Carreira

Raiva do bem

O temperamento explosivo pode ser convertido em força produtiva, diz Vera Martins, especialista em medicina comportamental

Vera Martins, psicóloga: "O primeiro passo é assumir que a raiva existe e precisa ser controlada. Depois, tente entendê-la. A raiva é justa?" (Marcelo Spatafora/EXAME.com)

Vera Martins, psicóloga: "O primeiro passo é assumir que a raiva existe e precisa ser controlada. Depois, tente entendê-la. A raiva é justa?" (Marcelo Spatafora/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 15 de julho de 2013 às 16h56.

São Paulo - Apesar de ser um sentimento ruim, a raiva pode ser trabalhada a seu favor, se for  bem gerenciada. Quem afirma é a especialista em medicina comportamental Vera Martins, autora do livro Tenha Calma! (Editora Campus/Elsevier). Nos últimos dois anos, ela ouviu 220 profissionais brasileiros e analisou como eles lidam com essa emoção.

Já que a raiva existe — e todo mundo sente —, é melhor aprender a reagir quando ela aparece. Em entrevista, Vera conta como extrair o melhor dos seus momentos de fúria.

VOCÊ S/A - No livro, a senhora diz que é um mito pensar na raiva como um mau sentimento. Por quê? 

Vera Martins - Aprendemos que a raiva ameaça o bem-estar e que manifestá-la pode ocasionar perdas e danos — para nós mesmos e para quem está próximo. É normal acreditar que reprimir esse sentimento é a melhor saída. No ambiente de trabalho, essa crença não só se aplica como é exacerbada.

No escritório, as pessoas reprimem a própria raiva ainda mais veementemente. No entanto, quando bem expressada, a raiva pode ajudar no desenvolvimento profissional. 

VOCÊ S/A - Sua pesquisa mostra que 48% dos profissionais adotam estratégias defensivas quando estão com raiva, como guardar o rancor para si em vez de conversar sobre o assunto, por exemplo. Qual o perigo de atitudes como essa?

Vera Martins - O medo de perder o emprego faz com que os profissionais se tornem passivos e interiorizem a raiva. Essa postura é terrível porque aumenta o estresse emocional e os níveis de rancor com a empresa. Os resultados são funcionários desmotivados e ausentes, que fazem pouco esforço para brilhar e crescer na carreira. E, em casos graves, os profissionais podem até entrar em depressão.  

VOCÊ S/A - Como usar a raiva de maneira positiva no escritório?

Vera Martins - Para extrair o melhor da raiva, o primeiro passo é assumir o sentimento, admitir que ele existe e precisa ser controlado. Depois, é necessário entendê-lo: é uma raiva justa? O problema realmente existe ou é fruto da imaginação? Essas perguntas ajudam na racionalização do sentimento e no autoconhecimento. Se você concluir que tem razão de estar ofendido, encare a situação. 

Converse com o causador da raiva, mostre quais são seus limites e proponha alternativas para solucionar o problema. Fora do escritório, fazer atividades prazerosas, como ouvir música, caminhar ou ir ao cinema, ajuda a relaxar e a encarar os momentos de tensão com mais tranquilidade. 

VOCÊ S/A - No ambiente de trabalho, ter reações emocionais é ruim? 

Vera Martins - Não necessariamente. A raiva tem força para impulsionar as pessoas: pode ajudar um profissional a repensar seus planos e a desenvolver novas alternativas. Mas é arriscado tomar decisões sob o efeito exclusivo dos sentimentos. Isso coloca em jogo a credibilidade do profissional, que, por deixar a razão de lado, pode ficar vulnerável e tomar decisões erradas.


É preciso se acalmar antes de agir. Caso contrário, a expressão emocional pode parecer, aos olhos dos colegas e da chefia, uma fragilidade. 

VOCÊ S/A - No dia a dia de trabalho, quais situações mais estimulam a raiva? 

Vera Martins - Segundo a pesquisa que realizei para o livro, os cinco gatilhos mais citados foram injustiça (levar a culpa por erros dos outros); falta de comprometimento (um colega ou chefe que não cumpre prazos, por exemplo); falsidade (saber que um colega falou mal de outro pelas costas); traição (ter as promessas frustradas) e falta de reconhecimento por parte do gestor ou da empresa. 

VOCÊ S/A - O que fazer para não explodir com o chefe ou com os colegas? 

Vera Martins - É um conselho antigo, mas valioso: respire fundo. Inspirar e expirar lentamente durante alguns minutos proporciona a oxigenação do cérebro e o relaxamento do sistema límbico, responsável pelas emoções.

Se mesmo depois disso o nervosismo persistir, o melhor a fazer é pedir um tempo para tomar as decisões. Assim, a cabeça esfria, o raciocínio volta ao normal e o profissional não corre o risco de cometer erros por causa de emoções mal trabalhadas. 

VOCÊ S/A - Como um clima de trabalho ruim  pode interferir no surgimento da raiva do profissional?  

Vera Martins - A raiva aparece quando a pessoa sente que estão violando suas crenças internas. Quanto mais ameaçador for o ambiente de trabalho, mais propício para o surgimento da emoção. Por isso é tão importante que o relacionamento entre os funcionários e a chefia seja saudável. O subordinado precisa se sentir importante.

VOCÊ S/A - Os gestores podem ajudar a gerir a raiva de seu pessoal? 

Vera Martins - O papel do líder como educador é fundamental para transformar a raiva em resultados. Um bom chefe ajuda a cuidar da emoção de seus funcionários. Para isso, é fundamental ouvir as reclamações e levar a sério a raiva que cada componente da equipe sente.

Compreendendo o time, um bom gestor consegue ser imparcial para analisar se a raiva é justa e indicar soluções. Isso é transformar a raiva em resultado. Os profissionais, que trabalham com um líder maduro, sentem prazer no trabalho. 

VOCÊ S/A - De que maneira as empresas devem se posicionar para administrar conflitos e estimular um ambiente tranquilo?

Vera Martins - A empresa deve criar um ambiente de trabalho propício à liberdade de expressão. Assim, o profissional se sente seguro para expressar sua raiva e solucioná-la. Com líderes maduros emocionalmente, é grande a probabilidade de ter funcionários calmos.

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