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Não deixe que situações de crise levem a desvios de conduta

Por trás de um escândalo corporativo, pode haver criminosos compulsivos e profissionais honestos que, por fraqueza, ingressam no esquema.

Operação LavaJato: investigação revelou a participação de empresas privadas no esquema de corrupção na Petrobras (Acordo salgado)

Operação LavaJato: investigação revelou a participação de empresas privadas no esquema de corrupção na Petrobras (Acordo salgado)

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Da Redação

Publicado em 8 de janeiro de 2015 às 16h45.

Em novembro, a Polícia Federal prendeu mais de 20 executivos de dez das principais empreiteiras brasileiras numa nova fase da Operação Lava-Jato. São presidentes e diretores de empresas como Camargo Corrêa, Mendes Júnior e OAS. Os executivos são acusados de fazer parte de um esquema de superfaturamento de contratos e de pagamento de propina para diretores da Petrobras e partidos políticos.

A prisão de líderes das construtoras vem sendo tratada como uma vitória contra a impunidade no país e revela que, para cada agente público corrupto, sempre existe, do outro lado, uma empresa corruptora. A Lava-Jato pode parecer coisa de peixe grande, mas deixa uma lição para qualquer funcionário honesto, de qualquer empresa: cair na tentação e cometer desvios durante o exercício de sua função é mais fácil do que se imagina.

Todo profissional que ingressa num esquema de corrupção ou de fraude sabe que não poderá alegar ingenuidade se for pego. Mas nem todos os desonestos corporativos são iguais quando observados de perto. “Em qualquer empresa há dois perfis de pessoa que quebram as regras”, afirma Guido Palazzo, professor de ética nos negócios na Universidade de Lausanne, na Suíça, que, desde a crise de 2008, investiga as razões da má conduta corporativa. “Existem os criminosos, que fraudam e corrompem intencionalmente, e existem as pessoas normais, que quebram as regras sem perceber que estão fazendo algo errado”, diz ele. 

Nas operações da Petrobras, estão sendo acusados presidentes e altos executivos de grandes empresas, mas a falta de ética não está restrita ao comando das empresas. “Atos ilícitos podem acontecer em qualquer tipo de relação profissional”, afirma Peter Diekman, professor e consultor holandês, que trabalhou durante anos na área de prevenção a fraudes de grandes empresas, como Philips e ABN Amro Bank.

 Segundo ele, existem basicamente dois tipos de fraude. A mais comum é a apropriação indevida de recursos, que vai do roubo de material de escritório à compra, com o dinheiro da empresa, de produtos para uso pessoal, como notebooks e até carros.

Por mais que esse tipo de fraude seja responsável por 75% dos casos, de acordo com Peter, não é ele o que causa maiores prejuízos às companhias. “O grande problema são os desvios financeiros mais sofisticados, que enganam investidores e acionistas e podem resultar em perdas de milhões de dólares em um piscar de olhos”, diz ele. 

Em muitos casos, as fraudes podem deixar as empresas em situação financeira muito complicada, como ocorreu com o banco Panamericano, no Brasil, ou até levá-las à falência, como no caso da americana Enron.

Segundo um levantamento da associação americana de auditores, em 2013 as perdas globais com fraudes corporativas atingiram a marca de 3,7 trilhões de dólares. Apenas no caso da Petrobras, de acordo com estimativa do banco americano Morgan Stanley, o prejuízo da estatal pode ter chegado a 21 bilhões de reais.

De confiança

Um dos maiores obstáculos à prevenção dos casos de fraudes dentro das empresas é, na maioria das vezes, a dificuldade de antever quem é capaz de cruzar a linha que separa os profissionais honestos dos fraudadores. O fraudador típico tem um perfil muito similar ao de qualquer outro funcionário da empresa.

