Obra de Basquiat: 85% a 90% de suas obras estão em mãos de colecionadores privados, calcula a especialista (Michael Bowles/Getty Images)
AFP
Publicado em 26 de julho de 2017 às 15h57.
Última atualização em 26 de julho de 2017 às 16h06.
Jean-Michel Basquiat se converteu recentemente no artista americano mais caro da história. Três décadas depois de sua morte, é mais influente do que nunca, só que mais nas ruas do que nos museus.
O artista do Brooklyn, de pai haitiano e mãe porto-riquenha, morreu aos 27 anos em 1988 por uma overdose. À primeira vista, deixou poucos rastros em Nova York, a cidade onde passou a maior parte da sua vida e que foi sua grande fonte de inspiração.
Apenas uma placa discreta na fachada do seu estúdio, escondido no minúsculo bairro de NoHo, lembra o autor de um quadro que, em 18 de maio passado, foi vendido por um recorde de 110,5 milhões de dólares na casa de leilões Sotheby's de Nova York.
Não há nenhum monumento público em sua homenagem, nenhum lugar que tenha seu nome, nenhum rastro dos seus famosos grafites assinados "SAMO". Seus admiradores prestam homenagem ao seu túmulo, em Green-Wood, e lá deixam lembranças.
Basquiat - ou "Jean", como era chamado pelos amigos - é, junto com o compositor Leonard Bernstein, o residente mais famoso deste cemitério gigantesco do Brooklyn, onde estão enterradas 570.000 pessoas.
Também é difícil encontrar Basquiat nos museus: há 10 desenhos e serigrafias seus no MoMA, seis obras no Whitney, duas no Met, duas no Museu do Brooklyn e uma no Guggenheim. Para um artista que deixou mais de 2.000 obras, é pouco.
"É uma vergonha que os museus de Nova York não tenham mais Basquiat", opinou o artista Michael Holman, amigo do pintor, com quem criou a banda de música Gray.
Holman lembra que, quando Basquiat estava vivo, o casal de colecionadores Lenore e Herbert Schorr propuseram doar quadros do artista ao MoMA e ao Whitney, que não quiseram recebê-los.
Para Holman, "há uma certa dose de racismo" no pouco interesse registrado pelas grandes instituições artísticas de Nova York quando Basquiat, que era negro, estava vivo. E inclusive após a sua morte.
Jordana Moore Saggese, professora no California College of the Arts e autora da única monografia de história da arte sobre a obra de Basquiat, acredita que sua ausência nos museus explica em parte o sucesso deste fenômeno que desembarcou no mundo da arte sem nenhuma formação e foi apreciado ainda em vida por colecionadores e galeristas.
"Durante os anos 1970 e 1980, críticos e historiadores da arte estavam muito divididos sobre a questão de se um artista podia ser bem-sucedido tanto no plano comercial como no crítico", disse.
Inclusive hoje, 85% a 90% das obras deste jovem carismático, protagonista de um filme ("Downtown 81") em que interpretou ele mesmo aos 20 anos, estão em mãos de colecionadores privados, calcula a especialista.
De Leonardo DiCaprio a Bono, passando por Jay Z, Johnny Depp e Tommy Hilfiger, a lista de celebridades que possuem ou possuíram uma tela ou um desenho de Basquiat não para de aumentar.
Algumas galerias nova-iorquinas vendem suas obras, principalmente a Soho Contemporary Art. Mas estas são mais escassas do que nunca após os recordes alcançados nos leilões.
Suas obras são hoje inalcançáveis para os museus, embora desejem adquiri-las.
O dono da Soho Contemporary Art, Rick Rounick, tinha nove quadros do artista há alguns meses, mas agora só lhe restam dois.
Muitos esperam que a obra do artista possa voltar a ser apreciada pelas massas.
"À medida que os colecionadores (que têm seus quadros) preparem suas heranças e doações a museus, veremos que mais grandes obras farão seu caminho em direção às coleções públicas", indica Saggese.
Enquanto isso, Basquiat influencia a cultura popular de outras formas.
"Suas pinturas e desenhos aparecem em camisetas, tênis, relógios e bolsas", aponta Saggese. "De certo modo, ele é mais acessível do que nunca".
Desde 2014, a marca japonesa de vestimenta Uniqlo fez várias coleções que retomam obras de Basquiat, em colaboração com o MoMA.
O autor Javaka Steptoe publicou um livro sobre este ícone de Nova York dos anos 1980, "The Radiant Child", voltado para o público infantil - uma forma de entrar em contato com seu universo para aqueles que não conhecem nada deste período.
"As crianças o adoram, porque a sua arte é parecida com a delas", explica. "Ele lhes dá permissão para que elas sejam elas mesmos".
Para seu amigo Holman, a influência de Basquiat em Nova York é tangível nas ruas. "Vemos tanta gente que adotou seu estilo, seu corte de cabelo", diz. O músico canadense The Weeknd, por exemplo, usou por algum tempo os dreadlocks armados característicos do pintor.
O artista se insere também na cultura atual através de letras de grandes nomes do rap, gênero dominante entre os jovens americanos, como Jay Z, Kanye West e ASAP Rocky.
"É um herói para os jovens", afirma Holman, "como Warhol foi para a minha geração".