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O crescimento das cozinhas fantasmas em Nova York

Estabelecimentos que fazem refeições que só podem ser compradas mediante aplicativos de entrega se popularizam

Pizza em uma cozinha fantasma em Zuul Kitchens, Nova York (Andrew White/The New York Times)

Pizza em uma cozinha fantasma em Zuul Kitchens, Nova York (Andrew White/The New York Times)

Guilherme Dearo

Guilherme Dearo

Publicado em 11 de janeiro de 2020 às 07h00.

Última atualização em 11 de janeiro de 2020 às 08h00.

Nova York – Esta cidade é o maior mercado de entrega de alimentos do país, e a demanda está crescendo.

Assim, enquanto você olha para a cidade e vê arranha-céus e pilhas de lixo aleatoriamente espalhadas, os capitalistas de risco veem um reino de potencial monetário, em que sistemas eficientes como os criados por aplicativos de entrega de alimentos poderiam ser inseridos: mais participantes, mais capital derivado.

O meio pelo qual os investidores ganham mais dinheiro com a entrega de alimentos está presente na cidade e vai se multiplicar em 2020.

Ele é o tipo de negócio chamado cozinha fantasma, que são estabelecimentos que fazem refeições que só podem ser compradas mediante aplicativos de entrega como Seamless, GrubHub, DoorDash ou Uber Eats. As cozinhas fantasmas podem ser extensões de restaurantes que já existem ou novas marcas.

Mas os clientes não podem pedir pratos para viagem, nem comer no restaurante ligado à cozinha.

A parte de fazer dinheiro está na agregação: várias cozinhas fantasmas podem existir dentro da mesma cozinha física, compartilhando ingredientes e equipamentos e equipes que já fornecem para várias marcas de restaurantes. (Na prática, isso significa que um cliente pode pedir comida indiana, hambúrgueres ou falafel, tudo de restaurantes diferentes, mas toda a comida vem do mesmo endereço.)

Cozinhas fantasmas estão surgindo em toda a Europa e em cidades da Costa Oeste. Em Nova York, sua presença física pode não ser anunciada: apenas mais um endereço anônimo, fechado para os transeuntes, talvez onde um restaurante costumava existir.

As cozinhas fantasmas contam com uma dose de energia das grandes empresas de tecnologia na forma de alguns nomes famosos: Travis Kalanick, ex-executivo-chefe da Uber, trabalha na CloudKitchens, uma startup de cozinhas fantasmas.

Kalanick não fala muito sobre o projeto na imprensa; ele não respondeu a um pedido de comentário. O fundo soberano da Arábia Saudita, um dos principais apoiadores da Uber, teria investido US$ 400 milhões na nova empresa.

E a Reef Technology, uma startup em Miami que conta com cozinhas fantasmas entre as várias empresas que opera, atraiu financiamento do SoftBank, que ajudou a financiar a Uber e a WeWork.

A Reef já está operando duas cozinhas em Nova York. Elas se parecem com quiosques de comida, mas, é claro, quem não tem um smartphone não pode pedir comida delas.

"Nova York é uma cidade conveniente para se locomover, mas nem sempre isso é um programa necessariamente agradável", disse Jim Collins, o executivo-chefe da Kitchen United, empresa em Pasadena, na Califórnia, que planeja abrir 11 cozinhas fantasmas em Manhattan nos próximos anos.

Segundo Collins, é por isso que a entrega pegou em Nova York, para que os consumidores não tenham de "enfrentar as ruas".

Cozinha fantasma em Zuul Kitchens, Nova York

Cozinha fantasma em Zuul Kitchens, Nova York (Andrew White)

Collins disse que muitas empresas de cozinha fantasma buscam essencialmente imóveis baratos que possam adaptar para instalar numerosas cozinhas minúsculas, mas a Kitchen United procura espaços perto de "concentrações realmente elevadas de pessoas e de lojas". Sua empresa não quer estar a mais de dois ou três quarteirões do centro das coisas.

A Zuul Kitchens, outra empresa de cozinha fantasma, abriu uma instalação em Lower Manhattan em setembro. O espaço é dividido entre seis marcas de restaurantes, incluindo nomes estabelecidos como Sweetgreen, Junzi (de comida chinesa) e o Stone Bridge Pizza and Salad.

