Cena de "Sérgio", filme da Netflix: Wagner Moura e Ana de Armas em cena (Netflix/Divulgação)
Guilherme Dearo
Publicado em 15 de abril de 2020 às 12h54.
Última atualização em 15 de abril de 2020 às 12h58.
"Onde as pessoas estão sofrendo, é lá que elas precisam de você". Essa é uma das primeiras frases do filme "Sérgio". A fala resume bem os valores e a trajetória de vida de Sérgio Vieira de Mello, diplomata brasileiro e funcionário da ONU. Um dos mais talentosos nomes de sua geração, cotado para assumir a cadeira de secretário-geral da entidade, Vieira de Mello foi morto em 2003, em Bagdá, em um atentado a bomba da Al Qaeda que, acredita-se, tinha ele como alvo principal.
"Sérgio" estreia nessa sexta-feira (17), na Netflix, e tem Wagner Moura no papel de Sérgio. Moura contracena com Ana de Armas, atriz cubana em ascensão em Hollywood e que já trabalhou com Denis Villeneuve e Todd Phillips. Armas interpreta Carolina Larriera, economista argentina que trabalhava na ONU e que casou com Sérgio, na ocasião separado e em processo de divórcio.
Partiu de Moura a ideia do projeto, rapidamente aprovado pela Netflix americana. Ele chamou o diretor americano Greg Barker para a empreitada. Barker, um documentarista, já havia feito em 2009 o documentário "Sérgio", indicado a um Emmy. É a estreia de Barker na ficção. O terreno não é tão novo para ele, contudo. "Contar uma história com ficção e contar uma história via documentário não é tão diferente quanto você pensa".
Além disso, falar criticamente de assuntos políticos delicados e de guerra, ainda mais aquelas que envolvem os Estados Unidos, é uma especialidade de Barker. Ele fez "The Final Year", documentário sobre o último ano de Barack Obama na Casa Branca, e estreia em 2020 "The Longest War", retrato contundente do desastre americano no Afeganistão, que já dura dezenove anos.
Ao lado do roteirista Craig Borten (indicado ao Oscar por escrever "Clube de Compras Dallas"), Barker escolheu o caminho da narrativa não-linear para contar a história de Sérgio. O filme começa com o personagem interpretado por Wagner Moura gravando um vídeo para a ONU, recrutando novos funcionários para as missões da entidade. Dali, a história avança e retrocede no tempo, tendo como centro o atentado na sede da ONU. É dos escombros que os espectadores entendem o atual momento iraquiano e também tudo o que Sérgio fez antes de chegar ali: a vida com a família no Rio de Janeiro, sua missão de sucesso no Timor Leste, seu relacionamento com Carolina Larriera.
Se o filme não escapa de promover uma reflexão perturbadora - foi Sérgio quem, temendo que a ONU fosse vista pelos iraquianos como pró exército americano, dispensou a reforçada segurança em frente ao Canal Hotel, onde ocorreu o atentado - ele não deixa de mostrar que Sérgio é o herói da história. Os vilões também estão claros: o governo americano, sob a figura de Paul Bremer (Bradley Whitford), vinha tentando conter a influência da ONU no Iraque e se opunha fortemente ao relatório que Vieira de Mello preparara e pretendia apresentar ao Conselho de Segurança da ONU, mostrando violação de direitos humanos durante a ocupação americana no país.
As raízes brasileiras de Sérgio são reforçadas na película, para conforto dos espectadores brasileiros. Em uma cena romântica, toca Cartola ("As Rosas Não Falam"), enquanto a música final é de Caetano Veloso, "Oração ao Tempo".
EXAME conversou com o diretor Greg Barker por telefone:
Sérgio é seu primeiro filme de ficção. Como foi, após trabalhos como documentarista, encarar atores, ensaios?
Storytelling é storytelling. Contar uma história com ficção e contar uma história via documentário não é tão diferente quanto você pensa. Em ambos, o essencial é ter compaixão e se conectar com a audiência. No documentário, claro, estamos lidando o tempo todo com a autenticidade, com pessoas reais. Mas no filme de ficção isso também acontece. Em "Sérgio", precisamos criar o tempo todo uma sensação de realidade. Era preciso parecer real. Minha experiência como documentarista ajudou nesse sentido: eu tinha uma boa noção de quando a cena estava artificial ou não.
Quais foram as referências de pesquisa para o filme, além do documentário que já tinha feito em 2009 sobre o Sérgio Vieira de Mello?
Claro, há o livro da Samantha Power, "O homem que queria salvar o mundo", biografia do Sérgio. Usei minhas pesquisas prévias feitas para o documentário. Mas não era apenas uma cópia. Usamos como referência, apenas. E todas as minhas viagens, minha experiência de vida.
A família de Sérgio participou de alguma maneira, de modo a trazer mais referências para o filme?
Não, não buscamos envolver as pessoas que estavam na vida de Sérgio, não era essa a intenção. Mas a Carolina Larriera esteve em Sundance, em janeiro. Ela viu o filme, conheceu o Wagner Moura. E um dos socorristas do atentado, em 2003, serviu de consultor técnico para o filme, dando detalhes dos momentos do resgate nos escombros após a bomba.
Qual a importância de contar a história de Sérgio Vieira de Mello hoje, 17 anos depois?
É estranho que essa história seja mais relevante hoje. O filme é sobre empatia, sobre ver o mundo e entender as diferenças, entender que cada um passa por uma luta pessoal, interna. A grande mensagem do filme é sobre o valor da empatia e de não abandonar a esperança, saber encontrar um caminho em meio à escuridão. Muita gente fica cínica com o passar do tempo, mas não o Sérgio. Ele sempre fez as coisas, tentou reunir as pessoas e solucionar problemas. Precisamos disso mais do que nunca.
Ficha técnica
“Sérgio”
Drama / Estados Unidos / 1h58
Direção: Greg Barker
Com: Wagner Moura, Ana de Armas, Brían F. O’Byrne, Garret Dillahunt, Bradley Whitford
17/4, na Netflix