Juliana La Pastina, presidente do grupo La Pastina, que controla a importadora WorldWine. (Divulgação/Divulgação)
Daniel Salles
Publicado em 16 de outubro de 2020 às 15h07.
Última atualização em 16 de outubro de 2020 às 18h22.
Fundado por Vicente La Pastina em 1947, o grupo La Pastina foi multiplicado pelo filho dele, Celso La Pastina, morto no dia 20 de agosto, aos 61 anos, em decorrência de complicações provocadas pelo novo coronavírus. Como era esperado, a presidência da companhia, que também controla a importadora WorldWine, tão ou mais conhecida que a holding, passou para as mãos da filha mais velha de Celso, Juliana La Pastina, então vice-presidente.
Ela assume o comando de um grupo que comercializa cerca de 2.000 rótulos de vinhos e mais de 400 produtos alimentícios. No ano passado a WorldWine, que soma 15 lojas, todas próprias, cresceu 30%. Já a importadora La Pastina (não confundir com a holding) aumentou 20%. O faturamento não é revelado. O restaurante Enosteria Vino e Cucina, na Vila Nova Conceição, em São Paulo, também faz parte do grupo.
Ainda bastante abalada com a inesperada morte do pai, Juliana conversou com a reportagem da EXAME sobre as mudanças da empresa e o recém-lançado aplicativo para compras da WorldWine. E ainda anunciou a abertura de três lojas neste ano e a meta de lançar as próprias marcas de vinho nacional.
Como o grupo La Pastina se reestruturou com a morte de seu pai?
Eu já trabalhava há bastante tempo com meu pai. Comecei na empresa em 2004, como assistente, e ocupei vários cargos, sempre no marketing e na área comercial. Vínhamos desenvolvendo um plano de sucessão já há dois anos. Meu pai não queria parar de trabalhar, mas trabalhar um pouco menos. E se dedicar mais às viagens, à procura por novos produtos e ao relacionamento com os produtores. No contexto do negócio, portanto, eu já estava muito inserida. Obviamente não imaginava que a transição seria dessa maneira nem tão cedo. Imaginava que a sucessão ocorreria e meu pai estaria ao meu lado, dentro do negócio, por pelo menos mais uns dez anos. Felizmente tudo aconteceu num momento em que a empresa está muito bem estruturada e azeitada. Assumi a presidência uma semana depois da morte dele e não houve nenhuma grande mudança. O que eu quero é dar continuidade ao que já estávamos fazendo. Me sinto honrada pela oportunidade de levar o legado adiante.
Quais são os principais focos da empresa?
Vivemos num cenário muito volátil, em constante transformação. Então é preciso estar sempre muito atento ao que está acontecendo. Vinha me dedicando muito à transformação digital da empresa, processo que foi acelerado pela pandemia. Daremos continuidade a ele, não tem como fugir. No mais, é continuar complementando nosso portfólio, tanto para a La Pastina quanto para a WorldWine. Neste mês vamos relançar oficialmente a La Pastina para o mercado. Com o rebranding, ela ficou mais moderna e mais alinhada ao momento. E ganha o próprio e-commerce neste mês. Também pretendemos aumentar nosso portfólio de vinhos próprios. E teremos nosso vinho nacional. Queremos ter uma marca própria de vinho brasileiro, tanto para a WorldWine quando para a La Pastina. Estamos em conversas com potenciais vinícolas parceiras [todas as marcas de vinhos que pertencem ao grupo, atualmente quatro, são elaboradas em conjunto com vinicultores de porte considerável].
O que muda no seu dia a dia dentro da empresa?
Como vice-presidente, participava de tudo, mas não com tanta profundidade. Hoje tenho de me envolver com as importações e os produtores, coisas que não eram de minha atribuição. Ficava mais focada no planejamento de desenvolvimento das marcas, enquanto meu pai era mais próximo da área de compras. Agora gerencio tanto a gestão de compras quanto os planos para as marcas.
Inicialmente, a expectativa era que você virasse presidente em que ano?
