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Da Redação
Publicado em 28 de fevereiro de 2012 às 14h39.
São Paulo – O longa metragem A Separação, vencedor do Globo de Ouro e do Oscar de melhor filme em língua estrangeira, fez com que o mundo se virasse para a produção cultural no Irã, mesmo com a repressão do governo de Mahmoud Ahmadinejad. Apesar de ter sido produzido com a autorização do regime, o filme aborda conflitos da sociedade iraniana, e pode ser visto como uma crítica aos costumes.
Esse potencial questionador e seu caráter político têm sido citados por muitos como a principal razão pelo filme ter recebido a premiação da Academia, e não apenas pela qualidade cinematográfica do longa. Mas nem todas as produções culturais do país têm a mesma sorte do diretor Asghar Farhadi, de questionar sem enfrentar retaliações do governo.
Em 2010, o diretor Jafar Panahi (Fora do Jogo, 2006), por exemplo, foi condenado a seis anos de prisão e proibido de filmar por 20, sob a acusação de filmar sem permissão do governo e incitar a oposição. No ano passado, ele desafiou a determinação e lançou Isto Não é Um Filme, que mostra sua vida em prisão domiciliar.
Na mesma situação estão os presos e condenados cineastas Mohammad Rasoulof (Bé Omid É Didar, de 2011) e Mehdi Pourmoussa (assistente de The Hunter, 2010), que, junto a Panahi, foram homenageados pelo festival de cinema de Berlim, na Alemanha, no ano passado. Assim como o cinema, a música no país também sofre com a regulação, mas isso não impede que bandas clandestinas façam seu som e se lancem no cenário underground.
Um exemplo é o grupo de rock alternativo e blues Bomrani (veja clipe da banda na próxima página). Suas faixas, cantadas em farsi, falam sobre como é a vida no Irã e seu álbum Yellow Sky Blue Sun está disponível no iTunes e outros sites da internet. Como não possuem apoio do governo, eles precisam pagar por todas as despesas de gravação e divulgação do trabalho. Para isso, contam com a ajuda da internet e de gravadoras estrangeiras interessadas em sua música.
Outra banda em situação semelhante é a The Muckers (confira clipe abaixo). Criado oficialmente no ano passado, o conjunto de indie-rock canta em inglês e também não tem permissão para criar. Para um dia fazer sucesso fora do país e conseguir trabalhar sem o risco da perseguição, além de postar suas produções na internet, eles cogitam até a possibilidade de adquirir vistos falsos para tocar em festivais fora do país.
Esse artifício foi ilustrado no filme No One Knows About Persian Cats (2009), que mostra as artimanhas das bandas clandestinas iranianas para driblar a repressão. O longa-metragem foi premiado pelo júri do festival de Cannes daquele ano.
Apesar da repressão, não é apenas a música e o cinema que borbulham na cultura do país. O livro gráfico Persépolis, de Marjane Satrapi, por exemplo, foi um sucesso mundial, que deu origem ao filme homônimo indicado ao Oscar de melhor filme de animação, em 2008. Considerada pelo governo do país como "islamofóbica" e "anti-iraniana", a obra conta a vida da autora durante o começo da Revolução Iraniana, nos anos 70.
Por ter sido publicada originalmente na França, Persépolis não teve problemas para vir a público, mas ainda há produções em quadrinhos que precisam atender a certas regras para serem publicadas no Irã. Além de serem impedidos de falar mal do governo ou questionas abertamente líderes religiosos, cartunistas iranianos não podem falar sobre sexo ou retratar pessoas nuas em suas obras.
Isso, no entanto, não tira deles a capacidade de criar imagens e histórias bem humoradas e sutis, que abordam temas polêmicos sem esbarrar na censura. Abordando questões ambientais, levemente políticas e sociais, cartunistas como Farhad Rykani, Mohammad Ali Khalaji e Shaharam Rezaei são também parte de um Irã muito diferente do que os noticiários costumam mostrar. Eles integram um país onde a cultura ferve por baixo da mão pesada da censura.