Ciência

Os 9 objetos espaciais mais fantásticos de 2017

Vimos gigantes vizinhos de novos ângulos. Descobrimos novos sistemas solares (com potencial de vida!). E inauguramos uma nova era da astronomia

Concepção artística do Oumuamua: viajante espacial veloz e misterioso (European Southern Observatory/M. Kornmesser/Divulgação)

Concepção artística do Oumuamua: viajante espacial veloz e misterioso (European Southern Observatory/M. Kornmesser/Divulgação)

Victor Caputo

Victor Caputo

Publicado em 28 de dezembro de 2017 às 05h55.

Última atualização em 28 de dezembro de 2017 às 05h55.

Neste ano, encontramos objetos espaciais extraordinários pela primeira vez, detectamos fenômenos nunca antes vistos Universo afora e inauguramos uma nova fase na história da Astronomia. Vamos aos principais destaques da astronomia deste ano.

Kepler 90

Há poucas semanas, descobrimos o primeiro sistema de exoplanetas com tantos membros quanto o nosso sistema solar. A Kepler 90 é uma estrela que fica a 2,5 mil anos-luz da Terra – e, recentemente, sua família cresceu. O oitavo planeta orbitando a estrela foi identificado pela primeira vez em dezembro, graças à inteligência artificial. O novato, chamado de Kepler-90i, só pode ser detectado quando a Nasa estabeleceu uma parceria entre seu telescópio Kepler e o Google.

Por quê? Bem, nós só detectamos planetas por interferência. Como eles mesmos não produzem luz, só podemos “vê-los” quando passam em frente à estrela, fazendo sombra e afetando (interferindo) o sinal luminoso que recebemos daquele astro.

O segredo está em conseguir diferenciar, matematicamente, as mudanças que são causadas por uma interferência mais banal na luz da estrela daquilo que, de fato, é um planeta. E foi nesses cálculos de confirmação que o Google trabalhou, junto ao seu software de inteligência artificial.

Com a verificação do algoritmo, que oficializou a existência do 90i, a Kepler 90 se tornou a estrela com mais planetas já encontrados fora do Sistema Solar (ainda que nenhum deles demonstre ter condições para abrigar vida).

Em um coração de mãe, porém, sempre há espaço para mais um: de acordo com os astrônomos, o sistema tem toda a cara de ter ainda mais planetas, só não conseguimos flagrá-los ainda.

Cassini

Cassini deu seu mergulho final em Saturno após passar 20 anos no espaço. Mas não sem nos deixar as últimas das lindas imagens que tornaram a sonda famosa.

O projeto foi gigantesco. Lançado em 1997, 17 países participaram, ao custo de mais de US$ 3 bilhões de dólares (lembra quanto dinheiro isso costumava ser? rs). Na época, como a SUPER de 1997 registrou, foi a missão espacial exploratória mais cara da história.

A sonda levou sete anos para chegar a Saturno. Deu 300 voltas em torno dele, também viu de perto as luas Reia, Jápeto (que tem dois hemisférios de cores diferentes, um branco como neve), Dione, Tétis, Encélado (onde encontrou água líquida), Mimas, Hipérion, Febe, Jano, Epimeteu, Prometeu, Pandora, Helene, Atlas, Telesto e Methone.

E terminou sua vida de forma igualmente espetacular. A Cassini mergulhou em direção a Saturno a 133 mil km/h. Não bateu – Saturno é gasoso, não tem superfície – mas foi incinerada assim que entrou na atmosfera do planeta, graças ao atrito.

As últimas fotos (e vídeos, como esse aqui, mostrando a lua Enceladus “se pondo” atrás de Saturno) datam de 13 de setembro, já perto da entrada na atmosfera.

Como epitáfio, ficou apenas o emocionado tweet da Nasa: “Cassini é agora parte do planeta que estudou. Obrigado pela ciência.”

Oumuamua

Concepção artística do asteroide interestelar Oumuamua (1I/2017 U1)

Concepção artística do Oumuamua: viajante espacial veloz e misterioso (European Southern Observatory/M. Kornmesser/Divulgação)

Sim, ele parece um charuto. Mas o asteroide 1I/2017 U1, apelidado de ‘Oumuamua, é muito mais importante para a astronomia do que isso. Ele é o primeiro objeto vindo de fora do Sistema Solar já detectado dentro da vizinhança do nosso Sol.

Cerca de 10 mil asteroides errantes, que se formaram no entorno de outras estrelas, estão passando nas redondezas do Sol neste exato momento. Mas essa multidão toda jamais tinha sido flagrada por um telescópio terráqueo. Até a chegada do nosso belo charuto marrom-avermelhado.

