Pfizer: vacina precisa ser armazenada em temperaturas baixas (Dado Ruvic/Reuters)
Tamires Vitorio
Publicado em 11 de novembro de 2020 às 10h19.
Última atualização em 2 de dezembro de 2020 às 08h27.
A vacina da farmacêutica americana Pfizer em parceria com a alemã BioNTech contra o novo coronavírus apresentou uma eficácia de 90% entre os voluntários que já foram testados até o momento, segundo dados divulgados nesta segunda-feira, 9. Apesar da boa notícia, a imunização produzida pelas companhias pode ter algumas dificuldades em seu caminho em caso de aprovação (emergencial ou não) após a finalização de todas as fases de testes clínicos.
A vacina da Pfizer, com base no RNA mensageiro, é administrada em duas doses para chegar a uma eficácia maior --- e as doses precisam ser administradas com uma distância de três semanas entre elas. A companhia também afirma que a vacina é capaz de produzir mais anticorpos neutralizantes da covid-19 uma semana após a segunda dose ser administrada. O que pode levar tempo.
Outras companhias também trabalham com uma proteção de duas doses, como é o caso da Moderna, que administra a imunização com um intervalo de quatro semanas, e a da AstraZeneca com a universidade de Oxford, que está, atualmente, testando duas opções, uma com apenas uma dose da vacina e outra com duas doses dadas após dois meses da primeira.
Uma vacina com duas doses requer o dobro de frascos, de siringas, de refrigeradoras, e de visitas clínicas em tempos de limitação de recursos no mundo todo. É preciso também levar em conta que nem todos que foram vacinados com a primeira dose podem se vacinar com a segunda, seja por falta de informação ou por acharem que somente uma já é o suficiente.
Mas a administração de uma vacina em duas doses para aumentar a eficácia não é uma prática exclusiva do SARS-CoV-2, uma vez que vacinas tradicionais, como a do sarampo, da caxumba e da rubéola, utilizam a mesma técnica.
A imunização da Pfizer (umas das dez em última fase de testes segundo um relatório da Organização Mundial da Saúde) pode ter até 1,3 bilhão de doses produzidas no ano que vem — e 100 milhões até o final deste ano, levando em conta que serão necessárias duas por pessoa. Uma esperança em meio a tempos difíceis.
O fato de a vacina ser produzida com a tecnologia inédita do RNA mensageiro também pode afetar também, de certa forma, a distribuição da vacina.
As vacinas de RNA precisam ser armazenadas em temperaturas muito baixas, de cerca de -70ºC, enquanto vacinas de DNA podem ser guardadas em temperatura ambiente. Se a vacina da Pfizer for aprovada, transportá-la para outros países poderá ser um empecilho.
Mas existe uma vantagem em usar este metódo. Com o RNA mensageiro, não há necessidade de cultivar um patógeno em laboratório, uma vez que é o organismo que faz todo o trabalho — o que pode permitir que a vacina seja fabricada mais rapidamente. Para produzi-la, não é necessário nenhum ingrediente como ovo de galinha, usado para a produção da imunização contra a gripe. E elas podem ser produzidas em grandes quantidades de forma mais rápida.
Um grupo de especialistas nos Estados Unidos, por exemplo, divulgou em setembro uma lista de recomendações que podem dar uma luz a como deve acontecer a campanha de vacinação.
Segundo o relatório dos especialistas americanos (ainda em rascunho), na primeira fase deverão ser vacinados profissionais de alto risco na área da saúde, socorristas, depois pessoas de todas as idades com problemas prévios de saúde e condições que as coloquem em alto risco e idosos que morem em locais lotados.
Na segunda fase, a vacinação deve ocorrer em trabalhadores essenciais com alto risco de exposição à doença, professores e demais profissionais da área de educação, pessoas com doenças prévias de risco médio, adultos mais velhos não inclusos na primeira fase, pessoas em situação de rua que passam as noites em abrigos, indivíduos em prisões e profissionais que atuam nas áreas.
A terceira fase deve ter como foco jovens, crianças e trabalhadores essenciais que não foram incluídos nas duas primeiras. É somente na quarta e última fase que toda a população será vacinada.
Segundo uma pesquisa publicada no jornal científico American Journal of Preventive Medicine uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia. Para evitar que outras aconteçam, a prevenção precisa ser 70% eficaz.
Uma vacina com uma taxa de eficácia menor, de 60% a 80% pode, inclusive, reduzir a necessidade por outras medidas para evitar a transmissão do vírus, como o distanciamento social. Mas não é tão simples assim.
Isso porque a eficácia de uma vacina é diretamente proporcional à quantidade de pessoas que a tomam, ou seja, se 75% da população for vacinada, a proteção precisa ser 70% capaz de prevenir uma infecção para evitar futuras pandemias e 80% eficaz para acabar com o surto de uma doença.
As perspectivas mudam se apenas 60% das pessoas receberem a vacinação, e a eficácia precisa ser de 100% para conseguir acabar com uma pandemia que já estiver acontecendo — como a da covid-19.
Isso indica que a vida pode não voltar ao “normal” assim que, finalmente, uma vacina passar por todas as fases de testes clínicos e for aprovada e pode demorar até que 75% da população mundial esteja vacinada.