Pfizer: vacina apresentou eficácia de 90% (Jakub Porzycki/NurPhoto/Getty Images)
Tamires Vitorio
Publicado em 13 de novembro de 2020 às 08h30.
Jenny Hamilton é uma ex-policial americana de 57 anos que trabalha como segurança na área do cinema e vive em Atlanta, nos Estados Unidos. A história de Hamilton poderia parar por aí, se não fosse um pequeno fator --- ela é uma das participantes da última fase de testes da vacina da farmacêutica Pfizer e da BioNTech contra o novo coronavírus. Em um relato publicado no site americano Business Insider, Hamilton afirmou que precisa detalhar as respostas do corpo e os efeitos colaterais durante sete dias em um diário. "É preciso falar sobre a sua temperatura, dores, e, em uma escala, o quão severa elas são", contou ela ao site.
Hamilton não sabe se tomou uma dose ativa da vacina ou um placebo, mas conta ao site que depois de receber as duas doses da vacina, experimentou sintomas como uma gripe leve --- com febres baixas, fadiga, e dores musculares. Segundo ela, a Pfizer perguntou diversas perguntas e fez testes para saber se ela estava com covid-19. Depois disso, ela recebeu a primeira dose da vacina --- na mesma noite da imunização, Hamilton se sentiu bastante cansada e teve febre por dois ou três dias.
Depois de três semanas, ela recebeu a segunda dose da vacina. E os mesmos efeitos colaterais foram observados. "Eu estava muito cansada no dia seguinte. E foi um pouco mais severo, porque eu não tinha vontade de levantar para pegar algo para comer.
Eu só deitei na cama e dormi a maior parte do dia e ainda tive febre por dois ou três dias, também", conta. Hamilton afirma que "depois disso" está bem. "Eu tirei sangue um mês depois da última injeção, que foi em setembro, e vou tirar novamente em março para determinar se tenho os anticorpos --- ou respostas diferentes como plaquetas e células brancas --- e qual foi a resposta do meu corpo", contou.
O processo para participar da fase de testes, segundo Hamilton, não foi fácil. Primeiro ela procurou informações na internet sobre os locais onde os testes estavam acontecendo e esperou por detalhes para entender melhor como ela podia se tornar uma voluntária. Então ela se inscreveu no site da empresa, respondeu um formulário e recebeu uma ligação "no dia seguinte". Em Atlanta existem três instituições que estão fazendo os testes da vacina.
Segundo Hamilton, sempre que um voluntário preenche o diário e indica algum efeito colateral mais grave, um responsável da empresa liga para o voluntário a fim de entender melhor o que está acontecendo. "Por exemplo, sobre o meu cansaço. Quando eu afirmei que ele era severo, um coordenador do estudo me enviou uma mensagem de texto logo depois e quis entender como eu estava. A mesma coisa aconteceu quando a minha temperatura estava elevada após um período maior depois da segunda injeção", explicou ela ao BI. A coordenadora, então, explicou que os efeitos da vacina eram mais graves depois da segunda dose --- e que tudo estava dentro do normal.
O diário precisará ser preenchido nos próximos dois anos, pelo menos uma vez por semana. "Mesmo parecendo que eu tenho outra camada de proteção, eu ainda uso a minha máscara. Eu sou muito cuidadosa. Eu tenho saído ocasionalmente, mas com toda a pandemia, minha percepção mudou. Não gosto de restaurantes que não reforçam o uso de máscaras e o distanciamento social. Eu tento ter certeza de que estou me distanciando o suficiente em locais públicos", afirmou.
Nesta segunda-feira, 9, a Pfizer afirmou que sua vacina contra o SARS-Cov-2 se apresentou segura e eficaz em 90% dos 43.538 voluntários testados. A expectativa da Pfizer é pedir uma aprovação emergencial ao Food and Drug Administration (o FDA, espécie de Anvisa americana) na terceira semana deste mês.
A imunização da companhia (umas das dez em última fase de testes segundo um relatório da Organização Mundial da Saúde) pode ter até 1,3 bilhão de doses produzidas no ano que vem — e 100 milhões até o final deste ano. Uma esperança em meio a tempos difíceis.
Das 47 em fases de testes, apenas 10 estão na fase 3, a última antes de uma possível aprovação. São elas a chinesa da Sinovac Biotech, a também chinesa da Sinopharm, a britânica de Oxford em parceria com a AstraZeneca, a americana da Moderna, da Pfizer e BioNTech, a russa do Instituto Gamaleya, a chinesa CanSino, a americana Janssen Pharmaceutical Companies e a também americana Novavax.
Nenhuma vacina contra a covid-19 foi aprovada ainda, mas os países estão correndo para entender melhor qual será a ordem de prioridade para a população uma vez que a proteção chegar ao mercado. Um grupo de especialistas nos Estados Unidos, por exemplo, divulgou em setembro uma lista de recomendações que podem dar uma luz a como deve acontecer a campanha de vacinação.
Segundo o relatório dos especialistas americanos (ainda em rascunho), na primeira fase deverão ser vacinados profissionais de alto risco na área da saúde, socorristas, depois pessoas de todas as idades com problemas prévios de saúde e condições que as coloquem em alto risco e idosos que morem em locais lotados.
Na segunda fase, a vacinação deve ocorrer em trabalhadores essenciais com alto risco de exposição à doença, professores e demais profissionais da área de educação, pessoas com doenças prévias de risco médio, adultos mais velhos não inclusos na primeira fase, pessoas em situação de rua que passam as noites em abrigos, indivíduos em prisões e profissionais que atuam nas áreas.
A terceira fase deve ter como foco jovens, crianças e trabalhadores essenciais que não foram incluídos nas duas primeiras. É somente na quarta e última fase que toda a população será vacinada.
Segundo uma pesquisa publicada no jornal científico American Journal of Preventive Medicine uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia. Para evitar que outras aconteçam, a prevenção precisa ser 70% eficaz.
Uma vacina com uma taxa de eficácia menor, de 60% a 80% pode, inclusive, reduzir a necessidade por outras medidas para evitar a transmissão do vírus, como o distanciamento social. Mas não é tão simples assim.
Isso porque a eficácia de uma vacina é diretamente proporcional à quantidade de pessoas que a tomam, ou seja, se 75% da população for vacinada, a proteção precisa ser 70% capaz de prevenir uma infecção para evitar futuras pandemias e 80% eficaz para acabar com o surto de uma doença.
As perspectivas mudam se apenas 60% das pessoas receberem a vacinação, e a eficácia precisa ser de 100% para conseguir acabar com uma pandemia que já estiver acontecendo — como a da covid-19.
Isso indica que a vida pode não voltar ao “normal” assim que, finalmente, uma vacina passar por todas as fases de testes clínicos e for aprovada e pode demorar até que 75% da população mundial esteja vacinada.