Aedes aegypti: cientistas já haviam identificado anteriormente que o anticorpo reage com o vírus da dengue (Thinkstock/Damrongpan Thongwat)
Estadão Conteúdo
Publicado em 24 de novembro de 2016 às 10h33.
São Paulo - Um grupo de cientistas americanos deu mais um passo no desenvolvimento de uma terapia para o tratamento de zika, de acordo com um estudo publicado nesta quinta-feira, 24, na revista científica "Nature Communications".
Os pesquisadores descobriram o mecanismo pelo qual um anticorpo humano chamado C10 consegue evitar a infecção pelo vírus em nível celular.
Os cientistas já haviam identificado anteriormente que o anticorpo C10 reage com o vírus da dengue e, depois, descobriram que ele é um dos mais potentes para neutralizar a infecção por zika.
No novo estudo, os pesquisadores deram um passo adiante ao determinar como o C10 é capaz de evitar que o zika infecte as células humanas.
A pesquisa foi liderada por cientistas da Escola de Medicina Duke-NUS - instituição que reúne colaboradores da Universidade Duke (Estados Unidos) e da Universidade Nacional de Cingapura -, em parceria com pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte (também dos EUA).
Para infectar uma célula, o vírus se vale de partículas que atuam em dois estágios: encaixe e fusão. O desenvolvimento de terapias contra os vírus muitas vezes focam nesses dois estágios.
Durante o encaixe, uma partícula do vírus identifica locais específicos na célula e adere a eles. No caso da infecção por zika, o estágio do encaixe permite que a célula deixe o vírus entrar através de um endossomo - um compartimento isolado do corpo celular.
Proteínas na parte externa do vírus passam então por mudanças estruturais para se fundirem com a membrana do endossomo, liberando assim o código genético do vírus no interior da célula e completando o estágio de fusão da infecção.
Utilizando um método chamado microscopia crioeletrônica - que permite a visualização de partículas extremamente pequenas e de suas interações - os cientistas observaram o anticorpo C10 interagindo com o vírus em diferentes níveis de pH, imitando os diferentes ambientes nos quais o vírus e o anticorpo se encontram durante a infecção.
Os pesquisadores demonstraram que o C10 se liga à proteína principal que forma a membrana externa do vírus - independentemente do pH - e trava a movimentação dessas proteínas, impedindo que elas passem pelas mudanças estruturais necessárias para o estágio de fusão da infecção. Sem a fusão do vírus com o endossomo, o código genético viral não consegue entrar na célula e a infecção é evitada.
Foco na fusão
"Felizmente, esses resultados irão mais tarde acelerar o desenvolvimento do C10 como uma terapia contra a zika para combater seus efeitos, como microcefalia e síndrome de Guillain-Barré. Mas é preciso destacar que será necessário realizar mais estudos, com modelos animais, sobre o efeito do C10 na infecção por zika", disse a autora principal do estudo, Lok Shee-Mei, do Programa de Doenças Infecciosas Emergentes da Duke-NUS.
"Por determinar a base estrutural para a neutralização do vírus, esse estudo reforça a ideia de que esse anticorpo poderá proteger contra a infecção por zika, potencialmente nos levando a uma nova terapia para tratar essa temida doença", disse outro dos autores, Ralph Baric, do Departamento de Epidemiologia da Universidade da Carolina do Norte.
Além de indicar que o C10 poderá servir para o desenvolvimento de uma terapia para a infecção por zika, a descoberta também sugere, segundo os autores, que desregular o estágio de fusão com o anticorpo é uma estratégia mais eficaz para deter a infecção, em comparação com terapias que tentam desregular o estágio de encaixe.
Segundo eles, isso ocorre porque o estágio de fusão é crítico para a infecção por zika, enquanto o vírus pode desenvolver mecanismos alternativos para superar a desregulação do estágio de encaixe.