Coliseu, célebre ponto turístico da Italia: idioma do país é cada vez mais influenciado pelo inglês (©AFP / Tiziana Fabi)
Da Redação
Publicado em 10 de agosto de 2012 às 12h50.
Roma - A língua de Dante Alighieri corre risco de se transformar em um "italenglish" em pleno coração da Itália, onde até o presidente de Governo, Mario Monti, confessa em entrevista que tem um "sense of humor" (senso de humor) muito anglo-saxão, sem lembrar que suas frequentes aulas de economia estão aptas somente para aqueles que dominam o idioma inglês.
Essa situação de exclusão também pode ocorrer com um italiano que tenta compreender as novas medidas econômicas impostas pelo governo através da leitura dos jornais, já que todos estão cheios de palavras como "spread" (prêmio de risco), "spending review" (revisão da despesa), "bond" (bônus), "soft skills" (habilidades sociais) e "fiscal compact" (pacto fiscal).
"A língua inglesa tem o monopólio lingüístico no mundo, já é uma língua planetária e, enquanto Espanha e França mantêm fortes políticas de protecionismo lingüístico, a Itália preferiu adequar-se a todos estes novos termos de mercado", disse à Agência Efe o lingüista da Universidade de Salerno, Sergio Lubello.
Entre a mitologia do inglês e o provincianismo de muitos italianos, que pensam que dominar o inglês é dizer quatro palavras nesse idioma, "a língua anglo-saxã se instala perfeitamente na Itália, que, por sua vez, carece de políticas culturais e lingüísticas", completa Lubello.
Diante deste cenário, os jovens italianos, que se comunicam pelo "computer" (computador) e se reúnem no "weekend" (fim de semana) para tomar uns "drinks" (bebidas), acabam seguindo essa mesma tendência.
O estranho é que os italianos ainda utilizam termos de origem latina, como "escalation", "database" e o próprio "sense of humor", na língua de Shakespeare. No entanto, essas palavras são procedentes do latim, essencial na formação da identidade europeia ocidental e na criação de grandes línguas nacionais, incluindo o italiano.
Mais surpreende ainda é que em um país nacionalista como a Itália, onde sua bandeira é estampada até nas meias soquetes e sua presença em um produto alimentício ou têxtil é garantia de qualidade, exista um Ministério de Welfare (Bem-estar), sem falar do "Election Day" (Dia de Eleições) e suas "exit poll", as famosas pesquisas de boca de urna.
Embora alguns lingüistas estejam convencidos que esses anglicismos desaparecerão da mesma forma que surgiu, a maltratada Accademia della Crusca (Academia de letras italiana), com sede em Florença e ameaçada "por falta de fundos", levanta sua voz - em italiano, é claro.
Isso porque, a decisão do prestigiado Politécnico de Milão, de apresentar cursos de pós-graduação e de doutorado em pesquisa técnico-científica exclusivamente em inglês a partir de 2014, acabou sendo muito criticada pelos lingüistas italianos.
Segundo o vice-presidente da Academia da Crusca, Luca Serianni, se o Politécnico realizar seu projeto, a língua italiana perderá uma parte importante de si mesma, além da possibilidade de se expressar no âmbito técnico.
O filósofo Tullio Gregory também reprovou esse plano recentemente nas páginas do jornal "Corriere della Sera": "Impor o inglês não nos faz mais modernos e nem mais produtivos. Ao contrário, danifica a cultura humanística e científica".
"É uma internacionalização para tornar o Politécnico mais competitivo", defende o ministro da Educação, o engenheiro Francesco Profumo, que sustenta que apresentar aulas exclusivamente em inglês "aumenta as aptidões dos graduados italianos e também atrai estudantes vindos do exterior".
Emanuele Banfi, presidente da Sociedade de Lingüística Italiana, defende um "bilingüismo virtuoso que favoreça os conteúdos, sua divulgação e a formação completa dos estudantes, italianos e estrangeiros", como afirmou em um discurso na Crusca no final de abril.
Enquanto lingüistas, filósofos e políticos se perdem em discussões sobre o futuro do idioma italiano, um alto-falante de um ginásio do bairro de Roma anuncia: "Marquem o "chek up" (revisão) médico na "reception" (recepção) do clube".