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Quarentena em Hong Kong, agora de três semanas, complica vida de viajantes

Viajantes, hotéis e companhias aéreas têm se esforçado para se ajustar desde que Hong Kong introduziu abruptamente sua política de quarentena de três semanas

Fachada do Mandarin Oriental em Hong Kong (Lam Yik Fei/The New York Times)

Fachada do Mandarin Oriental em Hong Kong (Lam Yik Fei/The New York Times)

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Daniel Salles

Publicado em 18 de janeiro de 2021 às 14h14.

Antes de embarcar em seu voo para Hong Kong para um novo emprego no mês passado, a suíça Tanja Cunz se certificou de que havia cumprido todos os rigorosos requisitos governamentais de entrada. Cunz, curadora de museu de 34 anos, fez um teste de coronavírus e pagou por duas semanas de quarentena em um hotel designado pelo governo, onde passaria 15 dias sem ar fresco.

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Mas, quando seu avião pousou em Hong Kong na manhã de Natal, um anúncio veio pelo alto-falante: durante a noite, o governo havia estendido o período de quarentena de duas para três semanas, com efeito imediato. Os passageiros teriam de garantir mais sete dias em seu hotel antes que pudessem deixar o aeroporto.

Cunz ficou atordoada. Ela não só precisaria pagar por uma semana extra de quarentena, mas também teria de adiar sua data de início no trabalho, o que significava uma perda de salário.

"Todos os seus planos simplesmente desmoronam", disse Cunz em um telefonema de seu quarto de hotel, do qual ela podia ver seu futuro escritório em Victoria Harbor.

Viajantes ricos e pobres, hotéis e companhias aéreas têm se esforçado para se ajustar desde que Hong Kong introduziu abruptamente sua política de quarentena de três semanas. Num momento em que as viagens globais foram interrompidas de várias maneiras, a política local se destaca por sua extensão e pela confusão que desencadeou.

Edifícios em Hong Kong (Brent Lewin/Bloomberg)

Alguns viajantes que já haviam reservado quartos por duas semanas informaram que tentaram garantir uma prorrogação, mas, em vez disso, toda a sua reserva acabou sendo cancelada. Outros tentaram adiar a viagem, tendo descoberto depois que as diárias do hotel não poderiam ser reembolsadas.

Algumas trabalhadoras domésticas, as mulheres de baixa renda das Filipinas e da Indonésia que compõem cerca de cinco por cento da população de Hong Kong, podem ficar indefinidamente desempregadas, porque seus empregadores não querem pagar por uma estada de 21 noites.

O governo reconheceu o caos, anunciando no fim do mês passado que estava "muito preocupado" com os relatos de aumento de preço das diárias em hotéis. Ainda assim, defendeu a política como necessária para evitar a disseminação de uma variante altamente contagiosa do vírus. Hong Kong conseguiu em grande parte evitar o tipo de surto em massa que está prejudicando a maior parte do mundo, ajudado em parte por seu rigoroso regime de quarentena.

Hoje, os viajantes globais enfrentam uma colcha de retalhos de regras aonde quer que vão – uma série de medidas que vai ficando mais embaralhada com a tentativa dos governos de manter afastada a nova variante. A China continental exige duas semanas de quarentena em uma instalação designada pelo governo e, em seguida, um número variável de dias de confinamento domiciliar. Os Estados Unidos e alguns países europeus, por outro lado, reduziram recentemente o tempo de quarentena recomendado de 14 dias para dez.

Alguns cientistas questionam a extensão de Hong Kong, porque se considera que o período de incubação do vírus é de 14 dias. Estudos estimam que de um por cento a dez por cento dos pacientes com coronavírus pode(m) ter períodos de incubação mais longos que isso. O governo de Hong Kong reconheceu que esses casos eram excepcionais, mas afirmou que as medidas eram necessárias.

Hannah Clapham, professora de Saúde Pública da Universidade Nacional de Singapura, acredita que, embora uma quarentena de três semanas "talvez reduza ligeiramente o número de indivíduos infecciosos que entram em uma população", o governo deve pesar esse pequeno ganho potencial em relação ao preço alto da política.

"A regra dos 21 dias era apenas para garantir a segurança", disse Jin Dongyan, virologista molecular da Universidade de Hong Kong. Ainda assim, acrescentou: "Acho que estão exagerando."

Cunz foi pega desprevenida, mas aqueles com mais tempo para reconsiderar seus planos enfrentaram problemas próprios.

