Muitas vezes, a decisão de se afastar dos filhos não depende dos pais (Stock.xchng)
Da Redação
Publicado em 10 de agosto de 2014 às 15h44.
São Paulo - Todos os dias, Maya Carvalho, 16 anos, dorme e acorda com um beijo do pai, o engenheiro Marco Augusto Alves de Oliveira, 44 anos. Nem sempre foi assim. Filha de pais separados, ela morou com a mãe até 2012, quando escolheu mudar de casa. Em plena adolescência, Maya contou com a companhia do pai na primeira consulta ao ginecologista. E foi ele que fez questão de conhecer o autor da primeira carta de amor recebida pela filha, embora a apresentação nunca tenha ocorrido. “Eu amo meu pai, ele é o pai mais diferente que eu já vi. É uma mãe exemplar”, brinca Maya.
Casos como o de Maya e Marco Augusto não são regra. Apesar de não haver um levantamento oficial de quantos pais detêm a guarda total ou compartilhada dos filhos, a Associação de Pais e Mães Separados (Apase) estima que eles sejam minoria, cerca de 20% dos casos de separação.
“Quando me separei, tinha a preocupação de não deixar de existir para a minha filha. Por isso, no dia do pagamento [da pensão], eu colocava junto alguma roupa, uma foto, um brinquedo ou balinha”, recorda.
Oliveira conta que teve que se “reinventar” para criar uma filha mulher - ele é o mais novo de quatro irmãos. “O grande ganho é aprender a conhecer o universo feminino como pai, e não como marido ou namorado. Quero educar a minha filha para ser independente de tudo e de todos.”
Na mesma casa, uma história semelhante. Marco Venício Alves de Oliveira, 48 anos, um dos irmãos de Marco Augusto, mora com o filho, Vitor Luz, 12 anos. A escolha de morar com o pai, partiu de Vitor. “Ele veio de férias. Quando terminou as férias, pediu para ficar mais uma semana. Quando terminou essa semana, pediu mais uma, e foi ficando”, diz Venício.
Embora estivesse presente na criação, ele confessa que sempre achou uma grande responsabilidade ter a guarda do filho, por isso nunca insistiu. “Como a decisão partiu dele, eu tive que assumir”, diz, contente. “Eu acho que para o desenvolvimento deles é importantíssimo que o pai esteja presente. É fundamental que o pai e a mãe assumam. Os filhos são a parte mais importante”, acrescenta. Vítor descreve o pai em uma única palavra: amigo.
Muitas vezes, a decisão de se afastar dos filhos não depende dos pais. A Apase cita a alienação parental - quando um genitor faz a criança rejeitar o outro - como um dos maiores problemas após a separação.
“Pela legislação vigente é preciso ter consenso para que o juiz conceda a guarda compartilhada. Isso é uma grande piada. Existem genitores que criam litígio para não compartilhar a guarda da criança”, explica o presidente da Apase, Analdino Rodrigues Paulino, formado em direito e que presta consultoria sobre o tema.
Paulino lutou seis anos na Justiça pela guarda compartilhada da filha Amanda, de 16 anos. Hoje, ele, que mora na cidade de São Paulo, passa uma semana por mês com a filha, em Goiânia (GO). Por ela, até fez as pazes com a mãe. “Estava perto do Natal e eu perguntei o que ela queria ganhar. Ela me respondeu que queria um presente que não me custaria nenhum centavo e pediu que fizéssemos as pazes”, recorda Paulino.
A socióloga e coordenadora do Instituto Papai, organização não governamental (ONG) pernambucana que defende direitos igualitários para homens e mulheres, Mariana Azevedo, diz que a paternidade tem sido uma questão mais debatida na sociedade, embora ainda persista o modelo antigo de que o pai é o provedor e a mãe, a cuidadora.
"Quando a gente vê pais que cuidam ativamente, chamamos de pãe ou dizemos que é como se fosse uma mãe. Ainda há a ideia de que mãe é quem cuida e o pai se encarrega de dar ordem", diz Mariana. "A gente acredita que não há essa diferença e que ambos devem compartilhar a criação dos filhos. Isso é uma experiência benéfica e transformadora para toda a família", analisa a socióloga.