O formato exótico era só uma das pistas mais óbvias de sua origem estrangeira. A confirmação veio mesmo após o cálculo da órbita do baseado ser confirmado. Ela mostrou que, pelo caminho que ‘Oumuamua estava fazendo no momento, ele só poderia ter vindo de fora do Sistema Solar. A grande riqueza da descoberta está na informação que ele pode fornecer sobre a formação e a composição de planetas em outros sistemas solares.

Voyager I

Voyager-1

A Voyager I é uma nave que não cansa de bater recordes – e não foi diferente em 2017. Em toda sua trajetória, que começou nos anos 70, a sonda visitou gigantes do Sistema Solar até se tornar o primeiro objeto feito por humanos a sair dele, há 4 anos.

Como toda sonda, a morte da Voyager estava programada. Ao contrário da Cassini, sabíamos só a data, mas não a forma que se daria a despedida. Isso porque, a partir de 2025 (ano da despedida final), a sonda estaria tão distante que perderíamos completamente o contato com ela, por simples falta de sinal.

O contato com a Voyager acontece através da antena do equipamento. O ideal é que, mesmo a distâncias absurdas, a antena ficasse sempre apontada para a Terra. Só que os motores principais, que corrigiam a posição da antena, já tinham ido para o beleléu faz tempo.

Até surgir a ideia genial: e os motores auxiliares, criados apenas para as missões dentro do Sistema Solar, que estavam apagados há 37 anos? Será que com um tranquinho, o troço religava?

Foi preciso ler manuais (em papel!) que estavam juntando pó e reativar uma série de computadores extremamente antigos, os únicos capazes de se comunicar com o motor desligado. Mas deu certo: a 21 bilhões de quilômetros da Terra, os motores auxiliares deram o empurrãozinho que a sonda precisava para voltar a apontar a antena para nós. E, com isso, a Voyager enganou a morte: ganhou 3 anos a mais de vida para continuar a nos descrever como é o Universo lá fora.

KELT

Este ano, descobrimos o KELT-9b, que você pode chamar também de “planeta mais quente de que já se teve notícia”. Sua superfície está a uma temperatura na casa dos infernais 4.327 ºC, o que desbancou o recordista anterior por mais de 1.000 ºC. Mas comparar a temperatura do KELT-9b com outros planetas é até injusto.

Planetas absurdamente quentes, como Vênus, ainda ficam só na casa dos 460 ºC. O novo planeta já joga na categoria de temperaturas de estrelas. Apesar de não superar o nosso Sol (o KELT-9b ainda fica 1.300 ºC abaixo dele), ele bate as estrelas mais avermelhadas, mais frias, cuja temperatura fica na faixa dos 2.000 ºC. Esse calor todo é explicado pela proximidade do KELT-9b em relação a uma estrela extremamente quente, que ganha em tamanho e temperatura do nosso Sol: a quase-xará KELT-9 ostenta 9.897 ºC na superfície e é 2,5 vezes maior. E o KELT-9b está tão perto dela que poderia completar uma órbita em um dia e meio.

Trappist 1 e LHS1140b

Esse item vale por dois. Porque por mais exoplanetas que tenham sido descobertos esse ano, só quatro deles foram considerados verdadeiramente promissores para quem busca vida extraterrestre. O anúncio da descoberta de Trappist-1, um sistema a 39 anos-luz do nosso, já balançou o ano em fevereiro. Até a Nasa (que tende a ser cética nos seus anúncios) mostrava uma baita empolgação com a possibilidade de acharmos vida fora da Terra.

Isso porque o Trappist-1 é um sistema com 7 planetas, mas três deles estão na chamada Zona Habitável – pela temperatura e distância da estrela, tem condições de possuir água líquida na sua superfície. Além disso, são similares à Terra em tamanho, massa e por serem planetas rochosos. Se a vida existe lá fora nas mesmas condições daqui, esses planetas são belos candidatos a anfitriões – caso a atmosfera deles apresente condições igualmente boas.

Meses depois, anunciamos (com menos pompa e circunstância da Nasa), a detecção do LHS1140b. Ele também está na Zona Habitável, é só 40% maior que a Terra e tem uma estrela mais “amigável”, que emite menos radiação. O melhor é que, assim como Trappist-1, ele está a 39 anos-luz, uma distância que permite a visita de sondas. Claro que essas descobertas podem estar iludindo todo mundo (até a Nasa). Mas, ao que tudo indica, se há vida lá fora, encontrá-la parece cada vez menos uma tarefa impossível.

