Executivo feliz: dedicar-se a algo convergente com seus valores contribui para a pessoa entrar em fluxo (Flickr/Creative Commons/Mish Sukharev)
Camila Pati
Publicado em 30 de novembro de 2014 às 05h00.
São Paulo – “Quando eu começo, me esqueço de tudo e.... pareço desaparecer”. Este é um trecho da resposta do menino Billy Elliot - no filme de mesmo nome - a uma jurada de uma escola de balé que perguntou como ele se sentia quando dançava.
Para Rogério Chér, que acaba de lançar o livro “Engajamento” (AltaBooks), a fala do jovem bailarino Billy, nesta cena, resulta na melhor definição do que é experimentar a sensação de fluxo.
A palavra (flow, em inglês) foi consagrada por Mihály Csíkszentmihályi em suas reflexões sobre felicidade no trabalho e traduz um estado mental que alguns profissionais provam ao encarar determinados tipos de tarefas.
De acordo com Chér, sentir-se em fluxo vai muito além de simplesmente ter amor pelo seu trabalho. E mais: essa sensação pode até passar despercebida para quem não é lá muito adepto do autoconhecimento. Ele explica isso na entrevista que você vê a seguir:
EXAME.com: Para experimentar esta sensação é preciso amar o que faz? Fluxo está ligado ao amor pela atividade ou ao talento?
Rogério Chér: Sentir-se em fluxo nasce com a oportunidade de empregar nossos talentos para viver experiências significativas, na vida pessoal e na carreira. Surge quando usamos nossos pontos fortes e os colocamos a serviço de algo que sentimos ser maior do que nós mesmos. Não é propriamente amar o que faz - a tarefa em si - mas é se tornar a atividade, é ser o desafio, é não saber onde começa a atividade e termina você, e onde você começa e termina a tarefa. Você e aquilo se tornam uma coisa só. Todavia, sempre que estivermos distantes dos nossos talentos, sem consciência do que nos faz únicos, estaremos mais distantes das experiências de "flow".
EXAME.com: As pessoas, muitas vezes, não se dão conta que estão em fluxo?
Rogério Chér: Sempre quando descrevo as emoções inerentes ao fluxo vejo pessoas balançando suas cabeças, com olhares de recordação de momentos em que se sentiram assim. Mas nosso nível de autopercepção é quase sempre mínimo. Temos olhos de lince para os outros, e somos toupeiras para nós mesmos. Desse modo, as experiências de fluxo perdem significado e tornam-se eventos efêmeros, de menor importância, lamentavelmente.
EXAME.com: Você costuma entrar em fluxo quando faz o quê? Como você vive essa sensação?
Rogério Chér: Tenho poucas coisas que faço quase perfeitamente, e recorrentemente. Estudar, aprender e ensinar pela fala e pela escrita são atividades mais próximas do que posso chamar de "meus talentos". Assim, entro em fluxo sempre que meus desafios passam por aí. Então perco a noção de tempo, sinto que "desapareço", torno-me "um com aquilo" e fico sem qualquer necessidade de feedbacks, pois fazer aquilo tem tanto sentido para mim que dispenso avaliações.
EXAME.com: Quem tem talento, mas não necessariamente tem paixão por uma atividade, pode entrar em fluxo, mesmo assim?
Rogério Chér: É muito mais do que amar de paixão. Entrar em fluxo não passa apenas pelo "o que faço" e "como faço", mas também "por que faço". A razão e o propósito para levar aquilo adiante contam para esta experiência. Dedicar-se a algo convergente com meus valores, com tudo o que tem valor profundo para mim, coisas das quais não abro mão e não negocio de jeito algum contribui para entrar em fluxo.
EXAME.com: Todo mundo, em algum momento, entra em fluxo no trabalho?
Rogério Chér: Todo mundo pode, mas nem todos experimentam esta emoção. Sem autoconhecimento e sem consciência para aquilo que nos faz únicos, singulares e especialmente talentosos, fica impossível experimentar "flow".
EXAME.com: O que as pessoas devem observar para saber se determinada atividade as faz entrar em fluxo?
Rogério Chér: São cinco perguntas: perco a noção do tempo? Perco a noção de dualidade, ou seja, sinto-me um com aquilo? Obtenho feedback no mesmo instante? Sinto que esta atividade tem sentido em si própria? Projeto esta atividade no futuro?