Novo Renault Zoe. (Renault/Divulgação)
GabrielJusto
Publicado em 2 de dezembro de 2022 às 11h00.
Última atualização em 6 de dezembro de 2022 às 15h49.
Quem roda pelas estradas do Sudeste e do Sul do Brasil já se acostumou a ver e talvez até ser ultrapassado por veículos elétricos. Com uma infraestrutura de carregamento já bastante madura, essas regiões concentram 67% da frota eletrificada do país, que em julho bateu a marca de 100 mil veículos emplacados, segundo dados compilados pela NeoCharge. Até mesmo com veículos de autonomia média (como o Nissan Leaf, que oferece 280 km por carga completa), já é possível percorrer os 1.500 quilômetros entre o Rio de Janeiro e Foz do Iguaçu, por exemplo, sem dores de cabeça para carregar as baterias.
Mas bem longe desse eixo sudestino, uma pequena cidade do Nordeste vem assumindo a vanguarda da mobilidade elétrica no Brasil: Fernando de Noronha. Por lá, é normal cruzar um elétrico em cada esquina, e os carregadores, conhecidos como wall boxes, são mais comuns que postos de combustíveis — há apenas um em toda a ilha, contra vários carregadores públicos e também particulares, nas garagens dos moradores.
Como em qualquer lugar remoto, as opções de locomoção para os turistas são escassas. As corridas de táxi em Noronha, por curtas que sejam, não saem por menos de R$ 40 — um preço salgado, mas compreensível uma vez que o litro da gasolina custa pelo menos R$ 13. Para curtir a ilha sem ficar refém dos passeios, que além de caros, não são exatamente a melhor experiência de viagem que se pode ter, o jeito é alugar um buggy (R$ 400/dia + combustível), uma moto (R$ 150/dia + combustível) ou se apertar nos ônibus que passam a cada 30 minutos.
Por cortesia da Renault, este repórter pode desbravar Noronha com um dos carros elétricos que circulam pela ilha: o Renault Zoe e-Tech, um modelo 100% elétrico que, a depender das condições, pode rodar até 385 km com uma carga completa. É uma autonomia gigante, que em um ambiente urbano demanda, no máximo, uma recarga por semana. Em Noronha, onde a maior via tem apenas 7 km, o intervalo entre as recargas é ainda maior. Nos dois dias em que eu testei com o Zoe, eu mal precisei olhar para o nível da bateria.
Peguei o Zoe na Vila dos Remédios, o “centrinho” de Noronha, e comecei fazendo uma volta de reconhecimento da ilha: fui até a Praia do Porto e, de lá, segui pelos 7 km da BR-363 (e segunda menor rodovia do Brasil!) até o Sueste, na outra ponta da ilha. Um trajeto curto para os padrões continentais, mas suficiente para sentir a potência dos 135 cavalos do Zoe. Com 25 kgfm de torque, ele vai de 0 a 100 km/h em 9,5s — um desempenho dentro da média, mas que surpreende em um carro que, pelo menos esteticamente, está mais próximo dos populares do que dos premiums.
Mas a maior surpresa veio mesmo no dia seguinte, quando me aventurei com o Zoe em terrenos mais desafiadores. Como um paulistano pouco acostumado a dirigir em vias não muito bem pavimentadas, fiquei com um certo receio em Noronha, especialmente com um carro elétrico. “Será que ele dá conta?”, pensei. Pois fica aqui o meu conselho: não subestime um carro só por ele ser elétrico. Muito pelo contrário.
Tanto nas ladeiras íngremes de paralelepípedo que dão na Praia do Cachorro, quanto nas estradinhas de terra esburacadas e cheias de lama que vão para Cacimba do Padre e para a Praia do Sancho, o Zoe performou perfeitamente sem grandes esforços. Nesses terrenos, a única recomendação especial é não usar o modo “B” do câmbio (que faz o carro usar a energia de frenagem para recarregar a bateria), para ter um controle maior sobre o carro. De resto, pode ir sem medo!
Aproveitando a liberdade que é ter um carro em Noronha, fiz dois rolês não muito comuns, mas que eu recomendo muito. O primeiro é observar os pousos e decolagens do aeroporto com a incrível vista do Morro do Pico ao fundo. Estacionar próximo às cabeceiras das pistas normalmente é proibido, mas em Noronha é possível fazer isso de maneira legal e segura, parando na entradinha da estrada que vai para a Praia do Sancho. O segundo é visitar o Mirante da Air France, no extremo leste da ilha e também de quase todo o território brasileiro. A qualidade da estrada até lá não é boa, especialmente se chover, mas o Zoe dá conta do recado!
A partir de agosto de 2023, os carros à combustão estarão proibidos de entrar em Fernando de Noronha, que também deve proibir a circulação deles a partir de 2030, quando toda a frota de Noronha deverá ser totalmente eletrificada. As restrições são fruto da Lei do Carbono Zero, aprovada em 2020.
Inicialmente, os carros comuns seriam impedidos de chegar à ilha já em 2022, mas o prazo foi estendido em um ano. Como a maior parte da energia consumida em Noronha ainda é gerada através da queima do óleo diesel, as restrições aos carros à combustão são motivo de desconfiança da população local, que ainda não vê a iniciativa como uma solução eficiente para reduzir as emissões de carbono na ilha. Foi justamente esse dilema que me deixou curioso para dirigir um elétrico em Noronha.
Dos cerca de 830 carros que, segundo o IBGE, rodam por Noronha, apenas 50 são elétricos. Outras 130 autorizações de posse já foram emitidas pelo governo mas, por enquanto, ainda não existe nenhum serviço de aluguel desses veículos. O Renault Zoe com o qual eu rodei por lá por dois dias foi uma cortesia da montadora que, em parceria com o governo estadual e com a concessionária de energia Neoenergia, mantém o Projeto Trilha Verde, que promove a mobilidade sustentável na ilha.
Duas usinas solares e 12 carregadores elétricos já foram instalados em Noronha pela iniciativa, que até 2030 deve ajudar a ilha a produzir cada vez mais energia limpa para que a troca pelos elétricos, de fato, faça sentido — principalmente na cabeça dos moradores mais desconfiados.
Na onda do carbono zero, recentemente os turistas ganharam mais uma opção para curtir Noronha sem depender dos passeios: o aluguel de bicicletas elétricas, que custa R$ 160/dia e, assim como o Renault Zoe, superam as ladeiras e as estradas de terra comuns na ilha sem grandes dificuldades. Com uma bikes dessas 100% carregada, foi possível ir de uma ponta a outra da ilha duas vezes, além de outros trajetos menores. No caso delas, o único contra é que são individuais — nada de colocar ninguém na garupa!