Use e abuse da intranet (Ilustração: Samuel Casal)
Da Redação
Publicado em 29 de novembro de 2013 às 14h47.
São Paulo - Qual profissional de recursos humanos responderia, em sã consciência, que a comunicação interna não é uma prioridade? Provavelmente, nenhum. Sabendo que sem uma comunicação eficiente toda a gestão de pessoas está comprometida, empresas de diferentes setores e tamanhos têm investido cada vez mais em canais corporativos.
Prova disso é que a categoria que mede instrumentos de comunicação no Guia VOCÊ S/A-EXAME – As Melhores Empresas para Você Trabalhar, denominada Estratégia e Gestão, saltou da nota de 60,68, em 2008, para 74,14 hoje. E isso está longe de ser uma prioridade apenas das melhores companhias para trabalhar. De acordo com pesquisa da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje), 68% das empresas brasileiras consideram comunicação interna uma área estratégica.
O problema está em transformar o segmento mais básico da comunicação interna — a intranet — em ferramenta bem aproveitada e útil para toda a organização.
Sem a devida atenção e investimentos, a ferramenta, que nasceu para facilitar a vida do RH, acaba monolítica e pouco interativa. Vira quase um elefante branco corporativo. “No mundo corporativo brasileiro, a intranet é subutilizada. As empresas usam apenas sua dimensão informativa, como um veículo unilateral de comunicação digital vertical — de cima para baixo. É muito pouco”, resume Paulo Nassar, coordenador do curso de relações públicas da Universidade de São Paulo (USP) e diretor-geral da Aberje.
Ao negligenciar a intranet, a organização está desperdiçando um recurso muito útil não só para a disseminação de sua estratégia como também para a construção de sua gestão do conhecimento. “A intranet deve ser uma base sólida para a gestão de conteúdo, ajudando na tomada de decisões e nos processos colaborativos, apostando na força das redes sociais”, afirma Ricardo Saldanha, presidente da Intranet Portal, organização sem fins lucrativos dedicada a incentivar a exploração plena dos recursos da ferramenta.
Sustentável e dinâmica
A empresa de energia CPFL descobriu como vitaminar sua intranet. Com a crise de 2008, a área de comunicação sofreu cortes severos e teve de transformar tudo que era papel (sete jornais e uma revista) em comunicação online. “Achamos que a mudança iria culminar em perda da efetividade. Fizemos, então, pesquisas e focus group com funcionários e descobrimos que, mesmo com tantos jornais, a comunicação interna já estava pouco efetiva”, diz Carlos Henrique Matos Ramos, gerente de comunicação.
A notícia estimulou a organização a reformular completamente sua estratégia de comunicação. No lugar de vários jornais, a CPFL desenvolveu um portal que, além de centralizar todas as informações da empresa, possibilita que os funcionários comentem as notícias, criem conteúdos próprios e anunciem na seção de classificados. “Vale quase tudo: colocar a foto do filho, comentar sobre a festa junina e anunciar terreno para vender”, explica Ramos. O resultado foi a alta popularidade. Com 2 700 acessos por dia, a intranet da CPFL registra atualmente 1 251 anúncios nos classificados e 2 931 comentários.
Além de atrair seu público e ficar mais sustentável com a eliminação de tantos papéis, a CPFL conseguiu realocar recursos para outros projetos internos. Entre eles está a tevê corporativa, que deve estrear em 2012. Prevista para funcionar das 7 às 19 horas, os programas de tevê serão transmitidos em monitores instalados nas unidades da CPFL em mais de 569 cidades e devem atingir seus 7 000 colaboradores. “Com o projeto, vamos economizar 200 000 reais por ano na redução da impressão de banners e cartazes”, diz Ramos.
Os recursos de tempo e financeiros economizados com a tevê corporativa já têm um destino: a reestruturação da intranet, onde tudo começou. A plataforma deve ser transformada na base da gestão do conhecimento da empresa, além de ser o centro de alinhamento da atuação da CPFL nas redes sociais. “Esse projeto vai levar tempo, mas os ganhos serão ainda maiores”, diz Ramos. Por enquanto, a intranet da CPFL tem outra novidade: os funcionários podem acessar o planejamento estratégico da companhia de 2011 a 2015 em formato de blog.
Muito além de notícias
Assim como a CPFL, a consultoria Cosin explorou os muitos serviços possíveis da intranet para solucionar problemas mais sérios. Com 220 funcionários e 15 clientes ativos, o modelo manual de conversa entre os consultores para evitar retrabalho e garantir que os projetos fossem entregues na hora marcada não era mais possível. A solução adotada foi investir em uma ferramenta que garantisse a comunicação e a troca de conhecimento entre consultores em lugares diferentes. A intranet foi a escolha óbvia. “Vivemos do conhecimento e não podíamos estar sujeitos à paralisação de um projeto porque o consultor teve o laptop roubado”, diz Alessandro Cosin, sócio da consultoria.
O primeiro passo foi construir, com base no SharePoint da Microsoft, uma biblioteca de informações com relatórios e arquivos de projetos atuais e passados. Depois, sobre essa plataforma, foram feitos um cadastro com o perfil dos consultores (para facilitar a contratação para novos projetos) e a criação de comunidades de práticas — um grupo de especialistas em determinado tema, como acontece nas redes sociais. “A nossa sacada foi entender que o conhecimento está espalhado e a intranet pode trazer isso à tona”, conta Cosin.
Vencedor do prêmio Intranet Social 2.0, do Instituto Intranet Portal, o projeto da Cosin não custou nada à consultoria. A própria equipe de TI da empresa fez o desenvolvimento, e a licença de software ficou de graça já que a Cosin é parceira da Microsoft. “Agora, não temos mais medo de crescer. Sem a intranet, o nosso futuro estava travado”, disse Cosin.
A palavra do presidente
Há ainda outro recurso a ser explorado no mundo da intranet — os blogs. Algumas empresas já perceberam que esse instrumento simples e de custo baixo, quando utilizado pelo principal líder, pode ter um resultado incrível na comunicação e até no clima organizacional — o presidente passa a ser visto como um sujeito próximo às bases.
De acordo com Sergio Chaia, presidente da Nextel, o Blog do Presidente, desenvolvido há mais de um ano, permitiu uma aproximação entre colaboradores e liderança. “O blog é uma forma de interação direta com todos os colaboradores, uma maneira de estar presente diariamente e estreitar nosso relacionamento. Sem dúvida, é um espaço para uma rica troca de experiências”, afirma.
Chaia escreve de uma a duas vezes por semana e fala sobre tudo: dos livros que leu, lugares que visitou até temas relacionados a gestão. Muito acessado, seu blog tem em média 37 comentários por post.