Cocaína (majo1122331/Thinkstock)
Vanessa Barbosa
Publicado em 21 de maio de 2017 às 08h17.
Última atualização em 21 de maio de 2017 às 08h17.
São Paulo - As florestas tropicais da América Central estão começando a desaparecer a um ritmo alarmante, ameaçando o sustento dos povos indígenas e colocando em risco alguns dos ecossistemas mais ricos em biodiversidade. O culpado? O tráfico de cocaína.
Ao contrário do que se pode pensar em um primeiro momento, não é o cultivo da planta de coca em si que está causando esse "narco-desmatamento", mas a lavagem de dinheiro, praticada por agentes do narcotráfico que compram enormes quantidades de terra para lavar seus lucros ilegais. A constatação vem de um estudo publicado nesta semana na revista científica Environmental Research Letters.
O estudo estima que o tráfico de cocaína representa até 30 por cento da perda florestal total em Honduras, Guatemala e Nicarágua na última década, ameaçando os esforços de conservação para manter os sumidouros de carbono florestal, serviços ecológicos e meios de subsistência rurais e indígenas.
Segundo os pesquisadores, a atividade ilegal se reveste de uma imagem de negócio legítimo, comumente dando espaço à agricultura e pecuária para lavagem de dinheiro, além de mineração e empreendimentos turísticos.
Os pesquisadores atribuem esse processo à repressão pesada ao narcotráfico, que empurra a atividade para áreas mais remotas, de natureza protegida. "Começando no início dos anos 2000, a fiscalização de drogas liderada pelos Estados Unidos no Caribe e no México levou os narcotraficantes a lugares mais difíceis de patrulhar, como as grandes áreas florestadas da América Central", disse David Wrathall , geógrafo da Universidade Estadual do Oregon e coautor do estudo.
"Uma das melhores maneiras de lavar dinheiro ilegal da droga é cercar grandes parcelas de floresta, cortar as árvores e construir uma fazenda de gado. [O narcotráfico] É um grande e não reconhecido motor do desmatamento tropical na América Central ".
O impacto do narco-desmatamento afeta tanto os ecossistemas quanto as comunidades tradicionais: povos indígenas que vivem de forma sustentável nesses ambientes são deslocados e uma enorme biodiversidade é perdida, diz a pesquisa.
Para os autores, as soluções para frear o narco-desmatamento incluem desmilitarizar a guerra contra as drogas, fortalecer a posição dos povos indígenas e das comunidades florestais tradicionais para que eles salvaguardem as terras florestais remanescentes e desenvolver a conscientização regional sobre a questão.
"Estamos cruzando os últimos de nossos espaços selvagens na América Central", disse Wrathall. "Obviamente, acabar com o comércio de drogas ilegais seria a melhor solução, mas isso não vai acontecer. De fato, quando os esforços de fiscalização de drogas são bem-sucedidos, eles muitas vezes empurram a atividade para áreas remotas que não tiveram problemas antes, tais como os hotspots remotos de biodiversidade".
Com base em dados do programa Global Forest Change, sobre mudanças na cobertura florestal mundial, a equipe de cientistas identificou uma taxa de desmatamento anormal entre 2001 e 2014, que não se encaixava nos padrões espaciais ou temporais previamente identificados causados por formas mais típicas de assentamento ou colonização de fronteiras.
A equipe também estimou o grau em que o tráfico de narcóticos contribuiu para a perda de florestas, usando um conjunto de 15 métricas desenvolvidas a partir dos dados para determinar a taxa, momento e extensão do desmatamento.
Com essas informações em mãos, os cientistas então cruzaram as taxas anormais de desmatamento com os dados do Escritório de Política Nacional de Controle de Drogas, considerado a melhor fonte para estimar o fluxo de cocaína através do corredor centro-americano.
As comparações ajudaram a confirmar as relações entre o desmatamento e atividades como a pecuária, a exploração madeireira ilegal e a especulação de terras, métodos que os traficantes usam para lavar os lucros do tráfico de drogas em áreas remotas de florestas na América Central.