Júpiter

A chegada da sonda Juno ao maior planeta do Sistema Solar foi uma das principais notícias científicas de 2016. Dando continuidade à tradição, Juno este ano fez história fotografando Júpiter de novíssimos ângulos, graças aos vôos rasantes que dava próximo ao planeta. Além das fotos incríveis, Juno conseguiu descobrir mais sobre a Grande Mancha Vermelha de Júpiter, uma tempestade que já dura mais de três séculos e uma das partes mais misteriosas do gigante gasoso.

Para começar, Juno descobriu que a Grande Mancha é mais profunda do que parece. As raízes do ciclone estão a mais de 300 km da parte mais externa da atmosfera do planeta. As estimativas são de que a Mancha seja entre 50 e 100 vezes mais profunda que os oceanos da Terra. A mancha, aliás, equivale a uma vez e meia a largura do nosso planeta. E você pode mergulhar nela por si próprio no vídeo abaixo, vendo o que a Juno “viu” através de seus sensores. Atente para os marcadores de temperatura: a base da tempestade é tremendamente mais quente que o topo.

A estrela zumbi

As classes maiores de estrelas costumam terminar sua vida com uma grande explosão, que chamamos de supernovas. Descobrimos uma estrela que foge a essa regra. Não porque não explode – e sim porque não cansa de explodir.

A iPTF14hls havia sido dada como morta em 1954. Em 2015, no entanto, passou por mais uma supernova. E a parte mais interessante é que, mesmo depois de vários desses eventos fúnebres, a estrela não havia perdido seu brilho. Continuava mais viva do que nunca, pronta para a próxima.

Observações de 2017 confirmaram, graças à composição química do corpo celeste, que se trata, de fato, de uma estrela-zumbi – cujo nome técnico oficial é “supernova de instabilidade de par pulsante”. A categoria já tinha sido teorizada por astrofísicos, mas essa é a primeira estrela a pertencer oficialmente a essa classificação.

Estrelas de nêutrons

Imagem publicada pela National Science Foundation ilustrando a fusão de duas estrelas de neutrons

Imagem publicada pela National Science Foundation ilustrando a fusão de duas estrelas de neutrons (National Science Foundation/AFP)

A gente imaginava que estrelas de nêutrons colidem. Só que ninguém nunca tinha visto isso acontecer, até 2017. O mais louco dessa notícia (que foi também a principal notícia de ciência do ano) é que ela une dois dos fenômenos mais curiosos do universo: estrelas de nêutrons e ondas gravitacionais.

Até muito recentemente, as ondas gravitacionais que tínhamos conseguido detectar vinham da colisão de buracos negros gigantescos, com mais de 20 vezes a massa do Sol, a milhões de anos-luz de distância. A pancada emitia uma quantidade gigantesca de energia, na forma de ondas gravitacionais.

Dessa vez, a pancada foi bem diferente – e o efeito das ondas gravitacionais que chegaram até a Terra foi muito mais longo e intenso. Os cientistas perceberam que algo diferente estava acontecendo.

Estrelas de nêutrons são formadas em supernovas e, ao contrário de buracos negros, são relativamente pequenas, coisa de 20 km de diâmetro. Mas nesse espaço minúsculo, são capazes de concentrar a massa de um Sol inteiro. Já existiam teorias há um tempo defendendo que, como essas estrelas vivem em pares, faria sentido que perdessem energia e se aproximassem até rolar uma colisão.

Uma batida dessa geraria jatos de detrito e energia para todos os lados. Mas esse carnaval todo nunca tinha sido visto. As ondas gravitacionais mudaram tudo.

Quando os cientistas detectaram um sinal estranho, avisaram de onde no céu estava vindo o fenômeno. Mais de 70 cientistas do mundo inteiro apontaram seus equipamentos para lá, usando as coordenadas do “GPS gravitacional”. Eles captaram radiação eletromagnética de todo tipo proveniente da explosão. Teve observação em tudo quanto é lugar, inclusive na Antártida.

Os cientistas do LIGO, da Nasa e da Fundação Nacional Americana para Ciência batizaram esse tipo de observação de “Detecção Multimensageiros”. São sinais completamente distintos do Universo convergindo para uma descrição mais completa – e mais complexa – de eventos cósmicos misteriosos. E essa mudança promete mudar a astronomia para sempre.

Este texto foi publicado originalmente no site da Superinteressante.

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