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Coronavac e Oxford: Brasil corre contra o tempo para garantir segunda dose

Em cronograma divulgado em dezembro, Ministério da Saúde estipulou que seriam necessárias quase 32 milhões de doses para iniciar a imunização no Brasil

Em São Paulo, vacinação teve início no domingo (17) (Governo do Estado de São Paulo/Divulgação)

Em São Paulo, vacinação teve início no domingo (17) (Governo do Estado de São Paulo/Divulgação)

RL

Rodrigo Loureiro

Publicado em 18 de janeiro de 2021 às 15h10.

Última atualização em 20 de janeiro de 2021 às 13h11.

O Ministério da Saúde precisa correr contra o tempo para garantir que não faltem doses da vacina no Brasil. Principalmente no que diz respeito à segunda aplicação do fármaco. O temor é de que os brasileiros que forem imunizados com a primeira dose de vacinas produzidas pela Sinovac e pela AstraZeneca não recebam a segunda aplicação no tempo hábil para garantir a eficácia comprovada nos estudos clínicos.

Em uma matemática básica, a conta é simples: cada indivíduo precisa receber duas doses da vacina contra o novo coronavírus. Considerando que o plano nacional de vacinação contempla 212 milhões de pessoas no Brasil, seriam necessárias pelo menos 424 milhões de doses. Isso sem contar as doses que seriam perdidas ou danificadas durante o processo logístico ou no armazenamento.

Ao considerar que a campanha de vacinação será iniciada nesta segunda-feira (18), conforme anunciado pelo ministro da saúde Eduardo Pazuello, o governo precisa ter cerca de 32 milhões de doses das vacinas disponíveis para serem aplicadas antes que o segundo grupo (de pessoas com 60 até 74 anos) receba a primeira dose e respeitando o tempo limite de 21 dias entre as aplicações.

No cronograma previsto pelo Ministério da Saúde, o primeiro grupo a ser vacinado tem cerca de 14,8 milhões de pessoas e é composto por: trabalhadores da área da saúde, indivíduos com 75 anos ou mais, pessoas com 60 anos ou mais institucionalizadas, população indígena aldeada, e povos de comunidades ribeirinhas. O governo estimou que seriam necessárias mais de 31,7 milhões de doses das vacinas.

As fases seguintes imunizariam 22,1 milhões de pessoas entre 60 e 74 anos; e 12,6 milhões de brasileiros com morbidades como diabetes, hipertensão, doenças pulmonares graves, entre outros problemas de saúde que podem ser complicadores no tratamento do vírus Sars-CoV-2. A previsão é de que sejam necessárias 104,2 milhões de doses para a vacinação de 49,6 milhões de pessoas nas fases 1, 2 e 3. Já se considera que 5% das doses entrarão na conta de “perda operacional”.

O plano nacional de imunização do governo federal, divulgado há um mês, informava que o Brasil tinha negociações em andamento para a aquisição de 350 milhões de doses de vacinas de diferentes laboratórios, como Sinovac, Pfizer, AstraZeneca, Janssen e Covax. O documento detalha que as vacinas chegariam em diferentes momentos deste e do próximo ano, por conta da capacidade de produção de cada empresa farmacêutica.

Neste ponto, o contrato do Instituto Butantan com o Ministério da Saúde está sendo seguido à risca. Conforme estipulado entre as partes, o Butantan precisa enviar 46 milhões de doses para o Ministério da Saúde até o fim de abril. Ao todo já foram enviadas 6 milhões de doses. A previsão é de que o Butantan envie mais 2,7 milhões de doses para o Ministério da Saúde até o dia 31 de janeiro, totalizando 8,7 milhões de doses entregues neste mês.

O Butantan ainda pede a autorização para o uso de mais 4,8 milhões de doses da vacina CoronaVac. Neste caso, a nova solicitação se dá porque se trata de um novo lote da vacina. Este lote é envasado no Brasil, pelo instituto, a partir de matéria-prima que foi importada da China.

Já a AstraZeneca, que também obteve autorização para o uso emergencial de uma vacina contra o novo coronavírus, Pazuello espera que 2 milhões de doses sejam entregues nesta semana vindas da Índia. No domingo, um jornal indiano informou que a vacina, que é produzida em parceria com a Universidade de Oxford, informaram que o fármaco só estaria disponível em duas semanas.

Os atrasos e a eficácia

Nos estudos clínicos realizados com a vacina CoronaVac, a eficácia geral do imunizante foi de 50,38% om base nos testes com um grupo de 9 mil voluntários. O Butantan também informou que a vacina é 78% eficaz na prevenção de casos leves do coronavírus e de 100% na prevenção dos quadros moderados ou graves da infecção do vírus Sars-CoV-2. Os percentuais consideram a aplicação de duas doses da vacina, com intervalo de 14 dias entre elas.

Na segunda-feira (18), o laboratório chinês Sinovac Biotech afirmou que seu estudo clínico realizado no Brasil também mediu a eficácia da CoronaVac em pacientes que tomaram a segunda dose com um intervalo superior a 14 dias. De acordo com a Sinovac, o imunizante foi até 20% mais eficaz em um subgrupo de pacientes que recebeu a dose do fármaco três semanas após a primeira aplicação.

Os motivos pelos quais um pequeno grupo de teste obteve uma resposta mais positiva em relação à proteção ao vírus tendo a aplicação da segunda dose em um intervalo maior do que o estipulado previamente foram detalhados. A falta de transparência neste ponto levanta dúvidas da comunidade científica.

Em entrevista recente para a EXAME, Marco Antonio Stephano, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, lembrou que a aprovação para o uso emergencial de qualquer vacina é baseada nos estudos clínicos realizados, que levam em conta uma quantidade específica de doses e um intervalo proposto entre as aplicações. Ao ministrar o fármaco sem seguir o que foi estipulado nos estudos, perde-se a noção de eficácia registrada.

O pesquisador diz ainda que 23% das pessoas que receberem somente a primeira dose da vacina podem não estar protegidas contra a covid-19. “Este é um percentual da população que já não responde bem à aplicação de qualquer vacina por uma característica genética. Sem a segunda dose, essas pessoas ficam mais suscetíveis à infecção”, afirma. O restante, 77%, ainda poderia transmitir o vírus caso fosse vacinado com somente uma dose, segundo o virologista.

“Se o indivíduo toma a primeira dose da vacina, mas não toma a segunda, ele corre o risco de não desenvolver uma resposta imunológica contra aquele agente agressor”, diz Raphael Rangel, virologista e coordenador do curso de biomedicina do Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação. “A primeira dose prepara o sistema imunológico e a segunda aumenta o potencial imunológico para a defesa contra aquele agente agressor.”

“O governo precisa garantir a segunda dose assim que as pessoas receberem a primeira dose”, diz Rangel. Caso o governo não tenha a segunda dose, o virologista explica que o Ministério da Saúde e a Anvisa precisam informar a população sobre o prazo final da aplicação da segunda dose do imunizante e, caso necessário, para uma nova aplicação da primeira dose da vacina como forma de “reativar” o sistema imunológico e prepará-lo novamente para a segunda aplicação.

 

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