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De jovem aprendiz de padaria a CEO e Conselheiro Administrativo

Conheça a história de Dirk Schbeider, que já foi CEO da Leão Alimentos e Bebidas e atualmente é membro do Conselho Administrativo da empresa

DIRK SCHNEIDER: membro do Board e Conselho Administrativo da Leão Alimentos e Bebidas (The Coca-Cola Company). (Divulgação/Divulgação)
DIRK SCHNEIDER: membro do Board e Conselho Administrativo da Leão Alimentos e Bebidas (The Coca-Cola Company). (Divulgação/Divulgação)
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Histórias de sucesso

Publicado em 18 de fevereiro de 2022 às, 15h16.

Nasci em 1966, no centro-oeste da Alemanha, em uma histórica cidade de 45 mil habitantes, chamada Wiedenbrueck. É uma região onde predomina o agronegócio e a produção de alimentos, e minha família ainda reside lá. Minha infância e adolescência foram simples, mas muito bem aproveitadas, brincando, namorando e praticando esportes naquelas ruas milenares. Comecei a vida profissional como jovem aprendiz em uma panificadora. Sim, sou um padeiro profissional, com muito orgulho. Na época, estava com 16 anos e não tinha muita clareza do que poderia fazer ou alcançar no futuro. Sabia apenas que precisava iniciar com uma profissão. Evidentemente, desde então, muitas coisas mudaram: mudei de cidades, países, empresas, funções e cargos. Mas, ao longo de quase 40 anos de atividade, do pontapé inicial naquela padaria ao meu muito recente passado, como CEO da Leão Alimentos e Bebidas, Joint Venture do Sistema Coca-Cola no Brasil, e atualmente como membro do Conselho Administrativo da empresa, venho mantendo sempre a vontade de realizar algo novo, de aprender e ensinar.

Após três anos como jovem aprendiz, fiz o serviço militar obrigatório. Nesse tempo, fui treinado para ser um piloto de tanque de guerra, ganhando aprendizado sobre liderança e muito senso de responsabilidade, o que foi fundamental para adquirir maturidade e uma visão mais ampla das possibilidades. Terminei o serviço militar, concluí em seguida o Ensino Médio e fiz a escolha da graduação. Levei em conta a paixão por alimentos e uma boa leitura sobre empregabilidade. Assim, escolhi a Universidade de Tecnologia e Economia de Berlim, onde fiz Engenharia de Alimentos e Embalagens. Comecei em 1989, mesmo ano em que se deu a histórica queda do muro que dividia a Alemanha em Ocidental e Oriental.

Na época, Engenharia de Embalagens era uma área pouco desenvolvida, não só na Alemanha, mas em toda a Europa. Isso me daria diferencial e permitiria abrir portas. Em seguida, procurei adquirir novas experiências e me apliquei – e fui aceito – para um estágio em tempo integral na Kellogg’s, na Inglaterra. Meu inglês não era bom, mas sempre acreditei que é necessário pular na água para aprender a nadar. E não adianta ficar só na parte rasa. Assim foi em vários momentos da minha carreira, em que tive de sair da zona de conforto e buscar fazer algo de forma diferente.

Meu ingresso na Kellogg’s aconteceu em 1992, e aquela foi a primeira vez que saí da Alemanha. Estava quase no final da faculdade e foi um período em que queria aproveitar o máximo, ganhar experiência. Como estava em solo britânico, me candidatei para posições em outras empresas, queria ver como me saía nas entrevistas. Com uma boa dose de ousadia, algo que sempre demonstrei ao longo da minha jornada, me inscrevi para uma posição de supervisor de embalagens em uma fábrica da Unilever. Não estava qualificado para o cargo, não tinha experiências suficientes, mas pensei que, se o perfil da empresa estivesse certo, conseguiria chamar a atenção por meio do meu curso de faculdade. Além disso, com uma boa comunicação, clareza nos propósitos e objetividade, poderia, ao menos, conseguir uma boa entrevista. E não foi diferente. Fiz a entrevista, e não fui selecionado para a vaga, como já era esperado. Mas, por outro lado, fui convidado para ser trainee de desenvolvimento de embalagens no Centro Europeu da Unilever em Port Sunlight, recém-criado para centralizar os processos de Pesquisa e Desenvolvimento. Assim, terminei minha graduação e logo no dia seguinte à formatura peguei as malas e me mudei para a Inglaterra.

