Casa do Porco: melhor restaurante brasileiro na América Latina. (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter de Casual
Publicado em 28 de novembro de 2023 às 18h11.
Última atualização em 29 de novembro de 2023 às 12h47.
Após eleger 50 dos 100 melhores restaurantes da América Latina, do número 51 ao 100, nesta terça-feira, 28, foi revelada a lista dos melhores restaurantes do 1º ao 50º lugar segundo o ranking 50 Best.
Entre os 21 países da América Latina, o Brasil está representado por oito restaurantes. O melhor colocado do Brasil na edição, que aconteceu pela primeira vez no país, foi A Casa do Porco, em São Paulo. O restaurante comandado pelos chefs Janaína Torres Rueda e Jefferson Rueda também foi eleito o melhor restaurante do Brasil segundo o ranking dos 100 melhores restaurantes do Brasil EXAME 2023.
Já o 1º lugar do ranking de melhor restaurante da América Latina ficou com o Maido, de culinária Nikkei, e que fica em Lima, no Peru.
O chef Mitsuharu Tsumura do Maido apresenta a culinária Nikkei em Lima. No restaurante do primeiro andar do badalado bairro de Miraflores, os clientes são recebidos com um grito de “Maido!”, seguido por uma infinidade de pratos, incluindo nigiri, toro, barriga de atum e coxas de frango ao estilo coreano, todos encontrados no extenso cardápio da Experiencia Nikkei.
Nada parece ameaçar o poderoso reinado da Casa do Porco, a incensada casa no centro de São Paulo comandada por Jefferson Rueda e Janaína Torres Rueda, eleita a melhor chef da América Latina. Os chefs fundadores do pequeno império gastronômico provaram que é possível tornar acessível uma gastronomia autoral e de qualidade. Na ativa desde 2015, o empreendimento dedicado aos suínos ocupa a saborosíssima sétima colocação no The World’s 50 Best Restaurants, além da quarta posição na versão latino-americana do ranking, e desconhece o que é passar um dia sequer sem uma fila de clientes na porta.
Um novo capítulo na história do Lasai começou a ser escrito em maio do ano passado. Foi quando o restaurante do chef Rafa Costa e Silva reabriu no endereço atual. O antigo imóvel, que será transformado em um espaço de eventos, tinha capacidade para 45 clientes e exigia até 17 pessoas trabalhando na cozinha. A poucos metros, a nova casa se resume a um balcão que só acomoda dez fregueses.
O encolhimento se deve à vontade de viabilizar, de fato, a proposta do Lasai: servir insumos brasileiros cultivados pelo próprio restaurante ou por pequenos agricultores do Rio de Janeiro e permitir que os comensais vejam os cozinheiros em ação. “Em relação à mudança do Lasai, só me arrependo de não ter feito antes”, diz Costa e Silva, que adora ver a reação da clientela saboreando o que ele inventou. “Acabou a pressão para obter ingredientes em grandes quantidades, e agora tenho tempo até para dar banho no meu filho antes de abrir o restaurante.”
O Lasai só trabalha com menu degustação, que inclui pratos como ostra com pimenta-de-cheiro, mel e limão-caviar e mandioca na manteiga com castanha-do-pará fresca e couve kale — os pratos nunca são os mesmos. Com 15 etapas, a sequência custa 950 reais ou, com harmonização de vinhos, 1.350 reais.
Inaugurado em 2020, o restaurante se propõe a servir a autêntica culinária mexicana — com direito, por que não, a pitadas de modernidade e a ingredientes brasileiros. Pertence a Eduardo Nava Ortiz, mexicano de Oaxaca, e à paulistana Luana Sabino. O casal de chefs se conheceu quando ambos trabalhavam no renomado Cosme, em Nova York — em São Paulo, ela passou pelas cozinhas do Arturito, do Tuju e do Petí Gastronomia.
O cardápio tem opções à la carte, mas 70% da clientela bate o martelo na sequência predefinida, com sete etapas (300 reais). “Não enxergamos como um menu degustação, e sim como um guia para quem não tem familiaridade com nossos pratos”, observa Sabino. Da seção à la carte, a sugestão mais pedida é o mole branco (um molho à base de castanhas e especiarias), que ganha a companhia de couve-flor, tucupi negro e jambu (52 reais). Outro hit, a tostada que junta polvo, abacate e uma pasta de camarão com pimenta seca custa 50 reais. Fã de mezcal, Ortiz sugere que todo mundo só peça a conta depois de degustar uma dose, a 70 reais, da bebida — e não raro se junta aos clientes para brindar com eles.
A cozinha literalmente aberta para o salão e o teto com revestimento acústico de cinema, que ajuda a abafar o falatório dos clientes, já indicam a atenção que o Oteque dá para a comida. Não à toa, muita gente classifica os jantares no endereço — para o qual ninguém dá nada, vendo de fora — como espetáculos gastronômicos memoráveis. Não falta nem uma trilha sonora à altura — vai de Kings of Convenience a Led Zeppelin.
