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De lenhador a costureiro: dono de hotel se desdobra durante pandemia

A pandemia forçou milhares de pequenas empresas a fechar as portas permanentemente. As que sobreviveram tiveram de mudar constantemente de rumo

Montu Patel no Hampton Inn, seu hotel em New Jersey (EUA) (Hannah Yoon/The New York Times)

Montu Patel no Hampton Inn, seu hotel em New Jersey (EUA) (Hannah Yoon/The New York Times)

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Daniel Salles

Publicado em 24 de outubro de 2020 às 06h00.

Desde que a pandemia começou, Montu Patel aprendeu a confeccionar máscaras e a enfrentar os credores de Wall Street, ajudou microempresários a escrever pedidos de ajuda ao Estado e às autoridades locais, e até aprendeu a fazer divisórias de plástico.

Como proprietário de um pequeno negócio, Patel, cuja família é dona de oito franquias de hotéis de baixo custo, estava acostumado a fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Porém, desde março, quando caminhoneiros, famílias em viagens rodoviárias e viajantes de negócios – que representavam a maior parte de clientela – deixaram de aparecer, Patel foi forçado a dispensar funcionários e a buscar crédito, tornando-se um exército de um homem só na luta para salvar seu negócio. Sua falência seria a morte de um sonho americano.

Yasir Fahmy, supervisor do hotel Hampton Inn (Hannah Yoon/The New York Times)

Certa manhã de agosto, antes de se encontrar com um possível credor para convencê-lo de que o setor hoteleiro tem um futuro brilhante pela frente, Patel teve de cortar uma árvore que caiu no estacionamento de um de seus hotéis.

Os hotéis são a vida de Patel. Filho de imigrantes indianos, ele cresceu dentro de um hotel Econo Lodge que pertencia à sua família em Bordentown, Nova Jersey, e fez pós-graduação em Estudos Imobiliários, pois sabia que um dia assumiria o negócio do pai. "Meus pais vieram para este país com os bolsos vazios. Tudo que acumulamos desde então foi lucro", disse Patel, de 43 anos.

Patel esteve à frente dos hotéis em meio à tragédia e ao crescimento. Há dois anos, sua irmã, que era a diretora financeira da empresa, morreu em decorrência de um tumor no cérebro. No ano passado, Patel comprou quatro novos hotéis e, agora, a família é dona de três franquias da Hampton Inn, duas da Comfort Inn, duas da Holiday Inn Express e uma da Days Inn.

A pandemia forçou milhares de pequenas empresas a fechar as portas permanentemente. As que sobreviveram, como as de Patel, tiveram de mudar constantemente de rumo, enquanto os donos se apegam à esperança de que as coisas vão melhorar. Mas estamos a pelo menos um ano de distância de uma vacina amplamente disponível e o vírus continua a se espalhar.

"Se a pandemia acabar ainda este ano, teremos boas condições de voltar a poupar e conseguir sair do buraco em que nos encontramos", garantiu Patel.

Pouco depois do início do surto do coronavírus, Maryland, Virgínia, Pensilvânia e Nova Jersey – os estados onde ficam os hotéis de Patel – instituíram lockdowns. Patel não pôde fazer nada enquanto seu faturamento despencava 90 por cento. Contudo, ele e os funcionários continuaram ocupados com novos tipos de hóspedes.

Em Maryland, a secretaria estadual de saúde usou um andar do Hampton Inn de Patel, em Salisbury, para abrigar os sem-teto que tinham contraído o vírus. Certa manhã, em maio, a polícia estadual foi ao hotel, acompanhada dos funcionários de uma funerária. Um hóspede havia morrido.

No Holiday Inn Express, de Patel, nos arredores do Aeroporto Internacional de Baltimore-Washington Thurgood Marshall, equipes de uma empresa russa de transporte aéreo, a Volga-Dnepr Airlines, começaram a se hospedar regularmente. Eles traziam máscaras, luvas e outros equipamentos de proteção da Rússia para ajudar a superar a falta repentina de suprimentos nos Estados Unidos.