O descobrimento do Brasil

Entrei na Unilever em 1993, em uma unidade de trabalho cujo objetivo era fazer a centralização dos processos de desenvolvimento, buscando sinergias entre os países e gerando maior escala para as inovações. Foi muito bom ter participado de tudo isso como um passageiro de primeira viagem. Mas fui me encorpando. Aproveitei este período para fazer uma pós-graduação em Administração na Henley Business School e, em setembro de 1995, fui promovido a gerente de Desenvolvimento de Embalagens, passando a liderar um pequeno grupo de profissionais de distintas nacionalidades. A capacidade para unir pessoas, extraindo o melhor de cada uma, tornou-se neste momento mais importante do que o meu próprio conhecimento técnico.

Nos quase três anos seguintes, ganhei habilidades e competências indispensáveis, como adaptabilidade a mudanças, inteligência cultural e emocional. Isso me credenciou para o próximo desafio, que foi a transferência para a cidade de Valinhos, interior de São Paulo. O objetivo era promover uma transformação similar àquela feita na Europa, com a regionalização dos processos de desenvolvimento dos produtos alimentícios para a América Latina. Em uma sondagem preliminar, quando na Inglaterra, já havia sido questionado se gostaria de me mudar para alguma outra região do mundo. Respondi, na época, América Latina, talvez mais em função da maior aplicabilidade do idioma espanhol. Entretanto, quando fui informado de que tinha uma posição no Brasil, não tive dúvidas em aceitar.

Vim para o Brasil para conhecer o empreendimento e participar de entrevistas e, em junho de 1998, desembarquei em definitivo. Esse período coincide com a Copa do Mundo da França. Foi engraçado porque, no primeiro jogo da Seleção Brasileira, contra a Escócia, fui avisado que trabalharíamos até meio-dia naquela quarta-feira, em função da partida, que começaria às 17h30. Achei inusitada a situação, mas deduzi que talvez fosse por ser o primeiro jogo. Na semana seguinte, contra Marrocos, fui avisado, de novo, que encerraríamos o expediente mais cedo. Quando chegou a terceira partida, contra a Noruega, eu já estava perguntando: “Até que horas trabalharemos hoje?”. Entrei literalmente no jogo!

O alemão certo para derrubar o muro

Graças aos meus dois lindos filhos, os gêmeos Laura e Lucas, que em fevereiro de 2022 completaram 17 anos, estabeleci um plano de fincar raízes neste país. Na Unilever, continuei na parte de desenvolvimento por mais quatro anos. Mas, em 2002, aconteceu o primeiro grande turning point da minha carreira, pois foi quando tomei a decisão de deixar a zona de conforto, saindo da área na qual já tinha quase dez anos de experiência, para assumir novas funções de Supply Chain para América Latina, em São Paulo. Quando abracei este novo mundo, abri novas fronteiras que nem imaginava que poderia aproveitar. Foi também o momento em que saí do nível gerencial para o de diretoria, passando pelos processos de planejamento estratégico, suprimentos e a parte industrial e operações. Esse trânsito por diretorias distintas me acrescentou novas competências, principalmente relacionadas a inspirar, desenvolver e liderar pessoas e como conduzir com sucesso transformações organizacionais e culturais.

Já na condição de diretor industrial, recebi um novo projeto, quando a Unilever se unificou para One Unilever. Isso significou consolidar as, até então, independentes divisões em um único conceito de governança e administração, aproveitando as sinergias de culturas organizacionais e operacionais distintas. Fui convidado para fazer a mudança dentro do parque fabril de Valinhos, e voltei às minhas origens brasileiras, de quando aqui cheguei.

