Carreira

Vale começa a contratar pesquisadores para ITV

Em entrevista à EXAME.com, Luiz Mello, diretor do Instituto Tecnológico da Vale (ITV), explica quais serão as oportunidades de carreira para cientistas na Vale

Estrada de Ferro Carajás: ITV recruta pesquisadores especializados em mineração, ferrovia e até sociologia, entre outros  (Agência Vale/Divulgação)

Estrada de Ferro Carajás: ITV recruta pesquisadores especializados em mineração, ferrovia e até sociologia, entre outros (Agência Vale/Divulgação)

Talita Abrantes

Talita Abrantes

Publicado em 12 de novembro de 2010 às 09h47.

São Paulo – Nos próximos quatro anos, a Vale vai investir 300 milhões de reais na implantação do Instituto Tecnológico Vale (ITV) que irá desenvolver pesquisas de ponta nas áreas de energia, desenvolvimento sustentável e mineração.

A expectativa é de que, até 2012, o ITV recrute 1.200 profissionais para atuar nos três centros de pesquisa tecnológica. Desses, 150 serão doutores e pós-doutores que terão a função de liderar o desenvolvimento dos projetos.

A iniciativa da Vale sinaliza uma tendência para a carreira científica no Brasil. Além dela, outras companhias como IBM e GE também irão lançar centros de pesquisa no país até o fim do ano.

No caso do ITV, cada unidade será dedicada à uma área específica de pesquisa. Em Belém (Pará), o foco será desenvolvimento sustentável. Já em São José dos Campos (São Paulo), os estudos serão voltados para a área de energia, enquanto em Ouro Preto (Minas Gerais), os pesquisadores se dedicarão ao desenvolvimento de tecnologias para a mineração.

De acordo com Luiz Mello, diretor do ITV, o processo de seleção dos orientadores dos projetos já começou. A ideia é contratar pesquisadores de todo mundo e atrair cientistas brasileiros que estão atuando no exterior.

O recrutamento de bolsistas deve ser feito ao longo do próximo ano. Para isso, as Fundações de Amparo à Pesquisa parceiras do ITV lançarão editais para selecionar os projetos.

A proposta é criar no Brasil uma instituição semelhante ao Massachusetts Institute of Technology (MIT), localizado nos Estados Unidos e que já formou 73 ganhadores do prêmio Nobel. Em maio, a Vale assinou um acordo de cooperação com o instituto americano. A parceria prevê, entre outras atividades, bolsas de estudo na universidade americana para os pesquisadores do ITV. O centro de pesquisas brasileiro também terá parceria semelhante com a École Polytechnique Fédérale de Lausanne (EPFL), da Suíça.

Em entrevista à EXAME.com, Mello, que foi pró-reitor da Universidade Federal de São Paulo, analisou a rotina da carreira científica dentro de uma instituição ligada a iniciativa privada e explicou detalhes sobre as oportunidades de carreira e pesquisa no instituto.

EXAME.com: Qual o perfil de profissional demandado pelo ITV?
Luis Mello:
Precisamos de gente com iniciativa e com uma grande capacidade para resolver problemas por si só. Ou seja, queremos pesquisadores que, ao verificar um problema, criem canais de atuação para solucioná-lo. Mas tão importante quanto a competência técnica é a dimensão social e emocional.

Há oportunidades para engenheiro de minas, engenheiro metalúrgico, de produção, ferroviário, ambiental e outras engenharias. Além deles, iremos contratar um grande número de geólogos, biólogos, profissionais formados em Direito. A ideia é que o ITV seja abrangente. Tanto que há linhas de pesquisa voltadas para Sociologia.


EXAME.com: Quais as diferenças entre desenvolver pesquisa para uma instituição pública e para um centro ligado à uma companhia privada?
Mello:
O primeiro ponto é o acesso aos recursos. Na empresa privada, a mobilização é mais imediata do que no setor público. Mas, por outro lado, o ambiente é muito mais competitivo.

Além disso, o direcionamento do projeto de pesquisa também é diferente. Nas instituições públicas, há muitos estudos com um viés exploratório. É como sair para pescar sem muita direção e ficar feliz em pegar um peixe.

Mas é possível pescar de uma maneira mais dirigida, ou usar determinadas iscas para capturar certos peixes. Essa é a pesquisa orientada por uma hipótese. Esse tipo de estudo é quase único no setor privado que, geralmente, busca o desenvolvimento de algum produto.

