Muitos outros fatores influenciam o valor de um carro (Jessica White/The New York Times)
Daniel Salles
Publicado em 9 de abril de 2021 às 10h08.
Em 2017, um novo Mazda MX-5 Miata RF vermelho metálico custava US$ 35.901. Em 2020, o carro de dois lugares tinha um valor médio de revenda de US$ 24.112. Porém, se seu acabamento fosse em tinta metálica cinza, o mesmo modelo valia uma média de US$ 1.046 a menos, só por causa da cor.
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Muitos outros fatores influenciam o valor de um carro, por isso é fácil ignorar a cor. Mas tanto os fabricantes de tintas quanto as montadoras mantêm departamentos internacionais de estilistas e coloristas que não só monitoram o que os consumidores estão comprando, mas – inspirando-se em arte, arquitetura, moda, cultura popular e pesquisa de consumo – preveem o que as pessoas vão querer nos próximos cinco anos.
As decisões são extremamente complexas. Uma cor popular entre os sedãs pode não funcionar para carros esportivos. Uma cor de sucesso na Flórida talvez fracasse no Michigan. De acordo com a iSeeCars, mecanismo de busca que atende compradores de carros, a pior cor para os SUVs é o bege, que perde 46 por cento de seu valor ao longo de três anos. Para picapes, a melhor cor é... o bege. As picapes beges perderam apenas 18 por cento do valor no mesmo período.
A importância da cor para os carros é quase um fator único. Não custa nada descartar uma camiseta fúcsia que foi elegante um dia, e é possível repintar um quarto em um fim de semana. Mas a pintura de um carro custa milhares de dólares e exige técnicos qualificados. Com a possível exceção de geladeiras e máquinas de lavar, há poucas decisões de cor com as quais os consumidores vivem por tanto tempo. Em uma pesquisa de 2000 rotineiramente citada, 39 por cento dos compradores de carros afirmaram que a cor era mais importante que a marca.
Uma análise do iSeeCars comparou o preço dos carros zero em 2017 com seu valor de revenda em 2020 para ver quais são as melhores cores em diferentes classes de veículos. Além disso, alguns grandes fabricantes de tintas publicam relatórios anuais de popularidade de cores e previsões para o próximo ano. Os dois ajudam a traçar regras amplas para escolher os melhores valores em matéria de cor de carro. E, mesmo que a cor não determine totalmente o valor de um veículo, ou se não influi na decisão de compra, você pode ter dificuldade de revender um Miata cinza.
A pintura também é uma questão de durabilidade, não apenas estética. A ideia primeira era evitar a ferrugem. Henry Ford famosamente ofereceu aos clientes "um carro pintado com a cor que quisessem, desde que fosse preto". A tinta preta era durável e barata – e o uso de uma única delas acelerava a produção, explicou Matt Anderson, curador do museu Henry Ford em Dearborn, no Michigan. "A crença popular diz que o preto foi escolhido porque secava rápido, mas não há provas de que fosse mais rápido do que o verde ou o azul-escuro", duas cores que a Ford oferecia inicialmente.
Em meados da década de 1920, uma formulação de tinta da DuPont ajudou a expandir a paleta, e a cor foi usada como um dispositivo de publicidade; a divisão Oakland Motor Car da General Motors anunciou o modelo True Blue Six em 1924. Até a Ford cedeu quando precisou de um impulso de marketing em 1925. "As cores então voltaram nos dois últimos anos do modelo T, em um esforço para estimular as vendas que caíam", disse Anderson.
Os carros vinham em mais de uma dúzia de tons em meados dos anos 50 – o pensamento era atrair as mulheres e garantir o segundo carro da família. As cores se tornaram mais vívidas nos psicodélicos anos 60.
A tecnologia de metais e tintas aumentou a resistência à ferrugem nos anos 70, e então um novo processo desenvolvido na Europa ganhou fama, contou Clifford Schoff, químico de tintas que passou 30 anos na fabricante PPG. O revestimento claro estava prestes a chegar aos EUA. "Começamos a ouvir falar da 'aparência molhada'. A cor mais clara significava que você garantia um brilho maior por mais tempo."
