Sucos: de acordo com pesquisa, até os sucos de frutas 100% naturais aumentariam risco da doença (Pixabay/Reprodução)
Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de julho de 2019 às 21h37.
O consumo de bebidas açucaradas, como refrigerantes e sucos, está associado a um aumento do risco de câncer. A conclusão é de um estudo publicado nesta quarta-feira, 10, no British Medical Journal (BMJ). Embora seja bem conhecida a relação entre bebidas açucaradas e doenças como hipertensão e diabete, a ligação do consumo com casos de câncer ainda é pouco medida.
A pesquisa concluiu que um aumento de 100 ml por dia no consumo de bebidas açucaradas (incluindo nessa lista os sucos de fruta 100% naturais) foi associado a uma alta de 18% no risco de câncer em geral e a um aumento de 22% no risco de câncer de mama. Separadamente, o grupo das bebidas açucaradas (como os refrigerantes) e o dos sucos de fruta também têm relação com a alta de casos de câncer.
Para realizar a pesquisa, uma equipe de cientistas acompanhou, durante no máximo 9 anos, 101 mil adultos franceses saudáveis (21% homens e 79% mulheres) com média de idade de 42 anos no momento da inclusão no estudo. Os participantes tinham de preencher relatórios com sua rotina alimentar - as tabelas incluíam bebidas açucaradas e bebidas adoçadas artificialmente.
A aparição de casos de câncer ao longo dos anos também era relatada pelos participantes e validada por profissionais. Durante o acompanhamento, 2.193 casos de câncer foram diagnosticados. Ao fim do acompanhamento, os pesquisadores fizeram a correlação entre o consumo diário de bebidas açucaradas e a doença. Fatores de risco para o aparecimento de câncer, como idade, histórico familiar, tabagismo e nível de atividade física foram levados em consideração para a análise.
A pesquisa não identificou relação entre o aparecimento de câncer e o consumo de bebidas adoçadas artificialmente (como os refrigerantes diet), mas os cientistas recomendam cautela ao interpretar essas estatísticas. Segundo os autores, houve baixo nível de consumo desse tipo de produto pelos participantes, o que pode comprometer a análise.
Pela metodologia da pesquisa, também não foi possível apontar por que o açúcar, em si, pode levar à aparição da doença. Mas os pesquisadores sugerem que o consumo elevado de bebidas açucaradas pode estar ligado à maior gordura armazenada em torno de órgãos vitais, como fígado e pâncreas, independentemente do peso corporal, e a marcadores inflamatórios - ambos os fatores ligados ao aumento do risco de câncer.
Segundo os próprios autores, mais pesquisas são necessárias para confirmar o elo entre câncer e bebidas açucaradas. "Esses dados demonstram a relevância de recomendações nutricionais para limitar o consumo de bebidas açucaradas, incluindo os sucos de frutas 100%, e medidas como taxação e restrições a propagandas", indicaram os autores.
Segundo Mario Carra, presidente do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), é mais clara, até hoje, a relação entre a obesidade e o aparecimento de alguns tipos de tumores. "Preocupa mais a obesidade do que o consumo do açucarado em si", diz o endocrinologista.
"As bebidas açucaradas, como são fáceis de serem ingeridas, acabam aumentando o peso das pessoas", explica. Segundo ele, porém, já há indícios de que o açúcar por si só pode ser "tóxico" para as células, aumentando os riscos de tumores.
Para Carra, a população precisa estar atenta ao que consome. "O suco de fruta é água e frutose. Perdem-se todas as boas qualidades de uma fruta. Ganha-se mais comendo uma laranja do que tomando um copo de suco de laranja", explica.
É necessário, porém, cuidado para não "demonizar" certos alimentos, segundo Carra. Também é preciso compreender que múltiplos fatores concorrem para um diagnóstico de câncer. "Não é o refrigerante que vai dar câncer. A pessoa tem de ser propensa e ter outros hábitos ruins, como não fazer exercício, ter vida desregrada, não ter hora para dormir e acordar, ter excesso de peso."
Em novembro do ano passado, o Ministério da Saúde divulgou acordo com a indústria de alimentos e de bebidas para reduzir os teores de açúcar de biscoitos, bolos, produtos lácteos, achocolatados e misturas para bolos. A meta é de retirar 144 mil toneladas do ingrediente nesses produtos até 2022.
Dados do governo indicam que o brasileiro consome 50% a mais de açúcar do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em média, por dia, cada habitante ingere 80 gramas (ou 18 colheres de chá do produto). Um terço desse consumo é de açúcar presente nos alimentos industrializados.