Não estava estipulado. Vinha me envolvendo com mais coisas cada vez mais. Há dois anos criamos um conselho administrativo, do qual uma tia minha é a presidente, alinhado ao plano de sucessão do meu pai como presidente. Mas não tinha um prazo. A internação do meu pai foi completamente inesperada. A gente não parou de trabalhar. Tomando todas as medidas de segurança, ele continuou a ir ao escritório. No dia em que foi internado, um sábado, imaginou, como a gente, que era só uma gripe.
A WorldWine lançou há pouco um app para a compra de vinhos. Significa que o plano de expansão de lojas será revisto?
Nossa estratégia não muda, mas o plano mudou um pouco. A gente pretendia abrir de cinco a dez lojas neste ano e agora serão apenas três. Abriremos duas lojas em novembro, uma na Rua Haddock Lobo, em São Paulo, dentro de um Shopping da JHSF, e a outra em Florianópolis. A terceira, em dezembro, será em São José do Rio Preto. E no ano que vem continua a expansão, com mais cinco lojas, no mínimo.
Como a pandemia impactou a companhia?
Felizmente a gente conseguiu reagir muito rapidamente e nem nas lojas as vendas caíram. Como? Todas as lojas funcionaram como pequenos centros de distribuição. E os clientes receberam seus pedidos ou por meio de drive-thru ou delivery. A gente conseguiu com que cada vendedor pudesse usar como estoque tanto o centro de distribuição quanto as lojas. Toda essa movimentação fez com que as vendas aumentassem em vez de caírem, incrivelmente. No e-commerce crescemos mais de 300% até setembro. E as vendas de vinhos subiram cerca de 30%. O mais curioso é que a procura por rótulos de mais de 350 reais foi a que mais subiu. As vendas de vinhos de Bordeaux não exclusivos, por exemplo, cresceram 64%. E os rótulos acima de 500 reais cresceram 35%.
Aventa alguma explicação para isso?
Tenho a seguinte percepção: com mais tempo em casa em razão da quarentena, passamos a enxergar nossas casas de outra maneira. Quem bebia pouco passou a beber mais e quem já bebia bem passou a beber ainda mais e melhor. Há um pouco de indulgência e o fato de que ninguém está viajando para comprar vinho no exterior. Além disso, os restaurantes ficaram fechados. Com o dinheiro gasto neles com a compra de vinhos dá para comprar rótulos superiores para consumo em casa.
O aplicativo já estava previsto antes da quarentena ou foi criado às pressas?
Não é só no nosso segmento que as lojas físicas estão se transformando mais em locais de experiência e relacionamento. Não sei se o atual volume de vendas no e-commerce vai ser o mesmo depois da pandemia, mas certamente não vai voltar ao que era antes da quarentena. Nossa experiência indica que o comprador de vinho recorre tanto às lojas físicas quanto ao e-commerce e às vezes ao canal de televendas. Obviamente há alguns consumidores, talvez os mais velhos, que não se familiarizaram com o digital e compram exclusivamente nas lojas. Mas acredito que o que falam mais alto é o momento e a necessidade. Quem precisa resolver a compra com mais agilidade dá preferência ao e-commerce; quem tem mais tempo e quer saber o que há de novo prefere visitar uma loja. Voltando à pergunta: sim, o aplicativo já estava nos planos, e só foi acelerado um pouco pela pandemia.
Uma concorrente de vocês, a Wine.com.br, está à beira de um IPO bilionário. Não pretendem trilhar o mesmo caminho?
Não temos essa intenção, mas, obviamente, estamos sempre abertos a possibilidades.
Seu pai fará mais falta na empresa em que aspecto?
Ele era uma figura singular, sem dúvida nenhuma. Vai fazer muita falta no dia a dia. Graças a Deus tive a oportunidade de conviver muito com ele também no trabalho e absorver muita coisa. A troca que eu tinha com ele rotineiramente realmente fará muita falta. Ele era uma pessoa muito querida e as pessoas o admiravam muito, o legado que ele construiu. Mas, novamente, a empresa estava muito bem estruturada. Foi o que nos permitiu, aliás, enfrentar a pandemia de uma maneira razoavelmente boa.