Freud: ele considerava que 80% das pessoas eram "hipnotizáveis" (Hans Casparius/ Getty Images)
EFE
Publicado em 15 de janeiro de 2017 às 11h11.
Madri -- "Tenho diante de mim uma senhora sob os efeitos da hipnose, por isso posso continuar escrevendo tranquilamente", afirmava há cem anos Sigmund Freud, neurologista alemão fundador da psicanálise, em escritos inéditos que revelam sua faceta de hipnotizador.
Durante dez anos, Freud (Freiberg, 1856 - Londres, 1939) se interessou pela hipnose e a utilizou em suas consultas, prática que documentou em relatórios, artigos e cartas reunidos e publicados pela primeira vez de forma organizada pelo escritor Mikkel Borch-Jacobsen em um livro.
Segundo Jacobsen, estes textos são essenciais para compreender a gêneses da psicanálise, e demoraram mais de um século para serem divulgados porque os proprietários dos direitos da obra do austríaco os consideravam sem importância.
Uma vez que a obra de Freud passou a ser de domínio público, Borch-Jacobsen achou que tinha chegado o momento de "preencher esta surpreendente lacuna" pesquisando os registros do psicanalista, que contam inclusive com várias fotografias da época.
Após suas experiências, Freud escreveu em um de seus artigos que a hipnose era recomendável "a qualquer doente" sempre que praticada por um médico "com experiência e digno de confiança".
Segundo Freud, tudo o que se escrevia na época sobre os supostos perigos desta técnica eram apenas histórias.
O fundador da psicanálise considerava que 80% das pessoas eram "hipnotizáveis", mas reconhecia que as hipnoses profundas eram "bem mais raras" que o desejável para o "bem da cura".
Freud explicava que o grau de hipnose depende mais do paciente que do médico, ou seja, "emana diretamente da boa vontade" do hipnotizado.
Outro dos artigos publicados no livro, uma contribuição de Freud a um manual para clínicos gerais, aborda a hipnose sob um ponto de vista essencialmente prático, com técnicas de indução que mostram, passo a passo, como deveria ser praticada.
O neurologista começava suas instruções assegurando que a técnica do hipnotismo é "um ato médico tão difícil de realizar como qualquer outro" e aconselhava a quem se sentisse "ridículo" em sua dignidade de médico a não adotá-la.
Segundo Freud, a hipnose servia para curar, mas sua verdadeira propriedade curativa "reside sempre na sugestão", que consiste "em negar energicamente os males dos quais o paciente se queixa".
Em sua busca por novos meios para curar seus pacientes, qualificados na época como "nervosos" ou "histéricos", Freud considerava a hipnose muito útil para acessar os processos do inconsciente.
Freud explica o caso de uma paciente "histérica ocasional" que, após cada parto de seus três filhos, não podia comer nem amamentá-los. Depois de consultar vários médicos, o assunto foi solucionado com várias sessões de hipnose praticadas por ele, apesar de a mulher e seu marido terem "aversão" a esses métodos.
"Sentia vergonha - disse a mulher a Freud - de ver que uma coisa como a hipnose obtinha resultados onde minha força de vontade se mostrava impotente".
Entretanto, com o passar dos anos, Freud abandonou progressivamente o método da hipnose e passou ao da catarse e ao da associação livre, fundamento da psicanálise.
Após uma vida materializada em 23 volumes (suas "Obras completas"), Sigmund Freud morreu na Inglaterra em 23 de setembro de 1939, um ano após deixar Viena, onde os nazistas queimaram seus livros.