aceitá-la, mas não deu certo, por ser uma posição muito baixa para justificar um visto de trabalho. Já no ano seguinte, tive uma oferta para ficar alocado no Brasil, mas ela não se encaixava com o que eu pretendia. Enfim, no terceiro ano, outra proposta se apresentou. Eram muitas oportunidades que surgiam em pouco tempo, algo espetacular para poder escolher quais rotas seguir. Esse efeito gera engajamento e, certamente, me motivou a seguir no grupo.
Dentro da Disney, participei de dois programas formais de mentoria, com pessoas de outras regiões, incluindo EUA e Europa. Richard Leon, que foi CFO do Brasil e depois head de licenciamento, me ajudou nesse caminho – foi ele que me trouxe da Argentina para o Brasil. Outro profissional notável em minha trajetória é Miguel Angel Vives, que também reconheceu meu potencial e me deu oportunidades. Não considero uma mentoria estruturada, mas são profissionais que acompanhavam, proporcionavam espaços, promoviam trocas e agregavam com seus amplos conhecimentos.
Fiquei muito empolgado quando voltei para o Brasil, no início de 2008, aos 28 anos. Sou naturalizado brasileiro e a reconexão foi marcante. Foi um desafio me adaptar à língua portuguesa e estar no país sem conhecer muitas pessoas; embora eu utilizasse o passaporte brasileiro, jamais havia passado tanto tempo no mesmo país.
O desafio de lidar com a transformação cultural
Conforme crescemos, os desafios também aumentam. Comecei como analista júnior na área de Finanças, participando de alguns projetos fora da minha área. Sempre tentei me manter muito perto das áreas de Negócios, porque tinha a certeza, desde o início, de que a área de Finanças pura e simples não era mais o meu caminho. Então, quando vim para o Brasil deixei o setor de finanças corporativas para assumir o suporte de uma linha de negócios. Vale ressaltar que, no país, passei por diferentes linhas de projetos: de DVD para CDs de música, depois cinema, televisão, até chegar a licenciamento de produtos de consumo.
Considero minha atual etapa, como responsável pela linha de negócios de produtos de consumo, o meu maior desafio. Dentro do segmento, contamos com 220 pessoas na estrutura Disney na região e mais 250 colaboradores trabalhando em agências: temos escritórios próprios na Argentina, México, Brasil e Colômbia, além de nove agências em diferentes países da América Latina que representam a companhia.
Com essa quantidade de profissionais envolvidos, liderar e moldar a transformação cultural dentro de uma multinacional desse porte significa um enorme desafio. É a esta tarefa que estou dedicando a maior parte do meu tempo desde que assumi a posição como líder regional.
Basta analisar como cada país possui suas peculiaridades. O brasileiro tem algumas características bem vinculadas com o contexto econômico, haja vista a confluência de atores políticos que determinam as agendas da nação. O consumidor local apresenta um dos menores índices de compras de brinquedos do mundo. De acordo com a Circana, uma criança por aqui ganha em média dois brinquedos por ano, enquanto nos EUA esse número chega a quase 40 brinquedos – algo bastante relacionado ao custo de importação e à variação do dólar.
Vale ressaltar que a categoria de brinquedos é a maior da Disney no mundo, mas isso não se aplica ao Brasil. Além disso, o brasileiro tem um amor imenso pelos super-heróis, então a nossa franquia da Marvel é bastante potente. Em contrapartida, o universo Star Wars traz outras peculiaridades. Por isso, fazemos trabalhos específicos para o público brasileiro, em cima de personagens com os quais os consumidores se identificam mais. Outro ponto relevante é como a cultura do gibi no Brasil ainda é relevante: Mickey e outros personagens icônicos são adorados no país.
Intencionalidade, empatia, diversidade e credibilidade
A Pandemia de Covid-19 certamente trouxe uma aceleração na mudança geracional de líderes. Como líderes, precisamos entender muito bem as pessoas que estão trabalhando conosco, nos colocar no lugar do outro. Para levar um time adiante, quem está à frente das decisões precisa saber como motivar os indivíduos, como os impulsionar a realizarem coisas que os interessem.
