Larva da Galleria mellonella, inseto também conhecido como traça-do-favo-de-mel, come sacos plásticos de supermercado no almoço (CSIC Communications Department/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 26 de abril de 2017 às 10h07.
Na ruínas da usina de Chernobyl, na Ucrânia, já há fungos que se alimentam de radiação. E traças comem livros desde que o mundo é mundo. Agora, a evolução biológica revelou o próximo elo de sua culinária eclética — uma que, de quebra, pode dar uma mãozinha para a espécie humana no combate à poluição.
A larva da Galleria mellonella, inseto também conhecido como traça-do-favo-de-mel, come sacos plásticos de supermercado no almoço. Ou, para ser mais técnico, é capaz de digerir polietileno, um dos polímeros mais simples da química, e transformá-lo em etileno glicol, uma espécie de xarope adocicado e muito tóxico que é usado como anticongelante nos motores de carros em lugares frios.
Ela virou notícia hoje após ser descoberta, por acidente, pela bióloga espanhola Federica Bertocchini, que é especialista em desenvolvimento embrionário, mas cria abelhas por hobby. A pesquisadora do Instituto de Biomedicina e Biotecnologia de Cantábria, na Espanha, encontrou uma infestação de mellonellas comendo o mel e a cera de suas colméias no quintal, e precisou limpar a bagunça.
Sem suspeitar do estômago de ferro das danadas, colocou todas em um saco. Má ideia. Quando voltou à cena do crime, algum tempo depois, o plástico parecia um queijo suíço de tão furado, e as larvas rastejavam felizes pelo jardim.
Se você não pode vencê-las, junte-se a elas. Bertocchoni, então, ligou para dois colegas da Universidade de Cambridge, e juntos eles descobriram que as mellonellas não estavam só picando o saco para fugir, mas também se alimentando dele.
Em um teste de laboratório, 100 larvas engoliram 92 mg de plástico em 12 horas — um recorde biodegradável. Bactérias capazes de digerir garrafas PET já haviam sido encontradas no Japão, mas não eram tão rápidas.
Para garantir que elas não estavam mastigando só por diversão, os pesquisadores também fizeram purê de mellonella, e passaram a massa de larvas esmagadas, repleta de enzimas digestivas, em um pouco de filme plástico. Em 14 horas, 13% da amostra desapareceu. Os resultados foram publicados no periódico Current Biology.
Ao The Washington Post, a pesquisadora afirmou que é pouco provável que as traças do favo de mel tenham desenvolvido a habilidade exótica com o plástico em vista – é mais provável que esse seja só um efeito colateral da capacidade de digerir seu alimento de preferência, que é justamente cera de abelha.
“A cera em si é uma mistura complexa de moléculas, e contém uma ligação química que também está presente no polietileno”, afirmou. “Deve ser por isso que ela evoluiu um mecanismo molecular para quebrar essa ligação.”
Agora é só ter calma – o próximo passo ainda não é jogar toneladas dessas minhoquinhas em um aterro sanitário e deixar que elas resolvam o trilhão de sacos plásticos (sim, 1 trilhão mesmo) que descartamos todos os anos. (O número assustador é do Earth Policy Institute).
O caminho é isolar a enzima, e tentar reproduzir seu efeito em laboratório sem entupir o mundo de toneladas de mellonellas. É possível que a temperatura ideal para ação da substância que degrada o plástico não seja tão fácil de reproduzir fora do organismo do verme – e também pode ser que o responsável pela digestão na verdade seja uma bactéria no interior do animal, e não o animal em si.
Este conteúdo foi originalmente publicado no site da Superinteressante.