Restaurantes como o Stone Bridge podem parecer ter sido sonhados para tais espaços. Enrique Mendez, fundador da Stone Bridge Pizza, descreveu o conceito como "pizzas casuais rápidas feitas por encomenda, artesanais, todas da fazenda à mesa". E acrescentou: "Temos uma fazenda sustentável no norte do estado de Nova York. Com produtos hidropônicos." Mendez trabalhou anteriormente em finanças.

Em uma visita em novembro, Corey Manicone, um dos fundadores e o executivo-chefe da Zuul, fez um tour pelas instalações da cozinha fantasma, comentando os "múltiplos pontos de saída" (maneiras de sair do prédio). Ele se referiu às refeições como "produtos". Embora não tenha compartilhado as especificidades do que chamou de seu "mapa de desenvolvimento do produto" (plano de negócios), ele disse que a Zuul provavelmente abrirá cozinhas semelhantes até o fim de 2020.

Além disso, Manicone acredita que os restaurantes vão precisar de apenas um ou dois locais de destaque em um mercado único. "E então você vai ver apêndices que são Zuuls em todas as áreas circundantes. Haverá um Zuul em cada bairro."

Manicone foi cauteloso ao falar sobre o relacionamento da Zuul com as empresas de entrega das quais depende para o transporte dos alimentos que seus restaurantes produzem. Isso pode ser porque algumas companhias da entrega, incluindo a DoorDash, criaram cozinhas fantasmas próprias.

Perguntado se se preocupava com as empresas de entrega se envolvendo em táticas que invadiriam empresas como a Zuul, ele disse: "Hum. Não. Talvez."

As cozinhas somente para entregas não são novidade na cidade de Nova York. Uma startup chamada Maple experimentou um modelo de negócio semelhante em 2015, produzindo seus próprios alimentos. Os custos eram altos. Ela fechou em 2017. O endereço que já abrigou a Maple agora é alugado pela Zuul.

David Chang, operador de restaurantes por trás do Momofuku, foi um dos principais investidores da Maple. Ele acredita que, no fim, uma empresa de entregas vai desenvolver ou se unir a um conceito de cozinha fantasma (o que a DoorDash fez em Redwood City) e mudar o mundo.

Em uma entrevista, Chang enfatizou uma de suas ideias: que o mundo da tecnologia e o mundo culinário falam línguas diferentes e que, até que alguém descubra como preencher essa lacuna, uma empresa de entrega verticalmente integrada em grande escala não vai ter sucesso no nível de um gigante da tecnologia como a Amazon ou o Google.

Zuul Kitchens, Nova York

Zuul Kitchens, Nova York (Andrew White)

"Por enquanto, você ainda precisa de seres humanos para fazer e processar comida. Não é como estar em um armazém na Amazon, onde você tira algo de uma caixa e coloca em um pacote", disse ele.

Os criadores de cozinhas fantasmas acreditam que o conceito representa a lógica inexorável do mercado, uma otimização adicional de um sistema já eficiente. Mas ainda não se sabe como as cozinhas fantasmas podem afetar pessoas e empregos. Elas podem significar menos postos de trabalho bem remunerados.

Mesmo Chang, que espera em algum momento trabalhar com uma empresa que consiga descobrir o modelo de negócio, disse que tinha alguns problemas com a sustentabilidade das cozinhas fantasmas. "Não para a empresa. Estou mais preocupado do ponto de vista de um operador de restaurante. Seria de fato liberdade ou apenas mais servidão?"

E, se as cozinhas-fantasmas tomarem Nova York em massa, os imóveis poderão ficar ainda mais caros. "Restaurantes físicos familiares podem não ser capazes de enfrentar essas cozinhas. Minha pergunta é: onde estão as pessoas que realmente vêm de origens diferentes, que lugar elas terão para interagir?", disse Mireya Loza, professora de estudos alimentares da Universidade de Nova York.

Os restaurantes de fast-food, por exemplo, tornaram-se locais de encontro para pessoas que não têm espaços públicos para passar o tempo. Marcia Chatelain, professora da Universidade de Georgetown e autora de "Franchise: The Golden Arches in Black America", mencionou que o McDonald's, por exemplo, havia se tornado um centro para vários tipos de atividade cívica, desde o registro de eleitores até o ritual diário de idosos se encontrando para um café.

"Acho que essa estrutura de colocar a preparação de alimentos a portas fechadas realmente prejudica as pessoas que precisam da experiência do local físico – ou que precisam acessar a internet, se aquecer entre os turnos do emprego, ter um ponto de encontro com os filhos", disse Chatelain sobre as cozinhas fantasmas.

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