Em Kisses on the Bottom, o cantor inglês conta com a colaboração de Diana Krall e Eric Clapton (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 30 de abril de 2012 às 14h22.
São Paulo - Durante as sessões de gravação de seu mais recente álbum, houve um momento em que Paul McCartney ficou indeciso com uma questão qualquer. Em vez de perder o sono, ele disparou: “Não tô nem aí. Estou em Los Angeles. Sou britânico. Sou um turista. Estou no estúdio A da gravadora Capitol, cantando no microfone de Nat King Cole. Estou de férias!” O relato se encontra no encarte de Kisses on the Bottom e resume o astral do CD. Trata-se de um disco de férias, uma diversão a que um cara com o currículo de Paul pode se permitir de vez em quando.
O ex-Beatle acalentou por anos a ideia de registrar músicas que a geração de seus pais cantava nas festas de fim de ano. Ou seja, standards do jazz, gemas do grande cancioneiro norte-americano, coisas que o pequeno Paul aprendeu em casa pouco antes de descobrir Elvis Presley e Chuck Berry. Em Kisses on the Bottom, o cantor mergulha nessa memória afetiva pré-roqueira, com arranjos reverentes, mas sem abandonar seu saudável hábito de acrescentar algo diferente.
Em vez de gravar Cheek to Cheek ou The Way You Look Tonight, algumas de suas músicas favoritas e que seriam escolhas óbvias, Paul preferiu pesquisar temas menos batidos, chegando até mesmo a interpretar uma composição que nunca havia escutado antes: More I Cannot Wish You, do musical Guys and Dolls.
Faixas como essa pintaram porque o cantor ouviu sugestões do experiente produtor Tommy LiPuma e da pianista Diana Krall, que toca praticamente no disco inteiro. Paul é amigo e parceiro de Elvis Costello, marido de Diana, mas esse não participa do álbum. O escalado para cuidar das guitarras foi John Pizzarelli, que lançou em 1998 um disco com clássicos dos Beatles vertidos para a linguagem do jazz.
À Beira dos 70
Escorado num time dessa categoria, o inglês só precisou cantar. E isso ele fez com muito charme. Paul se beneficiou da natureza dos temas peneirados, quase todos românticos e para cima (segundo o músico, os preferidos das famílias que se recuperavam da Segunda Guerra Mundial), tais como Ac-cent-tchu-ate the Positive e My Very Good Friend the Milkman. O único momento cafona é My Valentine, ironicamente uma das duas inéditas que Paul escreveu para o repertório. Nem o violão de Eric Clapton salva a enjoativa balada. Já Only Our Hearts, com Stevie Wonder na gaita, é mais simpática.
Trabalhos como Chaos and Creation in the Backyard (2005) e singles como Ever Present Past (2007) não deixam dúvida de que Paul vinha num grande momento autoral. Mas, prestes a completar 70 anos, é compreensível que ele dê uma olhadela para trás. A nós, fãs, cabe esperar o fim de suas merecidas férias bem embalados por Kisses on the Bottom.