Peter Lam, funcionário do setor de logística na Irlanda, decidiu cancelar sua volta a Hong Kong para visitar a família. Ele não podia pagar por uma semana extra. Além disso, tinha medo de que o governo de repente decretasse um mês inteiro, o tempo que planejava ficar por lá.

Hong Kong

Hong Kong (d3sign/Getty Images)

Quando, porém, entrou em contato com seu hotel, foi informado de que a reserva não era reembolsável. Lam, de 33 anos, apresentou queixa ao Conselho do Consumidor de Hong Kong, ao Conselho de Turismo de Hong Kong e à sua empresa de cartão de crédito. Depois de três dias, o hotel afirmou que lhe faria um favor especial devolvendo-lhe o dinheiro.

Outros tiveram o problema oposto. Edwin Edwin, consultor que estava voltando para Hong Kong depois de visitar a família na Holanda, perguntou ao seu hotel de quarentena se poderia reservar mais sete dias. Algumas horas depois, recebeu um e-mail: o hotel estava cheio naquela terceira semana, de modo que toda a sua reserva havia sido cancelada.

Ele passou meio dia contatando outros hotéis desesperadamente. O único que encontrou cobrava o dobro do preço.

No fim, Edwin viajou para Taiwan, onde também é residente, e está em quarentena por duas semanas, como o exigido. Ele voltará para Hong Kong de lá. As chegadas de Taiwan podem passar a quarentena em casa. "A viagem total deveria ser de um mês, incluindo a quarentena. Somando tudo isso, é claro, vai ser muito mais tempo", disse ele.

Outros não têm escolha. A medida está afetando as trabalhadoras domésticas estrangeiras, que vivem e trabalham na casa do seu empregador, realizando tarefas como limpeza e cuidados com crianças.

Elas já recebem salários baixos e sofrem discriminação, mas as regras de quarentena exacerbaram algumas dessas questões, de acordo com Jec Sernande, secretário da Federação dos Sindicatos de Trabalhadores Domésticos Asiáticos.

Segundo Sernande, um patrão pediu à sua funcionária que não fosse às Filipinas este ano, para evitar pagar por sua quarentena depois do regresso. (O governo começou a exigir que os empregadores pagassem a quarentena para os trabalhadores domésticos no mês passado.) Outros estão presos nas Filipinas sem salário, porque seu empregador adiou a data de início de contrato até que os requisitos de quarentena em Hong Kong sejam simplificados. "Ela não tem emprego nas Filipinas. Está lá esperando", observou Sernande a respeito de uma dessas trabalhadoras.

Mesmo para a indústria hoteleira, a política trouxe dores de cabeça. As chegadas no aeroporto de Hong Kong caíram de uma média de 1.300 por dia em novembro para algumas centenas na maioria dos dias desde o Natal. As taxas de ocupação em muitos hotéis giram em torno de 30 por cento a 40 por cento, de acordo com Yiu Si-Wing, legislador que representa o setor de turismo.

Ele informou que alguns dos 36 hotéis de quarentena designados pelo governo queriam sair do programa. Aqueles que recebem hóspedes nessa modalidade não podem aceitar outros, como residentes de longa data ou moradores locais à procura de estada.

Segundo Yiu, os hotéis mais baratos lotaram rapidamente, mas os que cobram US$ 65 ou mais por noite têm enfrentado dificuldades. O governo lhes prometeu o pagamento de um subsídio caso não atingissem 50 por cento de ocupação. Isso provavelmente será aplicado à maioria dos hotéis acima desse limite de preço, acredita ele.

Porém, apesar das reclamações, nenhum hotel deixou o programa de fato, afirmou Yiu: "Do ponto de vista da renda, não podem fazer isso."

A singularidade da política de Hong Kong é clara para Louen Tang, residente de Hong Kong de 38 anos. O trabalho de Tang na indústria logística exige viagens mesmo durante a pandemia. Ele já ficou em quarentena três vezes.

Mesmo assim, não estava preparado para lutar por uma semana extra em um hotel acessível, como teve de fazer depois de seu retorno de Londres no mês passado. Mas nenhum dos hotéis em sua faixa de preço tinha disponibilidade. Desesperado, Tang estabeleceu lembretes de hora em hora para ligar para uma linha direta do governo, até que por fim um funcionário lhe informou que poderia terminar sua quarentena em uma área de recreação perto de um parque rural, que foi convertido em um centro dedicado especialmente a isso.

"Viajo muito. Entendo como diferentes países lidam com essas regulamentações, mas não há nada como Hong Kong", afirmou Tang.

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