Valinhos era, na verdade, o único parque industrial do Brasil, e um dos poucos do mundo, onde eram transformados produtos de múltiplas categorias, no caso, higiene & beleza, alimentos e sorvetes. Havia centros de produção com lideranças independentes, cada uma com seus conceitos de excelência, mas que, como água e óleo, não se misturavam bem. Fui chamado para fazer a unificação, criando uma única diretoria, gerência, governança para as quatro fábricas que coexistiam dentro do mesmo site fabril. Não foi algo fácil, mas, no fim, com muita criatividade e adaptabilidade conseguimos construir uma cultura de alta performance, com constante troca de experiências e desenvolvimento de talentos incríveis. Este é um dos projetos mais bonitos que já desenvolvi. Alguns brincavam, na época, dizendo que ninguém melhor para derrubar um muro (virtual) do que um alemão, em alusão à queda do Muro de Berlim.

Modelo 100% descentralizado

Entre os anos de 2009 e 2010, começou um intenso processo de globalização da área de supply chain da Unilever. As posições mais sêniores foram transferidas para fora do Brasil, junto com as futuras carreiras indo para locais como a Suíça e Cingapura. Na época divorciado, não estava disposto a deixar meus filhos, e por isso tomei a decisão de não deixar o Brasil. Mas, estava ciente de que as possibilidades de crescimento profissional seriam fora da Unilever.

Tomei a decisão de fazer um Mid Career Change, e em janeiro de 2013, fui convidado a assumir a diretoria de Supply Chain da então recém criada Leão Alimentos e Bebidas, uma empresa 100% nacional, com marcas centenárias e Join Venture do sistema Coca-Cola no Brasil. Na Unilever, ao longo de 20 anos, fui crescendo e assumindo cada vez mais responsabilidades e, com toda essa bagagem, finalmente, conseguiria unir todas as experiências, de todos os processos da cadeia de suprimentos, incluindo Inovação, em uma única posição. E isso me fascinou!

Já na Leão, depois de cinco anos como diretor de Supply Chain, em março de 2018, fui convidado para me tornar o CEO da companhia. Foi o segundo turning point da minha carreira. De novo, representava mais responsabilidade, sair da zona de conforto e, como presidente, assumir também os processos administrativos e financeiros em sua totalidade. O cenário agora incluía um novo desafio, desenvolver um modus operandi diferente do tradicional até então praticado. Este foi o que considero o segundo grande case de sucesso da minha carreira.

Tomamos a decisão, pouco usual para quem lidera o mercado, de descentralizar 100% das operações de uma das principais categorias do negócio. Nunca um líder de mercado havia feito um projeto com essa complexidade no Brasil, colocando suas marcas nas mãos de parceiros estratégicos. Tudo isso representou uma reestruturação radical na cadeia end to end de Supply Chain, consequentemente uma grande redução do quadro dos funcionários. Em adicional, para as áreas administrativas, implementamos um modelo de trabalho 100% flexível. Ou seja: não havia mais um ambiente de trabalho tradicionalmente conhecido. Saímos de vez dos muros que nos prendiam. Não estou falando de hibridismo. Fomos bem mais ousados, mudamos de forma definitiva para 100% remoto.

No mesmo tempo, uma outra categoria da Leão, os chás de infusão, passou por uma outra transformação, o crescimento exponencial da marca icônica Chá Leão, de 120 anos, através do fortalecimento das tradições e inovações aceleradas. Conseguimos ser reconhecidos como a empresa de chás mais inovadora da América Latina.

Com o sucesso e entrega destas missões, os sócios me convidaram para o Conselho da nova Leão. Este órgão, que até então era consultivo, se torna administrativo, o que, obviamente, gera uma corresponsabilidade muito maior sobre a continuidade do desenvolvimento estratégico estabelecido para a empresa.

Se for fazer, faça bem-feito, do início ao fim

Mais recentemente, fiz a formação para Conselho de Administração na Fundação Dom Cabral e não tenho a intenção de parar por aqui, porque sempre aproveitei as oportunidades que me foram dadas. Como aprendizado da minha própria trajetória e como conselho, sempre acreditei que assumir qualquer profissão é melhor do que não ter nenhuma; que estudar em qualquer faculdade é melhor do que não estudar em faculdade alguma. Mas, o mais importante é: se for fazer, faça bem-feito, do início ao fim.

