Felicidade: durante 75 anos, a pesquisa acompanhou a vida de 724 homens, ano após ano, abordando o trabalho, a vida doméstica e a saúde (Rick Gomez/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 15 de fevereiro de 2016 às 20h32.
São Paulo - Ter dinheiro ou fama comumente são associados à conquista de felicidade, e tais desejos já foram apontados como o objetivo de vida mais importante de norte-americanos nascidos nos anos 80 e 90.
A dedicação e esforço no trabalho seriam o caminho para se alcançar mais resultados.
Mas uma pesquisa realizada durante 75 anos (!!!) nos Estados Unidos mostrou que os ingredientes fundamentais para uma vida saudável e cheia de bem-estar são relações íntimas e de qualidade com a família, com os amigos e com a comunidade.
As conclusões do Estudo do Desenvolvimento Adulto, promovido pela Universidade de Harvard, foram abordadas por seu diretor, o psiquiatra e psicanalista americano Robert Waldinger, em uma conferência no TED 2015.
“E se pudéssemos observar uma vida inteira à medida que ela decorre no tempo? E se pudéssemos estudar as pessoas desde a altura em que eram adolescentes até chegarem à velhice para vermos o que mantém as pessoas felizes e saudáveis?”
Durante 75 anos, a pesquisa acompanhou a vida de 724 homens, ano após ano, abordando o trabalho, a vida doméstica e a saúde, além de realizar exames médicos.
Cerca de 60% dos pesquisados, a maioria já com 90 anos, ainda estão vivos e participam no estudo. Há cerca de 10 anos, o estudo passou a integrar também as esposas desses homens.
O próximo passo, segundo Waldinger, é estudar os mais de 2000 filhos dos homens pesquisados.
A população pesquisada foi dividida em dois grupos desde o começo, em 1938. No primeiro, homens que estudaram em Harvard e que, em sua maioria, lutaram na Segunda Guerra Mundial.
Já o segundo era composto por adolescentes dos bairros mais pobres de Boston, vindos de algumas das famílias mais problemáticas e mais desfavorecidas da região.
Os destinos desses homens foram variados: se tornaram operários fabris e advogados, assentadores de tijolos e médicos, e um deles foi presidente dos EUA.
Os 75 anos de acompanhamento mostraram a Waldinger três lições, e nenhuma delas diz respeito a riqueza, fama, ou a trabalhar cada vez mais. A primeira delas é que as relações sociais são boas para nós, e a solidão mata.
“As pessoas que têm mais ligações sociais com a família, com amigos e com a comunidade são mais felizes, fisicamente mais saudáveis e vivem mais tempo do que as pessoas que têm menos relações. A experiência da solidão acaba por ser tóxica. As pessoas que são mais isoladas do que gostariam descobrem que são menos felizes, a sua saúde piora mais depressa na meia idade, o seu funcionamento cerebral diminui mais cedo e vivem menos tempo do que as pessoas que não se sentem sozinhas.”
A segunda lição mostrou que o que importa é a qualidade de nossas relações íntimas.
"Viver no meio de conflitos é muito prejudicial para a saúde. Os casamentos altamente conflituosos, por exemplo, sem grande afeição, revelam-se muito maus para a saúde, pior talvez do que um divórcio. Viver no meio de relações boas, calorosas, é protetor.”
O estudo mostrou que o grau de satisfação que os homens sentiam nas suas relações foi decisivo para um envelhecimento mais feliz e saudável. “As pessoas que se sentiam mais satisfeitas com as suas relações, aos 50 anos, foram as mais felizes aos 80 anos.”
“Os nossos homens e mulheres mais felizes disseram, aos 80 anos, que nos dias em que tinham mais dores físicas a sua disposição continuava feliz. Mas as pessoas que tinham relações infelizes, nos dias em que tinham mais dores físicas, elas eram reforçadas pelo sofrimento emocional.”
A terceira e última lição é que as boas relações protegem não só o corpo, como também o cérebro.
“Uma relação bem estabelecida com outra pessoa, aos 80 anos, é protetora. As pessoas que têm relações em que sentem que podem contar com outra pessoa em alturas de necessidade mantêm uma memória mais viva durante mais tempo. As pessoas com relações em que sentem que não podem contar com o outro são as que experimentam um declínio de memória mais precoce. As boas relações não têm que ser sempre fáceis. Alguns dos nossos octogenários podem discutir dia sim, dia não. Mas enquanto sentirem que podem contar um com o outro, quando as coisas aquecem, essas discussões não se fixam na memória.”
Pelas lições aprendidas, a tal felicidade parece fácil, não? Waldinger tem uma resposta para isso: somos seres humanos e lidar com a família e com os amigos é algo complicado, que dura a vida toda.
“O que gostaríamos mesmo é de uma receita rápida, qualquer coisa que possamos arranjar que nos dê uma via boa e a mantenha dessa forma. As relações são conturbadas e complicadas.”
Para se apoiar em boas relações, ele sugere atitudes cotidianas e acessíveis, como substituir a TV por tempo com as pessoas, fazer passeios, animar uma relação amorosa adormecida e falar com algum familiar com quem não se fala há anos.
“Essas contendas familiares têm um efeito terrível na pessoa que guarda rancores”.