A doutora Alexsandra Valério desenvolveu quatro produtos que inativam o Sars-CoV-2 com sua equipe 70% feminina (TNS Nano/Reprodução)
Laura Pancini
Publicado em 8 de março de 2021 às 11h48.
Última atualização em 10 de março de 2021 às 16h49.
Apenas 40,3% das certificações de doutorado na Plataforma Lattes em 2020 são de mulheres, de acordo com o projeto Open Box da Ciência, responsável por pesquisas de mulheres cientistas. Em contraste, a Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu um comunicado em fevereiro deste ano ressaltando que as mulheres são 70% dos profissionais de saúde à frente do combate à pandemia.
É neste meio que mulheres como Alexsandra Valério se destacam como exemplo de cientistas que estão trabalhando desde os primeiros sinais da chegada do coronavírus ao país. Com o agravamento da crise sanitária, a demanda por ferramentas de auxílio no combate ao novo coronavírus aumentaram e movimentam a indústria de saúde mesmo um ano depois do início da pandemia no Brasil.
Liderando uma equipe de 10 pesquisadores, com 70% de presença feminina de mestres ou doutoras, Valério se dedica a desenvolver ferramentas nanotecnológicas para inativar micro-organismos na TNS Nano, empresa de nanotecnologia. Em seu currículo, ela contabiliza quatro pós-doutorados nas áreas de engenharia, polímeros e biotecnologia e mais de 80 artigos publicados em revistas nacionais e internacionais.
A cientista foi responsável pela criação de um aditivo antiviral capaz de inativar o Sars-CoV-2 após 30 segundos de contato. “São esferas pequenas, quase do tamanho do vírus, que tem o poder de atacar a barreira em volta do vírus e destruí-la”, diz a doutora em entrevista à EXAME. “Elas são como guerreiras.”
A equipe da TNS ainda desenvolveu dois aditivos antivirais à base de íons de prata. O primeiro, o Protec-20, é estabilizado com aditivos naturais e inativa o vírus da mesma forma que o outro produto, destruindo a camada em volta dele. Já o segundo é um spray antiviral, feito em parceria com o Senai Paraná, que forma uma película protetora em superfícies por, no mínimo, 72 horas.
Por último, o grupo de Valério criou outro aditivo antiviral com uso de nanopartículas de cobre, com propriedade bactericida, antifúngica e antiviral. Ele minimiza contaminações cruzadas e pode ser utilizados na fabricação de materiais como tecidos, acrílicos e plásticos.
“Nós temos três produtos diferentes com ação antiviral mas composições diferentes, porque nem todo cliente usa o aditivo da mesma forma. Cada um tem um processo diferente. Alguns não podem ter água, por exemplo, e aí usamos a nanopartícula de prata”, afirma Valério. “A ideia é que o produto atenda legislações nacionais e internacionais e dê segurança ao usuário final.”
A responsabilidade de desenvolver produtos para o uso da população traz para a pesquisadora o sentimento de pertencimento aos profissionais que se dedicam diariamente ao combate da pandemia. “Ao criar produtos que podem minimizar os riscos de contaminação de uma doença que já levou mais de dois milhões de pessoas em todo o mundo, é impossível não me sentir parte ativa desta luta contra a pandemia”, afirma Valério.
Como gerente, ela diz que seu trabalho é desafiador, mas gratificante. “A ciência no Brasil é predominantemente masculina, mas eu vejo na prática com a minha equipe que o que fazemos é a realização de uma luta de várias mulheres. Embora seja um mundo masculino, aqui a gente prova o contrário”, comenta. “É a prova de que temos vez na ciência e nos altos cargos das empresas.”
Para a doutora, o avanço feminino na ciência é fruto de “mais educadoras e mulheres líderes”. “É um reflexo, nós sempre nos espelhamos em alguém”, comenta. Pensando em jovens mulheres que querem um dia ser como Valério e as outras cientistas da sua equipe, a doutora deixa uma mensagem: “Não desistam, porque nem sempre vai ser fácil. Eu lutei bravamente contra o mundo e encontrei o meu lugar, e tenho certeza que todas as mulheres têm uma força interior para chegarem aonde quiserem. O lugar da mulher é onde ela quiser.”