Acredito também muito no conceito de mentoria. Fiz isso na Unilever, como mentor interno, e hoje estou na condição de mentor de um jovem diretor industrial do estado do Paraná, o qual não tem vínculo com a Leão, uma experiência encantadora onde ambos aprendem e se desenvolvem a cada encontro.

Se hoje posso contribuir com outras pessoas é porque tive dois mentores relevantes na minha carreira. Um deles é o americano Nick Marazita, que tive o prazer de encontrar logo no início, quando comecei na Inglaterra, desde a primeira entrevista que fiz. Eu era muito ansioso e impaciente para crescer. Algumas vezes, ao entrar na sala dele para desabafar ou me queixar, ele demonstrava uma habilidade incrível para transformar os meus pensamentos emocionais em algo mais pragmático e objetivo. Quando saía de lá, eu era simplesmente outra pessoa, e pensava: “O que acabou de acontecer ali?”.

Outro momento importante de mentoria para mim foi quando cheguei ao Brasil. Na época, também teve uma pessoa que fez parte do meu processo seletivo, Sérgio Sassi, que foi extremamente importante para o meu desenvolvimento profissional. Ele sempre me encorajou a sair da zona de conforto, deixar os processos ao quais já estava trabalhando e aprender novos. Sempre foi muito exigente consigo e com os outros, entretanto, extremamente justo nas avaliações e reconhecimentos. Tinha, como poucos, o poder de nos fazer buscar resultados cada vez melhores e alcançar êxito.

Não pode faltar ousadia

Hoje, o líder precisa ter a capacidade de, ao mesmo tempo, inspirar e engajar as pessoas, como também foco na entrega de alta performance com resultados planejados e efetivos. Espera-se dele a capacidade de promover um ambiente de colaboração, empatia e com sinergias entre as pessoas. Deve ter uma mentalidade de servir, tanto em relação ao cliente interno quanto externo. E, para alcançar tudo isso, não pode faltar ousadia para transformar, típico de quem tem o poder de inovar, se arriscar e se antecipar a desafios e oportunidades. Atuar na evolução de uma mentalidade conectada ao mundo digital, não precisa ser especialista, mas minimante “fluente”.

Vale lembrar que a crise desencadeada pela Covid-19 ainda não terminou. Aprendemos muito com ela; no entanto, ainda vivemos em uma montanha-russa com subidas, descidas e curvas acentuadas. Há sempre novas surpresas e precisamos estar preparados para elas. Essa é a adaptabilidade para a mudança, essencial em cenários de incertezas, como este que estamos imersos desde os princípios de 2020. Acredito que tudo que estamos vivendo haverá de nos fortalecer e muito. De uma forma ou de outra, mudamos para sempre.

Sejam exigentes, mas também justos

Foram longos os caminhos que me trouxeram até aqui. Porém, se existe um combustível que me impulsionou nesta jornada, em sua fórmula não faltam ética, transparência e muito respeito. Estes não são elementos circunstanciais, mas valores constantes. Não é algo que se aplica apenas quando necessário. É algo contínuo, perene, que faz parte daquilo que somos e de como conduzimos nossas vidas pessoais e profissionais. É nosso alicerce.

Sempre busquei, e busco, ser autêntico em tudo que fiz e faço, na forma como atuo, trabalho e lidero. E, se copiei algo, copiei com orgulho e reconheci.

O modelo que coloco em prática no meu dia a dia, inclui ser um líder presente, empático, humilde, que ouve e reage a cada detalhe que importa a cada pessoa.

Aprendi que ninguém está proibido de mudar de opinião, no entanto, para isso é preciso de coragem. Aprendi também que todos, independentemente do cargo, temos o direito de errar, contudo é imprescindível assumir rapidamente o erro e buscar sua correção com transparência.

E, especialmente para os mais jovens, deixo uma antiga lição: tratem os demais como gostariam de ser tratados. Sejam exigentes, mas também muito justos. Não exijam de ninguém o que vocês próprios não estejam dispostos a fazer. Não há um único dia em que não aplico um destes pilares norteadores de minhas ações e condutas. Isso é o mesmo que espero dos que trabalham ao meu redor, especialmente daqueles que estão gerenciando e liderando pessoas.