Maconha: pesquisa analisou dados de 10 mil artigos sobre maconha e saúde (OpenRangeStock/Thinkstock)
AFP
Publicado em 16 de janeiro de 2017 às 10h16.
A maconha pode ajudar a aliviar a dor de forma segura para alguns pacientes, mas muitas incertezas permanecem sobre seus riscos para a saúde e a segurança, de acordo com um amplo estudo publicado na quinta-feira.
Um comitê das Academias Nacionais de Ciências, Engenharia e Medicina dos Estados Unidos (NASEM) analisou mais de 10.000 artigos científicos para chegar às suas quase 100 conclusões.
O relatório de um painel de 17 membros oferece uma "revisão rigorosa das pesquisas científicas relevantes publicadas desde 1999", disse uma declaração da NASEM.
Cannabis, o nome científico da planta cujos botões e folhas secas fazem a maconha, é a droga ilícita mais popular nos Estados Unidos.
Uma pesquisa recente mostrou que mais de 22 milhões de americanos de 12 anos ou mais relataram usar a droga nos últimos 30 dias.
Nove em cada 10 usuários adultos afirmaram que usavam a droga para fins recreativos, enquanto apenas 10% alegaram fins exclusivamente médicos.
"Há anos o panorama do uso de maconha tem se transformado rapidamente, à medida que mais e mais estados estão legalizando a cannabis para o tratamento de condições médicas e para o uso recreativo", disse Marie McCormick, presidente do comitê e professora de saúde maternal e infantil da Universidade de Harvard.
"Esta aceitação, acessibilidade e uso crescentes da cannabis e seus derivados têm levantado importantes preocupações de saúde pública", acrescentou.
McCormick disse que o relatório busca abordar o fato de que "a falta de qualquer conhecimento agregado de efeitos na saúde relacionados à cannabis levou à incerteza sobre se existem e quais são os danos ou benefícios do seu uso".
O estudo descobriu que os pacientes que usavam cannabis para tratar dores crônicas eram "mais propensos a experimentar uma redução significativa nos sintomas da dor".
Adultos com espasmos musculares relacionados à esclerose múltipla também melhoraram seus sintomas ao usar certos "canabinoides orais" - medicamentos sintéticos feitos à base de canabinoides.
Também foram encontradas evidências conclusivas de que estes canabinoides orais poderiam prevenir e tratar náuseas e vômitos em pessoas com câncer que recebem tratamento quimioterápico.
"Fumar cannabis não aumenta o risco de cânceres frequentemente associados com o uso do tabaco - como os cânceres de pulmão e de cabeça e pescoço", acrescentou o relatório.
Além disso, o comitê "encontrou evidências limitadas de que o uso de cannabis está associado a um subtipo de câncer testicular".
Os riscos do uso de cannabis incluem a possibilidade de desencadear um ataque cardíaco, mas são necessárias mais pesquisas para entender "se e como o uso de cannabis está associado a ataques cardíacos, acidentes vasculares cerebrais e diabetes".
Fumar cannabis pode causar bronquite e tosse crônica, mas a interrupção do uso "provavelmente reduz essas condições", e ainda não está claro se há qualquer vínculo com doenças respiratórias, incluindo doença pulmonar obstrutiva crônica, asma ou piora da função pulmonar.
Em relação à saúde mental, o comitê descobriu que "o uso de cannabis provavelmente aumenta o risco de desenvolver esquizofrenia, outras psicoses e distúrbios de ansiedade social e, em menor medida, depressão".
Os pensamentos suicidas podem aumentar e os sintomas de transtorno bipolar podem piorar com o uso intensivo de cannabis, acrescenta o estudo.
Mas em pessoas com esquizofrenia e outras psicoses, "um histórico de consumo de cannabis pode estar ligado a um melhor desempenho em tarefas de aprendizagem e memória", disse.
Quanto mais as pessoas usam cannabis - e quanto mais jovens elas começam - mais probabilidades têm de desenvolver um "problema de uso de cannabis", aponta o relatório.
O comitê encontrou evidências limitadas de que o consumo de cannabis aumenta a taxa de iniciação no uso de outras drogas.
Mesmo que funções cerebrais como aprendizagem, memória e atenção sejam afetadas após o uso de cannabis, os pesquisadores encontraram poucos sinais de danos a longo prazo em pessoas que pararam de fumar.
Em mulheres grávidas, alguns indícios mostraram que fumar maconha durante a gravidez está associado a um menor peso ao nascer, mas a relação com outros resultados da gravidez e da infância não está clara.
Acidentes entre crianças, incluindo a ingestão de cannabis, aumentaram drasticamente desde que a substância foi legalizada em algumas partes dos Estados Unidos.
De forma pouco surpreendente, o relatório encontrou "provas substanciais" de que o uso de cannabis está ligado a uma condução prejudicada e a acidentes com veículos.
Defensores da maconha medicinal disseram que o relatório mostrou que a cannabis pode ajudar as pessoas, e pediram ao governo federal americano para legalizá-la.
A maconha é atualmente uma substância da Lista I sob a Lei de Substâncias Controladas, o que significa que está estabelecido que a planta não tem nenhum valor medicinal.
"Este relatório é uma reivindicação para os muitos pesquisadores, pacientes e profissionais de saúde que há muito compreendem os benefícios da maconha medicinal", disse Michael Collins, vice-diretor de assuntos nacionais da Aliança de Política de Drogas.
Paul Armentano, vice-diretor do NORML, um grupo de lobby pela legalização da maconha, apontou que as evidências não são novas.
"Mesmo assim, há décadas a política de maconha neste país tem sido impulsionada pela retórica e pela emoção, e não pela ciência e pela evidência", disse ele.
"No mínimo, sabemos o suficiente sobre a cannabis, assim como sobre as falhas da proibição da cannabis, para regular seu consumo por adultos, acabar com sua criminalização e removê-la da Lista I", acrescentou.