Karol Conká mostra como as marcas de pessoas são voláteis
Esse impacto explosivo, para o bem e para o mal, faz das marcas de pessoas um interessante objeto de observação
Publicado em 3 de março de 2021 às, 16h41.
Assistimos recentemente a uma eliminação do BBB com o recorde de votação percentual em um participante, a cantora Karol Conká. A repercussão foi tamanha que deixou em segundo plano qualquer outro assunto no dia seguinte à votação. Mas além da votação e da audiência em níveis altíssimos, esse BBB tem sido exemplar em nos mostrar alguns fenômenos midiáticos de maneira bastante explícita.
Nesse caso, o BBB deixou claro o quanto efêmera é a marca de uma celebridade. Se a entrada no BBB poderia significar a transformação de Karol Conká numa figura popular para toda a população brasileira, as suas ações no programa levaram à rejeição de parte do seu público original e a uma visão negativa para quem a conheceu somente no reality. Como resultado ela colecionou cancelamentos de contratos publicitários e até de suas apresentações musicais.
Esse impacto explosivo, para o bem e para o mal, faz das marcas de pessoas um interessante objeto de observação. Por que elas parecem ser tão efêmeras? Destaco algumas potenciais razões:
- Conexões instantâneas: o processo de um consumidor conhecer uma marca de produtos e serviços demanda que ele tenha múltiplos contatos com ela, através de comunicações da marca, referencias de utilização por outras pessoas e a sua própria avaliação pessoal. A partir desses contatos, os consumidores começam a antropomorfizar as marcas, ou seja, dota-las de características humanas. Já no caso das celebridades, essa avaliação toda não precisa ser feita. Suas atitudes são rapidamente decodificadas e julgadas. Fomos treinados por milênios para fazer isso. Por isso nos apaixonamos e depois conseguimos odiar um personagem no decorrer de 90 minutos de um filme, por exemplo.
- Devem ter impacto cultural constante: no mercado de celebridades só sobrevive quem está em evidência o tempo todo. Isso vale para músicos, atletas, comediantes e atores. Caso ele deixe de estar no filme ou novela de sucesso, ganhar o campeonato ou lançar a música do momento, ele rapidamente é substituído por outra celebridade. Isso faz com que se tenha que arriscar constantemente para se manter em evidência e esse risco pode trazer prejuízos. Claro que temos nesse mercado também algumas pessoas que se tornam “clássicos”, conquistam um espaço cultural cativo e com isso não precisam se expor constantemente. Mas eles são minoria.
- Vivem num contexto cultural volátil: ao contrário de marcas de produtos e serviços que provém algum tipo de benefício tangível, a conexão entre pessoas e celebridades é completamente emocional. As pessoas escolhem se envolver (e seguir nas redes sociais) aquelas celebridades que representam melhor um certo conceito ou ideologia. Se essa ideologia deixa de ser valorizada, a celebridade deve procurar um outro nicho. Se outra celebridade aparece representando melhor aquela ideologia, ela também pode ser substituída. Assim, vemos celebridades se reinventando constantemente para manter-se relevante, como é o caso de Anitta, que passou por diversas transformações para se sustentar na música e na cultura popular.
- Competição intensa: se antes as redes de televisão e revistas selecionavam quem seriam as pessoas com mais visibilidade, hoje em dia a multiplicidade de canais faz com que novas celebridades e subcelebridades surjam a cada semana, de diferentes meios de comunicação. O sonho de ser youtuber ou instagramer se equipara ao de ser artistas, cantores ou esportistas. Cada novo meme, reality show, ou rede social é uma ameaça em potencial para quem hoje está no topo. A briga é intensa e não permite ausências. O preço pela ausência é o esquecimento.
- Erros são indissociáveis: ainda que assessores e equipes consigam aparar as arestas potencialmente danosas de uma celebridade, elas são pessoas. E pessoas tem atitudes e comportamentos que muitas vezes são mal avaliados pelo público, ou são simplesmente inadequados. No caso de marcas de produtos e serviços, uma crise de imagem pode ser isolada e explicada, pessoas podem ser trocadas e soluções podem ser dadas para que o problema não volte a acontecer. Já no caso das celebridades, elas são as únicas responsáveis pelos seus atos. Fica difícil transferir ou dividir a culpa. E como são pessoas que tem um alto impacto nos seus seguidores, a decepção leva rapidamente à rejeição.
Olhar com mais cuidado esses aspectos podem ajudar as celebridades a se gerenciarem e conseguirem a difícil tarefa de se manterem sempre em evidência de maneira positiva.
Observar esses pontos também mostra às empresas os potenciais riscos de um envolvimento mais intenso com as celebridades. A participação das celebridades em processos criativos das marcas (como o caso da Anitta com a Skol ou da Manu Gavassi com a Tanqueray) também demanda especial atenção. O risco é se apoiar em alguém que hoje é visto como uma grande estrela, mas em poucos dias pode se tornar uma grande vilã.
Marcos Bedendo é professor de branding e marketing da ESPM-SP, FIA, PUC-RS e Ibmec, e sócio consultor da Brandwagon consultoria de branding e pesquisa de mercado.