Tubos de ensaio: Empresas contratam, cada vez mais, pesquisadores (Horia Varlan/Creative Commons)
Da Redação
Publicado em 11 de julho de 2012 às 17h55.
São Paulo - Aos 28 anos de idade, o engenheiro agrônomo mineiro André Brito está prestes a se tornar doutor. Ele não perdeu tempo em sua trajetória universitária. Assim que concluiu o curso de agronomia na Universidade Federal de Lavras, em Minas Gerais, ele emendou um mestrado em fitotecnia (estudo das técnicas de cultivo de plantas) e, na sequência, começou o doutorado.
Com tudo isso, seria um candidato a seguir carreira de pesquisador ou professor doutor na universidade. Mas seus títulos e o conhecimento garantiram, no início deste ano, uma vaga de pesquisador na multinacional Dow AgroSciences, fabricante de defensivos agrícolas e sementes transgênicas.
Hoje, André trabalha no desenvolvimento de milho resistente a pragas. “Direcionei minhas pesquisas para a aplicação prática, pois sempre quis trabalhar numa empresa”, diz. As oportunidades para pesquisadores como André vêm crescendo no mercado pela necessidade das companhias de investir em inovação para manter a competitividade.
Segundo estimativa do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o número de mestres e doutores no setor privado cresceu 17% de 2005 a 2008, ultrapassando a marca dos 8 000 profi ssionais. Porém, ainda sete de cada dez pesquisadores atuam em universidades.
Nos Estados Unidos, um dos líderes mundiais em inovação, cerca de 80% está no setor privado, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Um estudo divulgado em janeiro pela União Europeia mostra que o Brasil ocupa o 42o lugar entre as 48 nações mais inovadoras. O país, no entanto, foi um dos que mais evoluíram em dez anos, subindo cinco posições. “Setores como computação, biotecnologia e química fi na já absorvem doutores”, diz Jorge Guimarães, presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
A Dow AgroSciences contratou nos últimos dez meses 20 pesquisadores e praticamente dobrou sua equipe. A empresa, com faturamento de 600 milhões de dólares, está implantando a sexta unidade experimental no Brasil e teve de buscar jovens na universidade e gente experiente. “Oferecemos ao cientista um plano de carreira em que ele pode crescer e atingir o status de um presidente regional”, diz Antônio Russo, diretor de recursos humanos da empresa. O salário de um novato no mercado fi ca em torno de 5 000 reais. Com cinco anos de experiência e um título de doutor, esse profi ssional pode ganhar o dobro.
Também nas pequenas
A Monsanto, outra multinacional do setor agrícola, tem no Brasil 650 funcionários na área de pesquisa. A companhia planeja contratar 20 pesquisadores nos próximos 12 meses, para ampliar seu principal polo de desenvolvimento de novas variedades de cana de açúcar. No segmento de biotecnologia, há ainda cerca de 250 micro e pequenas empresas no país.
Além da agricultura, elas atuam em áreas como saúde, energia e meio ambiente e têm 2 700 pessoas trabalhando com pesquisa. “Mais empresas estão criando centros tecnológicos, laboratórios e contratando pesquisadores. É uma tendência que deve se intensifi car”, diz Ruy Quadros, professor de política científi ca e tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
A base desse movimento é o crescimento gradual dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (área chamada de P&D), em que a parceria entre os setores público e privado é essencial para os resultados. Em 2008, o país aplicou 1,1% do seu Produto Interno Bruto, de 2,9 trilhões de reais, em P&D.
A meta do governo para 2010 é elevar o gasto total para 40 bilhões de reais. Um dos canais para atingir esse objetivo é a Financiadora de Estudos e Projetos, ligada ao MCT. No ano passado, a instituição subsidiou a contratação de 132 mestres e doutores pela iniciativa privada.
As bolsas cobrem de 40% a 60% do salário do pesquisador, enquanto a empresa paga o restante, além dos custos operacionais. Dos 37 projetos aprovados, mais da metade são de micro e pequenas empresas. Mas também estão na lista grandes companhias, como Braskem, Whirlpool e Siemens.
“Muitas multinacionais que não tinham pesquisa no Brasil estão destinando recursos para a área, atraídas pelos incentivos”, diz Felipe Matos, diretor do Instituto Inovação, consultoria que tem clientes como Bunge e Nestlé.
Esse é o caso da IBM, gigante americana do setor de tecnologia, que está formando um núcleo de pesquisadores no país para trabalhar em colaboração com instituições locais. No ano passado, a empresa criou o cargo de cientista-chefe no Brasil, ocupado pelo médico Fábio Gandour, antigo gerente de novas tecnologias, e trouxe dos Estados Unidos o pesquisador Cláudio Pinhanez, com experiência de nove anos na matriz e um doutorado pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT).
Nas últimas semanas, os dois passaram algumas horas analisando currículos para escolher um novo pesquisador doutor, que será contratado até novembro. Na lista de candidatos, pessoas de 22 a 60 anos e um engenheiro indiano que trabalha em Bangalore, o principal polo tecnológico da Índia. “Temos planos de ampliar a equipe no ano que vem, mas isso depende das parcerias que pretendemos fechar”, diz Cláudio.
Ciência e marketing
Além da tecnologia, a indústria de bens de consumo também contrata pesquisadores. No mês passado, a Companhia Müller de Bebidas, dona da marca de cachaça 51, recrutou um executivo da Danone para estruturar sua área de pesquisa e desenvolvimento. Já a fabricante de cosméticos Natura tem uma equipe de dez PhDs e toca mais da metade dos projetos de pesquisa em parceria com universidades.
Nesse mercado, por se tratarem de itens com ciclo de vida curto, existem equipes específi cas para pensar e desenvolver produtos. “O pessoal de P&D tem que ter cada vez mais um pé em marketing, para entender a demanda do consumidor antes de tudo”, diz Augusto Piliti, diretor da Michael Page, consultoria de recrutamento em São Paulo. Mestre em engenharia de produção, o mineiro Raoni Bagno, de 30 anos, conhece bem esse processo.
Raoni comanda o comitê de inovação da Fiat Power Train (FPT), empresa do grupo Fiat que fabrica motores e transmissões, com sede em Betim, Minas Gerais. Entre 2007 e 2008, ele foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento de um novo sistema de transmissão para carros, adaptado de veículos de tração.
O sucesso do projeto e o conhecimento adquirido no mestrado (com enfoque em desenvolvimento de produto) credenciaram o engenheiro a assumir a atual missão.
“Minha meta é disseminar a inovação pela empresa e formar um núcleo de inteligência”, diz Raoni. A FPT quer investir na pesquisa de materiais mais leves, equipamentos econômicos e motores para combustíveis alternativos. Para isso, vai contratar cerca de seis mestres e doutores, com subsídios da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). Para quem se interessar, o edital será publicado em outubro.