Não é só a empatia, mas também a intencionalidade de buscar essa interação. Este é um fator-chave. Temos que fazer as coisas de forma intencional, sem passividade, mas imbuídos de empatia. Alia-se a isso a importância da diversidade, da equidade e da inclusão. Compreendendo essa intencionalidade, podemos levar adiante os processos de mudanças de uma forma diversa e inclusiva – e isso precisa ser motivado e feito com orientação.
A união destes tópicos resulta em credibilidade, algo imprescindível para a saúde dos negócios. A liderança atual deve atuar com todos estes aspectos em sintonia, porque vivemos momentos distintos e o mundo exige um líder diferenciado, que se baseie nestes quatro princípios interligados.
No início da carreira, eu definitivamente apreciaria ter entrado em contato com o conceito da intencionalidade e sua relevância. Independentemente do nível da carreira, sempre é preciso entender que não se sabe qual será o próximo passo.
Mas é primordial saber se está agregando valor, de forma intencional, preparando-se para seguir adiante. Pergunto aos colaboradores mais juniores quais são os seus planos de carreira, suas ambições, o que gostariam de fazer, para que possamos empreender juntos. Essas portas se abrem quando se busca com afinco os objetivos, com o devido planejamento. Desta forma, torna-se mais viável estar pronto quando a chance chegar.
A curiosidade é essencial para evitar o comodismo
A principal armadilha no desenvolvimento de uma carreira de sucesso é o acomodamento. Isso passa por se sentir tranquilo onde está, por chegar em um ponto e começar a achar que consegue realizar as coisas de maneira simples. A própria pessoa é a responsável por sair de sua zona de conforto, por se desafiar constantemente. E é muito fácil se acomodar – isso é algo que pontuo como condição limitante e desencorajadora.
No quesito técnico, avalio a capacidade de análise, de forma ampla. No entanto, atualmente, existem comportamentos fundamentais que também precisam ser considerados. Um deles é a integridade: isso é básico, saber que pode confiar na pessoa. O outro é a vontade sólida de realizar, de procurar por desafios constantemente.
As pessoas com esse perfil são mais trabalhosas para gerenciar, pois requerem apoio e direcionamento, mas é muito mais interessante do que lidar com a acomodação. Enfim, é um misto de ter o espírito curioso com a vontade de implementar mudanças. O restante ensinamos a fazer, pois contamos com processos internos propícios para isso.
Além disso, a Disney promove programas liderados pelos setores de RH relacionados ao bem-estar emocional e físico de cada colaborador. Evidentemente, isso se intensificou por conta da pandemia e há um olhar diferenciado. Temos investido bastante no foco em inteligência emocional.
Saliento que no segmento de produtos de consumo, é fundamental estar presente, implementando um trabalho de cultura para que todos possam se conectar melhor. Criamos uma plataforma mais plana, com conexões entre as pessoas, embasados por squads multidisciplinares, com o intuito de deter melhor a compreensão dos objetivos de cada área. Com compartilhamento, evitando conflitos, criando na rotina a conexão emocional entre os indivíduos. Para isso, elaboramos espaços externos de sociabilização, que são opcionais.
Promovemos pesquisas constantemente, com diferentes grupos, principalmente depois da pandemia. Mas acredito ser primordial, dentro de uma grande empresa, entender o nosso próprio microcosmo, o que está acontecendo com todos os envolvidos, saber como cada ação e acontecimento os estão impactando. Tenho trabalhado muito junto aos que reportam a mim para escutar aqueles que atuam conosco no âmbito geral. Desta forma, formulamos políticas internas de eventos e de sociabilização, criando intercâmbios, provendo culturas propositivas para abertura e interações sadias.
Democratizando a pirâmide socioeconômica
Reitero como queremos promover essa conexão emocional, democratizando o acesso em nossas regiões de negócios. Começamos em 2016 um projeto voltado para o desenvolvimento do negócio em outras partes da pirâmide socioeconômica. A intenção é atender essa parcela de consumidores com a criação de produtos e muito foco na distribuição, com programas específicos para poder chegar à base da pirâmide, englobando as classes sociais emergentes.