Com o passar dos anos, essas tecnologias que melhoraram a longevidade dos carros e da pintura explicaram a busca inédita pelo branco como a cor mais popular, que durou dez anos. Suas vantagens funcionais também ajudaram. O branco é bom em climas quentes e esconde bem arranhões e pequenos amassados, tornando-o popular entre os compradores de frotas. "As empresas de aluguel de carros adoram o branco", observou Karl Brauer, analista executivo da iSeeCars.
No entanto, como mostram os dados do iSeeCars, há uma grande lacuna entre o que é popular e o que retém valor.
O Relatório de Cores 2020 do provedor de tintas Axalta (anteriormente DuPont) divulgou que menos de um por cento dos carros novos nas concessionárias dos EUA era amarelo. No entanto, os dados do iSeeCars mostram que o amarelo manteve o maior valor geral. Cerca de 30 por cento dos carros nas concessionárias são brancos, seguidos de 19 por cento de pretos e cinza, e dez por cento são prata.
É a lei da oferta e da demanda. "Não é que o amarelo seja uma cor popular; é popular em relação ao número de pessoas que o querem. Não dá para errar comprando as cores populares – preto, branco ou prata –, mas também não é um acerto", disse Brauer. As cores mais populares geralmente estão no meio do gráfico de valores.
A raridade por si só não garante valor. O roxo, o marrom e o dourado são tão raros quanto o amarelo, mas mantêm o menor valor.
Há outras anomalias, como o paradoxo bege mencionado anteriormente. Caminhões vendem bem em cores discretas, possivelmente porque, como veículos de trabalho, essas tonalidades evidenciam menos a sujeira e é fácil ler o nome de uma empresa pintado nas laterais.
Os SUVs se saem melhor em cores chamativas, possivelmente porque os motoristas não querem parecer monótonos. "Você compra o SUV para evitar a minivan", afirmou Jonah Berger, professor da Escola Wharton da Universidade da Pensilvânia, especializado em psicologia de marketing. "Uma cor viva faz com que a gente se sinta assim: 'Estou dirigindo um carro divertido. Sou uma pessoa divertida, animada."
Aparentemente, os proprietários de minivan estão focados na praticidade. O azul manteve o maior valor, perdendo 39 por cento, que não é muito diferente do pior, o marrom, com 42 por cento.
Isso dificulta a avaliação de qual seria a "melhor" cor para um carro. Talvez o ideal seja considerar a melhor cor para um tipo de comprador. "As pessoas compram coisas por diferentes razões. Às vezes compramos pelo que elas fazem. Às vezes compramos pelo que dizem sobre nós", disse Berger.
Aqueles que compram carros por sua utilidade, como minivans ou para montar uma frota, parecem valorizar cores sutis, fáceis de cuidar. Quem compra um carro como uma declaração pessoal – o proprietário de um esportivo – valoriza cores brilhantes.
Isso ainda complica a escolha de pintura para veículos que desafiam a categorização. Jipes e caminhões são veículos utilitários para alguns e peças de exibição para outros, que adicionam acessórios personalizados ao carro. O Jeep Wrangler manteve o maior valor na cor roxa, que geralmente se encontra na parte inferior do gráfico geral. Os Wranglers roxos mantiveram US$ 2.398 a mais de valor do que o mesmo modelo cor de prata.
Os analistas de cores concordam que a nova cor da moda é o azul. No ano passado, ela foi responsável por dez por cento dos carros nas concessionárias, como a prata. Mas qual azul? Escuro? Brilhante? Metálico? As pessoas que ganham a vida com pintura de veículos veem grandes diferenças entre tonalidades, até mesmo o branco.
"O branco que temos hoje não é o branco que tínhamos há 20 anos. Uma montadora pode lhe pedir um branco metálico meio azulado, que de determinado ângulo tenha essa propriedade e, de outro, tenha outra propriedade. Isso é estimulante", comentou Paul Czornij, chefe de design de cores para pintura de carros na Basf.
Para os consumidores, esses ajustes finos parecem ter pouco efeito sobre o valor. Os dados do iSeeCars mostram que a vantagem de valor da tinta metálica sobre a não metálica é insignificante.
Em última análise, segundo Berger, muitos compradores podem escolher a cor sem levar em conta seu valor e sua popularidade, tendo em mente apenas um terceiro objetivo: "Talvez uma cor diferente do branco te faça feliz."