Viajante: o ser humano é uma das espécies mais curiosas e exploradoras da Terra (littlehenrabi/Thinkstock)
Mariana Desidério
Publicado em 6 de agosto de 2017 às 11h54.
Última atualização em 7 de agosto de 2017 às 12h37.
Você é o tipo de pessoa que volta de uma viagem com a próxima em mente? Topa comer insetos na Tailândia, entrar uma gaiola submarina para observar tubarões no México ou descer a Estrada da Morte na Bolívia? Não entende como algumas pessoas conseguem passar a vida no mesmo lugar? Seu grande sonho é conhecer todos os países do mundo e o passaporte é o único documento que você não deixa expirar de jeito algum?
Talvez essa vontade incessante de viajar esteja gravada nos seus genes. O ser humano é uma das espécies mais curiosas e exploradoras da Terra. Não à toa, existe um termo em alemão que define exatamente esse ímpeto por estar sempre de malas prontas: wanderlust.
Alguns cientistas relacionam a propensão a mudar de emprego, ser promíscuo, experimentar drogas e comprar passagens de última hora para um destino exótico a um gene conhecido como DRD4-7D, presente em 20% da população. O pesquisador Richard Paul Ebstein, professor de psicologia da Universidade Nacional de Singapura, estuda há mais de 20 anos a relação entre o DRD-7D e a tomada de riscos no mercado financeiro e defende que existe conexão entre a presença do gene e comportamentos aventureiros.
“Temos evidências para sugerir que o mesmo alelo [variação do gene] responsável pela impulsividade e pela busca de novidades está relacionado com a tendência de se colocar em situações financeiramente arriscadas. As pessoas que têm esse alelo parecem estar mais propensas a desafios”, afirmou em entrevista ao Telegraph.
O gene DRD é receptor de dopamina, um neurotransmissor que atua no controle de movimentos, memória e prazer. Comer uma comida gostosa, jogar e fazer sexo são situações que estimulam os efeitos da dopamina no organismo – e quanto mais você sente prazer, mais você quer. Esse neurotransmissor também é responsável pela ativação de outras substâncias como a adrenalina, o hormônio do frio na barriga.
O gene wanderlust DRD4-7R, como foi apelidado, é uma variante do DRD4. Segundo a teoria, as pessoas que tiverem essa variação genética são menos sensíveis à dopamina e, provavelmente, buscarão experiências mais intensas para liberarem a substância. Além da propensão ao risco e a comportamentos desbravadores, o alelo 7R presente no gene dos globetrotters também está relacionado a transtornos psiquiátricos, TDAH, alcoolismo e dependência de drogas.
A bióloga Dawn Maslar, da Universidade de Kaplan, nos Estados Unidos, estuda os efeitos da dopamina no cérebro e também acredita na correlação entre o DRD4-7R e o número de carimbos no passaporte. Em entrevista à Condé Nast Traveler, Maslar explica que a distribuição desigual desse gene entre os povos pode ser um resultado evolutivo da história recente da humanidade. “Vemos uma proporção maior do gene DRD4-7R em norte e sul americanos, pelo menos em descendentes de europeus que vieram para a região e por aqui ficaram, o que faz todo sentido se pensarmos em termos de evolução”.
Outros estudos também relacionaram a variante genética com a migração. Uma pesquisa da Universidade da Califórnia realizada em 1999 corrobora com a teoria do gene wanderlust: o estudo mostra que o alelo 7R prevalece mais em culturas migratórias do que em povos fixos. Investigações que partiram dessa premissa sugerem, inclusive, que as pessoas que o têm em seu código genético conseguem se adaptar ao estilo de vida nômade com mais facilidade.
Mas para ser mochileiro não basta apenas ter o 7R. Assim como a cor dos olhos ou o formato do cabelo, um só gene não define sozinho os atributos de alguém, por isso é importante que haja interações genéticas para se tornar um verdadeiro desbravador.
E, claro, também são necessárias algumas características que não constam em artigos científicos sobre evolução ou vício em dopamina: dinheiro no bolso, senso de localização, algum conhecimento em línguas estrangeiras e, como Douglas Adams já dizia, uma toalha.
Esse texto foi publicado originalmente no site da revista Superinteressante.