Tom Cruise: o ator irá protagonizar o que pode vir a ser o primeiro filme gravado na órbita da terra. (Ian Gavan/Getty Images)
Matheus Doliveira
Publicado em 1 de julho de 2021 às 14h36.
Última atualização em 1 de julho de 2021 às 15h20.
Seis décadas após a façanha de Yuri Gagarin, os russos querem voltar a ficar à frente dos americanos na corrida espacial, desta vez para rodar um filme de ficção na órbita da Terra e sem gravidade.
A missão está nas mãos da atriz Yulia Peresild, de 36 anos, e do diretor Klim Shipenko, de 38, que vão decolar da base de Baikonur com o cosmonauta Anton Shkaplerov a bordo de um foguete Soyuz. Eles permanecerão de 5 a 17 de outubro de 2021 a Estação Espacial Internacional (ISS).
A tripulação russa ultrapassaria assim o astro de Hollywood Tom Cruise e o diretor Doug Liman, que têm um projeto semelhante em colaboração com a Nasa e a Space X, empresa do magnata Elon Musk. Contactado pela AFP, o lado americano não quis divulgar datas.
Anunciado em setembro de 2020, quatro meses após o projeto de Hollywood, o filme russo Vyzov ("O desafio" ou "A chamada" em russo) pretende superar os Estados Unidos em um de seus campos favoritos.
"Chega de dormir! Vamos ser os heróis do país!", proclama nas redes sociais a atriz Yulia Peresild, que se descreve como uma "patriota sem ênfase".
"Vamos vencer esta nova corrida no espaço! Ser o primeiro é importante", disse a atriz à AFP.
"Bonitos, atléticos, intelectuais, nossos cosmonautas têm de voltar às capas das revistas!", diz.
Os produtores incluem Dmitri Rogozin, chefe da agência espacial Roscosmos e famoso por seus comentários antiocidentais.
Outro nome do projeto é Konstantin Ernst, dono do canal de televisão Pervyi Kanal e que há mais de 20 anos está encarregado de organizar alguns dos momentos mais marcantes do presidente Vladimir Putin: desfiles militares, posses presidenciais ou as cerimônias do Jogos Olímpicos de Sochi.
Rogozin não hesita em mostrar suas ambições na mídia russa.
"O cinema sempre foi uma arma de propaganda", disse ao jornal Komsomolskaya Pravda em meados de junho.
Para a Rússia, trata-se de marcar pontos. Porque ultimamente, no campo do lançamento de satélites, voos tripulados ou missões científicas, Moscou tem perdido terreno.
De acordo com Dmitri Rogozin, Cruise e Liman conversaram com a Roscosmos no início de 2020 para rodar o filme, mas "forças políticas" pressionaram para que desistissem de trabalhar com a agência espacial russa.
"Depois dessa história, entendi que o cosmos é política", reiterou ao Komsomolskaya Pravada. "Daí nasceu a ideia de que um filme russo" tinha de ser rodado.
O enredo do longa-metragem ainda não foi divulgado, mas a imprensa fala da missão de uma médica, enviada com urgência à ISS para salvar um cosmonauta.
O orçamento também é segredo. O único ponto de referência: a Nasa pagava dezenas de milhões de dólares por uma vaga a bordo do Soyuz.
Yulia Peresild também não comentou nada sobre o assunto em sua entrevista à AFP no Museu Espacial de Moscou, após um treinamento no famoso centro de treinamento de cosmonautas, onde está desde o final de maio.
As minúsculas dimensões da parte russa da ISS são um desafio para o diretor, que também ficará encarregado da câmera, da luz, gravação de som e maquiagem.
E "teremos de filmar no espaço coisas impossíveis de filmar na Terra", acrescenta a atriz.
Nascida na família de um pintor de ícones, Yulia nunca sonhou em ser cosmonauta, ao contrário de muitos jovens soviéticos. E quando foi selecionada entre 3.000 candidatas, confessa que estava "com medo".
"Não sou uma super-heroína", assegura, ao afirmar que encontra sua motivação entre as crianças deficientes que apoia por meio de sua fundação Galtshonok.