Carreira

Uma pausa para o café que faz mais pela diversidade que 60% das empresas

No Brasil, 60% dos profissionais de RH afirmam que suas empresas não possuem um programa de diversidade. Essa não é a realidade no GuiaBolso...

Café: a equipe deve refletir a sociedade diversa do país (Wavebreakmedia Ltd/Thinkstock)

Café: a equipe deve refletir a sociedade diversa do país (Wavebreakmedia Ltd/Thinkstock)

Luísa Granato

Luísa Granato

Publicado em 25 de julho de 2018 às 15h00.

Última atualização em 25 de julho de 2018 às 15h30.

São Paulo - Na última quinta-feira de junho, dia mundial do orgulho LGBT, parte do GuiaBolso parou seu trabalho para tomar um café - e participar de um debate sobre homofobia.

Chamados “Diversicoffees”, esses encontros são organizados pelo Comitê de Diversidade da empresa e, mesmo não sendo obrigatórios, sempre têm alto engajamento.

Nesse último, foram quase 50 pessoas, o que representa 25% da empresa. Um número que é uma conquista, como comenta com orgulho Samira Soma, analista em Customer Experience em Atendimento em Redes Sociais e que participa da organização do comitê.

Mês a mês, desde setembro de 2017, Samira viu o grupo crescer e evoluir. Em pequenas reuniões, diversos temas que interessavam aos funcionários do GuiaBolso foram desdobrados e começaram a permear as conversas no escritório.

Em março, mês da mulher, o comitê transportou seus encontros para as paredes, pendurando cartazes de mulheres inspiradoras, como a artista Anitta e a política assassinada Marielle Franco. Em outro mês, eles trouxeram um profissional da área de tecnologia e portador de deficiência para uma palestra.

Satisfeito com a resposta que recebeu com a ação, Luiz Henrique Basilio, analista em Customer Experience na Gestão de Qualidade em Redes Sociais e também parte do comitê, sente que é necessário fazer mais.

“Tivemos o feedback direto das pessoas nos corredores e percebi que aquele trabalho fazia a diferença. Temos muito a melhorar, aqui dentro e no mundo, mas percebemos que as pessoas estão mais engajadas e sensíveis aos temas da diversidade”, comenta ele.

O objetivo não é apenas conversar sobre a diversidade, mas trazer mudanças efetivas. Para isso, a equipe deve refletir a sociedade diversa do país e todos devem ser capazes de conviver com respeito.

No Brasil, 60% dos profissionais de Recursos Humanos afirmam que suas empresas não possuem um programa de diversidade. A pesquisa foi feita pelo Vagas.com e a Talento Incluir por e-mail com mais de 3.200 respondentes, entre eles 139 pessoas com deficiência e 202 da área de RH.

 

Cartaz feito pelo Comitê de Diversidade do GuiaBolso para o mês da mulher. O cartaz na foto mostra a deputada e ativista carioca Marielle Franco

(GuiaBolso/Divulgação)

Mesmo tendo autonomia, Basílio destaca que o comitê trabalha próximo da área de Pessoas, auxiliando no recrutamento, como na iniciativa para atrair mulheres na área de tecnologia.

“Depois de falar de diversidade, precisamos ter pessoas diversas, tanto de regiões, etnias e gêneros”, diz Samira.

Os dois podem não considerar que a empresa é perfeita e veem muito trabalho pela frente para o comitê, no entanto, a existência do grupo já tem um mérito importante: sinaliza que ali é um ambiente seguro.

Segundo a pesquisa, apenas 10% dos profissionais de RH consideram suas empresas prontas para lidar com a diversidade; enquanto 62% não sentem que estão totalmente preparados e 25% acreditam que sua corporação não está apta.

Para promover a diversidade, além de ter um programa para a inclusão, as empresas devem preparar suas equipes.

A maioria dos RHs em empresas que não possuem qualquer política de diversidade relatou que a maior dificuldade é o preconceito ou falta de informação (48%). Outros obstáculos foram aceitação e respeito dos gestores (25%) ou de colegas (14%).

Pelo lado dos candidatos consultados na pesquisa, metade já se sentiu prejudicada em dinâmicas de seleção. Dentro dessa parcela, 59% são pessoas com deficiência, 54% são mulheres e 55% são pessoas negras.