Maquete do centro de pesquisa da Vale que será construído em Belém (PA) (José Armênio de Brito Cruz)

EXAME.com: As bolsas para os alunos de mestrado e doutorado serão mais competitivas do que as oferecidas pelas Fundações de Amparo à Pesquisa hoje?
Mello:
Na prática, pretendemos trabalhar com as agências do governo. Então, a ideia é que eles também sejam bolsistas delas.

Agora, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) permitem que seus mestrandos e doutorandos tenham uma remuneração adicional. Então, podemos criar uma política de premiação salarial mediante o desempenho dos alunos.

EXAME.com: Por que o senhor acredita que o ITV conseguirá atrair pesquisadores que foram atuar em outros países?
Mello:
É relativo. Muitas pessoas foram para o exterior porque não tinham oportunidade aqui e viram melhores possibilidades lá fora. Eu adoraria ver pesquisadores voltando porque aqui é a melhor oportunidade de sucesso. O que tem para ser construído no Brasil demanda pessoas com um senso empreendedor.

Para se ter uma ideia, estamos fechando a contratação do primeiro pesquisador orientador que irá atuar na unidade de Belém. Ele se encaixa neste perfil: é brasileiro e atua, há alguns anos, em um instituto no exterior.

EXAME.com: Como vocês chegaram a ele?
Mello:
Analisamos cerca de 30 currículos e fizemos entrevistas ao vivo e por telefone. Até o fim de 2012, queremos contratar 150 doutores e pós-doutores.

EXAME.com: Recentemente, o senhor mencionou que a criação do ITV está ligado ao fato de que os planos de negócio da Vale têm duração de até cem anos. O que o senhor quis dizer com isso?
Mello:
Os depósitos minerais explorados pela Vale têm uma expectativa de vida de várias décadas. Para dar um exemplo, a empresa opera em Itabira desde 1942. Ou seja, são 68 anos que se passaram e o depósito continua economicamente viável.

É de se supor que várias das outras minas continuarão viáveis nos próximos 20, 30, 60 anos. Essa perspectiva deve estar presente desde já nas ações da empresa. Não podemos trabalhar como se tivéssemos apenas um ano pela frente.


EXAME.com: Qual a relação entre essa lógica e o foco do ITV em energia?
Mello:
A energia é a base de tudo. Quando o país passou pela crise do apagão, esse foi um ponto critico para a empresa. Fatos como a oscilação dos preços dos combustíveis, por exemplo, também afetam diretamente as atividades da Vale. A proposta, portanto, é desenvolver projetos para chegar a todas as fontes de energia possíveis. E, além disso, avaliar quais as estratégias mais eficazes para cada lugar – visto que a Vale opera em diferentes partes do globo.

Luiz Mello, diretor do ITV (Divulgação)

EXAME.com: Como sociólogos poderão atuar no ITV?
Mello:
Desenvolvimento sustentável engloba um conjunto amplo de áreas. Desde questões mais ecológicas, como economia de água, uso de microorganismos em alguns processos, até a dimensão social, como beneficiar a população local com os projetos desenvolvidos pela Vale, por exemplo.

EXAME.com: Quais serão as pesquisas em mineração?
Mello:
As técnicas de mineração foram desenvolvidas ao longo de milênios. O exemplo recente da mina no Chile mostra que ainda existem muitos desafios.

Por exemplo, existem jazidas de cobre à uma profundidade de 2 mil metros e que não são exploradas por inviabilidade técnica. Com o desenvolvimento de novas tecnologias, será possível ir além desse limite.

EXAME.com: Diante da sua experiência científica, quais as razões para que tantas empresas privadas agora estejam investindo em centros próprios de pesquisa no Brasil?
Mello:
É um entendimento de que a ciência e a tecnologia podem contribuir para o crescimento das empresas. De forma geral, as companhias com operação no Brasil não eram muito focadas nesse aspecto. Um exemplo é a indústria farmacêutica. Em todo o mundo, a base de pesquisa e desenvolvimento é muito intensa nessa área. Mas no Brasil é muito menor e mais voltada para a produção de genéricos. Agora, as empresas estão percebendo a importância do desenvolvimento científico e estão procurando competências para permiti-lo.

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