Menciono um case de sucesso executado no México e no Brasil, e que estamos começando a implementar nos outros países da América Latina, para dar a outras pessoas a oportunidade de vivenciarem a magia Disney. Liderei o início deste projeto no Brasil, em Finanças, mas conectado com as áreas de Negócios. Ele está bastante inserido na visão que temos para a América Latina.
Implementamos um projeto de inclusão no Brasil chamado “O Poder é Nosso”, da marca Marvel, pelo qual convidamos cinco artistas da periferia, grafiteiros para representarem os heróis negros da Marvel. Foi um trabalho incrivelmente legal e bem-sucedido! Junto aos artistas, trabalhamos as suas histórias, provendo visibilidade. É um projeto de negócios, mas com foco em equidade, igualdade e inclusão.
Este projeto foi planejado com empresas lideradas por minorias, e seus resultados financeiros foram altamente positivos. O Manifesto contou com a mentoria da estilista Jal Vieira e traz uma proposta com o objetivo de dar mais visibilidade para as pessoas pretas no mercado artístico brasileiro.
O valor de embarcar nas experiências da magia Disney
Ao observar o perfil do consumidor, muita coisa mudou rapidamente, e é preciso reconhecer o que o público está esperando. As pessoas anseiam por experiências, querem que sua individualidade seja representada no produto. Esta transformação cria chances para todos os envolvidos, começando pelos profissionais responsáveis pela parte criativa, que precisam promover as inovações. É muito comum, por exemplo, um adulto usar uma camiseta de super-herói. Cada vez mais observamos o interesse das mulheres pelas princesas – não aquelas de vestido rosa, mas personagens com perfis que empoderem.
Portanto, essa cadeia abarca desde a parte criativa até o desenvolvimento do produto, para possibilitar que as áreas comerciais, de marketing e varejo consigam trazer os parceiros. Hoje em dia, também temos o foco no desenvolvimento dos pontos de venda, em como atrair de volta o consumidor, algo que os varejistas almejam. Essas iniciativas demandam mais inclusividade nas campanhas de marketing. Falar para todos, mas abordando cada indivíduo de uma forma diferente.
Além disso, um aspecto importante atualmente é a análise de dados, para a compreensão de comportamentos e, consequentemente, o desenvolvimento de negócios. As oportunidades são amplas no setor. Ressalto o valor de conhecer o consumidor do jeito que ele espera ser reconhecido e propor essa experiência por meio de produtos ou outros métodos, como a Exposição Mundo Pixar. Vivenciamos um momento de transformação total.
Quando me perguntam qual é o meu filme favorito da Disney, cito a animação Aladdin. É encantador analisar a saga do menino que quer ir além e busca isso a todo custo, mas no final precisa ser ele genuinamente, porque não funciona ser falso. Não dá para tomar atalhos considerando que dará certo. Além disso, o Aladdin tem aquela vontade enorme de conhecer o mundo – assim como eu.
Intencionalidade e curiosidade: as chaves do sucesso
“A importância de entender a outra pessoa, que está sentada à nossa frente e consumindo o nosso produto, é um princípio indelével, com a intenção e a vontade de fazer acontecer. A mescla destes dois fatores – a intencionalidade e a curiosidade – constitui a chave, o pulo do gato. Se você não tem interesse em conhecer o outro indivíduo, você não tem nada, está fazendo por fazer, acha que sabe de tudo. E se falta energia para realizar, você pode conhecer sobre os mais variados temas, mas pouco executará, nada mudará.
Considero essencial encontrar uma coisa de que se goste e realizá-la da melhor maneira possível. Nunca saberemos exatamente qual trajeto iremos percorrer, quais pessoas serão influentes durante os momentos distintos da carreira. E esses indivíduos futuramente proverão as oportunidades. Certamente não é uma trajetória linear.
As conversas informais entre os líderes são muito poderosas – portanto, sempre dar o seu máximo é muito importante. À medida que o profissional vai construindo a carreira, as pessoas reconhecem, observam esse desenvolvimento e, desta maneira, as oportunidades aparecem, os espaços surgem.”