Caminhos

A ideia de tratar sobre diversidade no trabalho no GuiaBolso partiu de uma diretora durante uma reunião geral, mas ela abriu mão de comandar o grupo, deixando-o nas mãos dos funcionários.

Samira, Basílio e alguns colegas fizeram o primeiro encontro do comitê, um momento em que decidiram os temas que queriam priorizar: diferença de gênero, racismo, inclusão de pessoas com deficiência, homofobia, intolerância religiosa, entre outros. Para entender melhor as prioridades e preocupações do resto da empresa, também lançaram um censo da companhia.

O grupo tem o apoio da diretoria, para o orçamento e organização de ações, porém se mantém fiel ao ideal de manter o comitê feito por funcionários para os funcionários. Assim, as mudanças são geradas a partir de demandas reais e levadas até a diretoria.

A Accenture faz o caminho inverso. Em seus grupos de discussão desmembrados para cada minoria, diretores de diversas áreas participam da gestão e na tomada de decisão sobre inclusão.

Para eles, é essencial que pessoas diversas não estejam apenas presentes ali, mas tenham a oportunidade de prosperar. Para isso, eles incentivam que os executivos em altos cargos de liderança estejam envolvidos nas causas e conscientes das preocupações das minorias.

“No caso do nosso comitê LGBT, o diretor executivo que participa do grupo é próximo do presidente da empresa e trabalha com uma equipe muito diversa”, explica Samantha Dutra, gerente sênior de Desenvolvimento Organizacional da Accenture.

Ela aponta que a inclusão deve englobar todos os aspectos da vida do funcionário, sabendo dos problemas que enfrentam e auxiliando para que tenham condições dignas e iguais.

Como exemplo, a gerente cita que o plano de saúde da empresa hoje cobre 80 casais homoafetivos, pois se estende a parceiros sem discriminação. A Accenture também oferece um programa de mentoria para novas mães, designando uma mãe “veterana” que dará conselhos e auxílio durante a gravidez e quando a profissional retorna da licença-maternidade.

Segundo Dutra, a desigualdade muitas vezes começa fora da empresa e é necessária uma ajuda para compensar defasagens. Como no programa para PCDs, no qual a Accenture oferece o treinamento de três meses para contratação. O maior problema para as empresas é a baixa possibilidade para capacitação que a população com deficiências tem, então eles buscam contornar isso.

“E dá resultado, nós recentemente promovemos 12% dos nossos funcionários com deficiência. Um resultado do trabalho e mérito deles”, conta.

A Accenture fez sua própria pesquisa com 1.500 profissionais LGBT em 31 países, avaliando 40 fatores que possibilitam a criação de igualdade.

Nos resultados entre as empresas que tinham os fatores essenciais, os profissionais do grupo indicaram maiores chances para crescer na carreira, com 50% mais probabilidade de avançar para o gerente ou acima, e três vezes mais probabilidade de avançar para o gerente sênior ou acima.

Eles também estão três vezes mais satisfeitos com o progresso em suas carreiras.

A gerente sênior explica que os fatores da pesquisa englobam três dimensões: se as lideranças estão engajadas, quais as práticas inclusivas da empresa e se os funcionários têm confiança de que essas práticas e discursos são aplicados.

Nas empresas em que os 40 fatores não são comuns, o relatório indica que as corporações podem melhorar se puderem ser mais flexíveis e transparentes. Entre as sugestões, está a oferta de horário flexível, metas claras de diversidade e abandonar a exigência para colaboradores mudarem sua aparência.

O importante é começar, mesmo que pequeno, apenas com pessoas aliadas e simpáticas aos movimentos, aconselha Samira Soma, do GuiaBolso. “Muitos não entram de cara, mas a curiosidade vai crescendo. O primeiro passo é procurar aliados dentro do trabalho para ajudar e levar a questão para os líderes, avaliando se o ambiente é favorável”, diz.

Para Luiz Henrique Basílio, é preciso ter paciência, pois as mudanças não acontecem de um dia para outro. “Queremos uma empresa cada vez melhor e trabalhamos para isso. Apenas ter a comissão não garante que tudo será maravilhoso. É um trabalho exaustivo e, no final das contas, colhemos seus frutos”, fala ele.

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