Em 41% dos casos, ele trabalha no mesmo lugar há mais de seis anos e, em 29% das fraudes, ocupa um cargo executivo. São pessoas que, justamente por serem figuras de confiança na estrutura da empresa, sentem-se livres para agir em benefício próprio sem levantar suspeitas.

De acordo com especialistas em investigação de fraudes, a conjunção de três fatores aumenta a probabilidade de que um profissional comum, sem histórico de desvios éticos, cruze a fronteira da honestidade e cometa um crime. Esses fatores, que compõem o chamado triângulo da fraude, são: a necessidade, a oportunidade e a racionalização (veja gráfico). 

Resumidamente, a predisposição para a fraude aumenta quando o executivo que está passando por uma dificuldade (como estar endividado) encontra uma brecha nos sistemas e processos da empresa e, por se sentir desvalorizado ou merecedor de melhores condições, acaba relativizando a imoralidade do desvio de recursos.

“Quando uma pessoa normal se vê em um contexto muito difícil, ela tende a interpretar o mundo de forma diferente e perde a dimensão do que é ou não correto”, afirma o professor Guido Palazzo. “É como se o profissional fosse acometido por uma espécie de cegueira ética”, diz ele.

Além de razões pessoais, um profissional pode entrar numa maracutaia corporativa ao se sentir pressionado por algum fator relacionado ao trabalho.

A cobrança excessiva de resultados, a coação de um chefe desonesto ou de um agente público corrupto são exemplos de coisas que fazem um profissional alterar seus padrões morais. Como se precaver? “A melhor defesa é não ter medo”, afirma Palazzo. “O medo é o principal combustível para desrespeitar uma regra ou para silenciar quando uma regra está sendo quebrada”, diz ele.

Isso significa recusar-se a entrar no jogo, ainda que acarrete alguma consequência previsível, como ser colocado numa geladeira na empresa ou até ser demitido.  

As empresas têm criado mecanismos que permitem aos profissionais honestos denunciar os fraudadores. Um impulso nesse sentido veio da promulgação da Lei Anticorrupção (12.846/13), que acaba de completar um ano em vigor.

A nova legislação prevê punições pesadas para as companhias condenadas por lesar o poder público, com multas que podem chegar a até 20% de seu faturamento. Por causa da lei, diversas empresas estão fortalecendo suas equipes de governança corporativa. “Se as empreiteiras envolvidas no caso da Petrobras tivessem áreas de controle bem estruturadas e atuantes, o risco de um caso como esse ocorrer seria menor”, afirma André Fonseca, sócio do escritório de advocacia Veirano, de São Paulo.

Com a nova lei, mais empresas devem investir na criação desse setor. “As empresas que já tinham algum mecanismo de controle fortaleceram suas áreas, e as demais estão descobrindo como se estruturar”, diz Heloísa Macari, sócia-diretora da consultoria de gestão de risco ICTS. 

Risco reduzido

Uma das companhias que vêm investindo no fortalecimento de seu departamento de compliance é a gestora de ativos Brookfield. Atualmente, a empresa conta com uma equipe de 18 profissionais da área, criada há quatro anos. Na divisão de shopping centers, que tem seis pessoas, a empresa vem testando um novo modelo. “Em cada área da empresa existe um funcionário responsável por zelar por essa questão”, afirma Fernando Salvador, diretor de compliance da Brookfield.

Os funcionários têm à disposição um canal para denúncias anônimas e recebem cursos sobre o código de conduta da companhia para funcionários e parceiros comerciais. As ações de compliance já estão apresentando resultados. “Cada vez mais, recebemos consultas prévias de funcionários sobre a legitimidade de algumas ações”, diz Fernando.

A área é acionada de 80 a 90 vezes todo mês por empregados que pedem orientação sobre questões como o recebimento de brindes e a possibilidade de que algum tipo de operação gere penalidades para a empresa. O exemplo mostra que profissionais conscientes podem se antecipar e tomar cuidados para evitar possíveis deslizes. 

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