Durante algum tempo, em Hershey, na Pensilvânia, onde a família de Patel tem outro Hampton Inn, o único hóspede era um médico trazido para ajudar a atender os pacientes com Covid-19 na emergência do Centro Médico Hershey. O médico pediu aos funcionários do hotel que não entrassem no seu quarto.

A gestão dos hotéis exigiu ajustes. Os botões dos elevadores precisavam ser limpos de hora em hora, e as chaves eletrônicas tinham de ser higienizadas sempre que eram devolvidas. Os balcões de recepção foram equipados com chapas de proteção feitas de acrílico. Bandejas e equipamentos para as refeições em estilo bufê – comuns em hotéis econômicos – foram removidos. As academias de ginástica foram fechadas, assim como as piscinas.

Patel tentou proteger as finanças dos hotéis. Entre abril e agosto, o empresário arrecadou cerca de US$ 500 mil em dinheiro com amigos e parentes. Ele também conseguiu empréstimos perdoáveis de US$ 150 mil por hotel mediante o Programa de Proteção às Folhas de Pagamento para pequenas empresas, com verba de US$ 650 bilhões do governo dos EUA, que ele usou para pagar os funcionários durante o início dos lockdowns.

Com poucos hóspedes, Patel colocou alguns funcionários para fazer uma limpeza profunda dos hotéis. Mesmo assim, ele deu licença remunerada para cerca de 255 pessoas, ou 75 por cento de seus funcionários. (Ele já pediu a quase todos que voltassem, embora alguns tenham optado por não retornar, segundo ele.) Patel tentou reformar os hotéis, mas isso ficou difícil por causa dos problemas na cadeia de abastecimento. Pedidos de espelhos com luz LED e torneiras se atrasaram.

O hoteleiro em ação (Hannah Yoon/The New York Times)

Durante o terceiro trimestre, Patel teve dificuldades para encontrar um suprimento confiável de máscaras e álcool em gel, que as redes hoteleiras das quais é franqueado exigiam que fossem fornecidos gratuitamente a todos os hóspedes. Foi mais fácil conseguir suprimentos nos meses seguintes, mas ainda assim não foi fácil pagar por eles.

"Quando damos um desconto enorme no valor das diárias, mas, mesmo assim, continuamos tentando oferecer todas essas coisas, a margem de lucro fica muito pequena ou desaparece", comentou Patel. O empresário acrescentou que as exigências de algumas franqueadoras deixaram de ser razoáveis: "Elas podem criar todas as regras que quiserem para os franqueados e não precisam se preocupar em cumpri-las. Não são essas empresas que sofrem as consequências", disse.

No início de agosto, o principal credor de Patel pediu um "pro forma" de 12 meses, ou seja, uma estimativa detalhada do desempenho da empresa ao longo do ano seguinte. Trata-se de um pedido monumental, em vista de como o futuro continua incerto. Na manhã em que precisou defender com unhas e dentes o setor hoteleiro para um credor, os ventos causados pelo furacão Isaias derrubaram uma árvore no estacionamento do Hampton Inn, em Nova Jersey, obrigando Patel a usar uma serra elétrica.

Sua rotina também mudou. Ele costumava pegar o celular antes mesmo de se levantar da cama para ler planilhas que mostravam a atividade diária de cada hotel. Não havia razão, no entanto, para continuar fazendo isso depois que os lockdowns deixaram os hotéis quase vazios. "Se eu fosse calcular todo o dinheiro que estamos perdendo, acho que não conseguiria pensar nas estratégias para o futuro", comentou.

Atualmente, ele costuma todos os dias passar horas ao telefone conversando com funcionários que não conseguiram voltar ao trabalho devido às dificuldades com os cuidados dos filhos ou aos problemas no transporte. Ele cria estratégias para ajudá-los a pagar pelo transporte e pelos cuidados com a família. Também encontrou mais tempo para passar com a esposa, os três filhos, os pais e membros da família estendida que o ajudam a cuidar da empresa.

Quando um vice-presidente da empresa começou a costurar máscaras em abril, Patel, a esposa e os pais se juntaram à iniciativa. Guardaram algumas das máscaras que costuraram para uso pessoal e doaram o restante para um hospital. E Patel desenvolveu uma nova habilidade: "Aprendi a costurar."

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