O astro aqui é o chef paranaense Alberto Landgraf, que se reinventou no Rio de Janeiro após uma temporada de cinco anos em São Paulo, onde despontou à frente do extinto Epice. No Oteque, um dos quatro restaurantes brasileiros com duas estrelas Michelin — e o único do quarteto entre os dez primeiros colocados deste ranking —, ele só serve menu degustação. A 735 reais (ou 1.520 reais, com harmonização de vinhos), abarca oito etapas, trocadas diariamente.
Prepare-se para saborear criações como ostra incrementada com vinagrete de tomate e tomate confit; fatias de atum bluefin amanteigado sob vinagrete de alga e pinole; e cavaquinha grelhada com maionese de peixe e picles de maçã verde. O sorbet de coco verde com pralinê e coco verde seco — pode ser servido com queijos brasileiros, cobrados à parte — dá uma ideia das sobremesas.
Inaugurado há dois anos, o Nelita é uma espécie de divisor de águas na trajetória de Tássia Magalhães. O restaurante deu à chef de Guaratinguetá, no interior de São Paulo, uma projeção que ela ainda não havia experimentado. E olhe que a carreira dela não começou ontem. Tássia trabalhou por dez anos no extinto Pomodori, onde entrou como estagiária e saiu como mandachuva, e tirou do forno mais três negócios que não existem mais, os restaurantes Riso.e.ria e Fabbrica Illegale e a dark kitchen Unno Masseria (em fevereiro deste ano, ela abriu o Mag Market, misto de padaria e doceria).
Com fachada arrojada, que mescla tijolos aparentes, porta e janelas de madeira e um painel verde, o Nelita tem a cozinha tocada somente por mulheres. Boa parte do sucesso se deve às massas, como prova o agnoloti com recheio de queijo de cabra e molho de limão, alho negro e mel (110 reais). Com recheio de abóbora, o caramelle leva um creme feito com o mesmo fruto, ricota de búfala e pinole (101 reais). Já o pappardelle é servido com molho de tomate, polvo e espinafre (128 reais). E ainda há opções como peito de pato marinado no missô e guarnecido de purê de cebola, cebola tostada e molho demi glace (167 reais).
Comandado pelo chef Luiz Filipe Souza, o Evvai ostenta uma estrela Michelin. No Jardim Paulistano, na capital paulista, o endereço serve apenas um menu degustação que custa 677 reais (ou, com a harmonização mais em conta, 1.196 reais). Com treze etapas, a sequência é renovada de três a quatro vezes ao ano e pode ser ajustada para veganos ou vegetarianos. O espaguete com couve-flor, crisps e caldo de galinha é um dos hits da atual temporada, assim como a bomba salgada com recheio de vieira selada, lardo e tomate fermentado.
As gravações do MasterChef Brasil, do qual Helena Rizzo é jurada desde 2021, no lugar que era da argentina Paola Carosella, tomam cada vez mais o tempo da chef gaúcha. Mas nada que atrapalhe o dia a dia do Maní, que se mantém em alta sob o comando do braço direito da cozinheira, o chef belga Willem Vandeven. Parceiro de longa data, ele não só dá conta do recado quando a gaúcha está fora como divide a autoria do cardápio com ela.
A 580 reais (ou 1.100 reais, com a harmonização de vinhos), o menu degustação soma 12 receitas, como creme de milho picante acrescido de pipoca de quinoa, minimilho em rodelas, pancetta, ciboulette, katsuobushi e ovas de tainha curadas com lichia e cachaça — para entender no que cada etapa consiste, convém ouvir com atenção redobrada as explicações dadas pelos garçons.
O vatapá de galinha também faz parte da sequência e inclui salada de mamão verde, farofinha, cabeça de camarão seco moída, amendoim tostado e peixe do dia ao forno. E vale o mesmo para a feijoada transformada em pequenas esferas, que são servidas com pé de porco, couve frita e cubinhos de laranja e remetem a um passado longínquo do Maní. A seção à la carte do menu lista pedidas como polvo na brasa com arroz de chorizo, grão-de-bico e molho aïoli de açafrão (145 reais).
Rosto mais conhecido da gastronomia paranaense, a curitibana Manoella Buffara, que todo mundo chama de Manu, colocou seu restaurante na lista dos mais inventivos (e inusitadas) do país, com pratos como o bok choy em brasa com laranja, amendoim e mousse de fígado de galinha. Mas não adianta ter apego: o cardápio muda de tempos em tempos, marcando a evolução da criadora, que só trabalha com menu degustação (630 reais). Com harmonização são mais 430 reais. “Nós cozinhamos para mudar o tempo”, escreve a chef no menu atual. “Nós cozinhamos para mudar a natureza. Nós cozinhamos para mudar o humor. Nós cozinhamos para mudar as pessoas. Mas, o melhor: cozinhamos por nós mesmos.”