Nomofobia: indivíduo sente necessidade de deixar telefone celular ligado por 24 horas, sempre por perto e visível (Ijubaphoto/Getty Images)
Agência de notícias
Publicado em 3 de agosto de 2023 às 10h00.
Muitas pessoas podem desconhecer o significado da nomofobia, embora convivam com ela diariamente. Essa condição é caracterizada pelo medo irracional de ficar sem o celular ou ser impedido de usá-lo por algum motivo, como a ausência de conexão à internet ou uma bateria fraca.
O termo deriva do inglês “No Mobile” juntamente à palavra “fobia”. Essa nomenclatura representa os sentimentos e as sensações do indivíduo que não consegue viver sem as novas tecnologias.
A fobia ocorre como parte de um processo químico nos circuitos cerebrais, relacionado às trocas neuroquímicas entre as células neuronais, atuando em uma estrutura que nos protege involuntariamente do perigo. O indivíduo com transtorno ansioso de nomofobia, quando se vê impossibilitado de se comunicar por alguma tecnologia, sente-se ameaçado, como estivesse em perigo, e é capaz de dormir com o telefone celular ligado por 24 horas, deixando-o sempre por perto e visível.
A condição segue o mesmo princípio de qualquer outra fobia. O indivíduo com um transtorno ansioso costuma desenvolver dependência patológica de uma determinada tecnologia (computador ou telefone celular), como forma de minimizar as suas dificuldades. Isso porque esses dispositivos costumam trazer a sensação de segurança, bem-estar e confiança, reduzindo o estresse em muitas situações do cotidiano.
O indivíduo com transtorno ansioso de nomofobia, quando se vê impossibilitado de se comunicar por alguma tecnologia, em vez de segurança e confiança que poderia adquirir, sente-se ameaçado como estivesse em perigo. Essa ideia, construída de maneira equivocada, faz com que a impossibilidade de se comunicar seja considerada, e isso é o bastante para disparar os sintomas indesejados.
Em relação ao telefone celular, podemos observar indivíduos que apresentam sentimentos de ausência e vazio ligados à falta do aparelho. Mesmo com o dispositivo nas mãos, apresentam a falsa impressão de se sentirem acompanhados como se estivessem com uma pessoa do lado.
O indivíduo que tem nomofobia é capaz de dormir com o telefone celular ligado por 24 horas e, quando não é possível permanecer com ele ligado, o mantém no modo vibrador, deixando-o a fácil alcance.
O comportamento nomofóbico que leva o indivíduo a depender do telefone celular dá apenas um alerta da existência de um transtorno primário que deve ser investigado, pois está relacionado aos estados emocionais.
A fobia pode desencadear distúrbios psicossomáticos, tais como cefaleia, diarreia, dores de barriga e outros. No caso do medo, os sintomas são transitórios; logo que o indivíduo se acostuma, desaparecem. Assim, a fobia exige um olhar e um tratamento mais específico e elaborado.
O indivíduo que sofre de transtorno fóbico desenvolve sinais de tensão, ansiedade e apresenta frequentemente o sentimento de tristeza, depressão, irritabilidade por não conseguir ver solução para o desconforto emocional que sente. No geral, o sono e as funções executivas – atenção e a memória – são prejudicados.
O corpo gera sintomas somáticos devido à excitação do sistema nervoso autonômico, como sudorese, boca seca, pulso rápido, respiração superficial, dor de cabeça, enjoos, podendo também apresentar inquietudes e comportamentos motores sem sentidos.
Para despertar estas condições, é necessário que se entenda a neurobiologia do “gatilho emocional” que acontece no cérebro humano, como, quando ele é disparado e por que, muitas vezes, em determinadas situações, o indivíduo perde o controle emocional. O fundamental é compreender que essas reações são saudáveis, por serem um sinal de que seu corpo reage aos estímulos, por mais estranho que pareça.
A fobia acontece num processo químico nos circuitos cerebrais. Sendo assim, ocorre nas trocas neuroquímicas entre as células neuronais, numa estrutura que nos protege involuntariamente do perigo, as amígdalas cerebrais. Desde que seja direto e real, é perfeitamente normal se proteger.
Uma pessoa, ao sentir-se ameaçada, acelera o metabolismo, antecipando a necessidade iminente de “fugir ou se defender”. O corpo lança uma corrente de hormônios vasoconstritores e aceleradores de frequências cardíacas, entre os quais estão a epinefrina, a norepinefrina e o esteroide cortisol. É uma reação neuroendócrina, puramente fisiológica, que perpassa pelo sistema mental superior para ser interpretado e avaliado sobre o contexto do perigo.
Quando esses hormônios são lançados no corpo, o coração começa a bater mais rápido e mais forte, a pele fica fria e arrepiada, os olhos se dilatam para enxergar melhor e as áreas do cérebro envolvidas na tomada de decisões recebem a informação de que é hora de agir. É nesse momento que entram em ação as amígdalas cerebrais – estruturas responsáveis pelos processamentos das emoções primitivas, do medo e do ódio, amor, raiva; e que são vizinhas do cérebro límbico-primitivo, tendo também como função de arquivar as memórias emocionais.
Para minimizar o transtorno nomofóbico, será importante desenvolver uma atitude preventiva por meio da “escuta emocional e social” do indivíduo, no que tange aos aspectos funcionais do cérebro, da mente e do corpo em relação ao contexto social e ao funcionamento do sistema de recompensa do sistema límbico. Educar a emoção é promover uma habilidade relacionada com o motivar a si mesmo a persistir diante das frustrações, controlando impulsos e canalizando emoções para situações apropriadas.
Processos cognitivos e emocionais quase sempre dirigem o crescimento com sucesso das capacidades cognitivas. A emoção vai dando forma à cognição. As crises emocionais, naturais ao desenvolvimento de qualquer ser humano, vão influenciar, de forma crônica, a geração da dependência e da fobia por tecnologia.
As compulsões por internet e telefones celulares são caracterizadas por atos compulsivos, comportamentos usados como uma tentativa para neutralizar o mal-estar subjetivo que afeta o processo psicofisiológico do indivíduo. Assim sendo, provavelmente existe um aumento do risco de nomofobia em pessoas com transtornos de controle de impulso.
Por Marta Relvas
Dra. em Psicanálise, Psicopedagoga, Membro da Sociedade Brasileira de Neurociência e Comportamento, autora de livros sobre Neurociência e Educação publicados pela Editora Wak Editora.